CMED libera medicamentos com risco de desabastecimento dos critérios de definição de preços

Em decorrência da situação de desabastecimento de alguns medicamentos no mercado brasileiro, a Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos – CMED publicou a Resolução CM-CMED nº 7, de 1 de junho de 2022, que dispõe sobre a liberação dos critérios de estabelecimento ou de ajuste de preços de medicamentos com risco de desabastecimento no mercado brasileiro.

A CMED, órgão interministerial responsável pela regulação econômica do mercado de medicamentos, publica e atualiza mensalmente uma lista de preços máximos permitidos para venda de todos os medicamentos que possuem registro na Anvisa, a fim de estimular a oferta de medicamentos à população e a competitividade do setor.

A Lista CMED, como é conhecida, contém o Preço de Fábrica ou Preço Fabricante (PF), que é o preço a ser praticado por fabricantes, importadores e distribuidores; o Preço Máximo ao Consumidor (PMC), isto é, o preço a ser praticado no comércio varejista por farmácias e drogarias; bem como o Preço Máximo de Venda ao Governo – PMVG, que consiste na aplicação de um desconto mínimo obrigatório, o Coeficiente de Adequação de Preço – CAP, sobre o Preço Fábrica (PF) sempre que os medicamentos constantes do rol anexo ao Comunicado nº 15/2017 ou para atender ordem judicial forem adquiridos por órgãos públicos.

Por outro lado, a CMED instituiu, por meio da Resolução nº 2, de 26 de março de 2019, os medicamentos que estão liberados dos critérios de estabelecimento ou ajuste de Preços Fábrica (PF) e de Preços Máximos ao Consumidor (PMC) – que constituem o Grupo 1 –, e os medicamentos liberados dos critérios de estabelecimento ou ajuste de Preços Fábrica (PF), mas com Preços Máximos ao Consumidor (PMC) regulados pela CMED – que formam o Grupo 2.

Na primeira fase de liberação instituída pela Resolução nº 7/2022, que teve início em 20/06/2022, foram provisoriamente inseridos até 31/12/2022, no Grupo 2 da Resolução nº 2, de 26 de março de 2019, os seguintes medicamentos que se encontravam com risco de desabastecimento no mercado brasileiro:

Sulfato de Amicacina (250 mg/ml sol inj);

Aminofilina (24 mg/ml sol inj);

Cloridrato de dopamina (5 mg/ml sol inj);

Dipirona (500 mg/ml sol inj);

Imunoglobina humana (5,0 g);

Sulfato de magnésio (10% e 50% sol inj).

Desta forma, no período de 20/06/2022 a 31/12/2022, os produtores, laboratórios, distribuidores e importadores de medicamentos não estarão obrigadas a observar, para a comercialização dos medicamentos dispostos no rol acima, os parâmetros de fixação de preços dispostos na Lista CMED para o Grupo 2 – ou seja, estarão liberados dos critérios de Preços Fábrica (PF), mas não dos de Preços Máximos ao Consumidor (PMC).

É importante destacar ainda que, para que as empresas possam realizar os ajustes nos valores dos produtos, é necessário que sejam seguidas as instruções do manual de preenchimento do Sistema de Acompanhamento de Mercado de Medicamentos – Sammed externo em relação aos medicamentos classificados como Grupo 2 da Resolução nº 2/2019.

Quanto aos medicamentos com risco de desabastecimento, a Resolução determina que a Secretaria-Executiva da CMED deverá elaborar o Relatório Técnico sobre o comportamento dos medicamentos pertencentes ao Grupo 2, previstos no artigo 12, inciso III, da Resolução nº 2/2019, trimestralmente.

Ressalta-se, ainda, que, para realização dos ajustes nos preços, qualquer pessoa física ou jurídica de direito público ou privado que atue no mercado de medicamentos deverá observar as medidas dispostas no artigo 6º da Resolução nº 2/2019, dentre as quais, destaca-se a apresentação de Relatório de Comercialização, a promoção da atualização de preços no banco de dados do Sistema Sammed sempre que houver alteração e a publicação dos preços nas mídias especializadas de grande circulação. Deste modo, as empresas produtoras de medicamentos, representantes, distribuidoras de medicamentos estarão liberadas, no período de 20/06/2022 a 31/12/2022, da observância das regras de estabelecimento ou de ajuste de preços para o rol de medicamentos divulgados, em razão do cenário de desabastecimento do mercado, devendo ser seguidas os demais regramentos normativos para o Grupo 2, previsto na Resolução nº 2 de 26 de março de 2019.

Restituição/compensação de contribuições previdenciárias recolhidas em condenações

A empresa está sujeita ao regime de Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta (CPRB) e recolhe contribuição previdenciária nas condenações e acordos trabalhistas? Trata-se de recolhimento em duplicidade e a empresa tem o direito de obter o ressarcimento das contribuições recolhidas nos últimos 5 (cinco) anos.

O regime da CPRB foi instituído como medida de desoneração da folha de salários, consistindo na substituição da base de incidência da contribuição previdenciária patronal (CPP) sobre a folha de pagamentos, prevista nos incisos I e III, do artigo 22, da Lei n° 8.212/1991, pela incidência de um percentual sobre o valor da receita bruta.

Acontece que, nas ações ajuizadas perante a Justiça do Trabalho que resultam em condenações ou acordos judiciais com verbas de natureza salariais, é usualmente exigido o recolhimento de contribuição previdenciária patronal na execução, mediante GPS com código de recolhimento 2909 – Reclamatória Trabalhista.

Assim, as empresas sujeitas ao regime CPRB ficam vulneráveis ao pagamento em duplicidade, já que apuram a CPRB e a CPP sobre verbas salariais reconhecidas em condenações e acordos trabalhistas.

Inúmeras são as decisões dos Tribunais que reconhecem o direito à devolução do indébito tributário, mediante compensação ou repetição, dos últimos 05 (cinco) anos, desde que a empresa comprove a sujeição à CPRB nesse período.

Comprovado o recolhimento de contribuição previdenciária patronal no período em que a empresa estava sujeita à CPRB, é possível ajuizar ação ordinária na Justiça Federal solicitando a restituição/compensação de contribuições previdenciárias recolhidas indevidamente em cumprimento de condenações e acordos trabalhistas e, ainda, solicitar expedição de ofício declarando a inexistência de relação jurídica que obrigue a empresa ao pagamento CPP nas condenações e/ou acordos trabalhistas, enquanto estiver submetida ao regime da CPRB.

Negócios Imobiliários Via Token e Aspectos Registrais

A dinâmica do mercado tem produzido transformações e importantes inovações a respeito da possibilidade da tokenização da propriedade imobiliária.

Para a International Organization of Securities Commissions (IOSCO), a tokenização é “o processo de representar digitalmente um ativo ou propriedade de um ativo”. A criação de direitos ou créditos no meio digital, através da tecnologia blockchain, tem sido conhecida como tokenização.

Em referência ao assunto abordado, temos o recente pronunciamento do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, por meio do Provimento 38/21 da a Corregedoria-Geral da Justiça (CGJ), o qual regulamentou a lavratura de escrituras públicas de permuta de bens imóveis por tokens, bem como o respectivo registro imobiliário.

A escritura pública que motivou a CGJ do Rio Grande do Sul a editar o referido provimento remete à permuta de um imóvel por um token criado através de smart contract na rede principal do Ethereum (main network), tendo sido lavrada em 18 de maio de 2021.

O modelo de tokenização imobiliária proposto pela empresa Netspaces, permutante no ato originário do processo, foi o seguinte:

  1. O proprietário acessa o site da empresa e solicita a digitalização do imóvel de sua propriedade;
  2. O proprietário e a empresa assinam uma escritura de permuta, pela qual a empresa recebe a propriedade do imóvel, que se transformará em propriedade digital;
  3. Neste ato, o proprietário paga o ITBI devido ao município e os custos da escritura;
  4. A seguir, o proprietário paga os custos do registro da escritura no cartório de imóveis. Feito o registro, a mencionada empresa adquire a propriedade efetiva do imóvel;
  5. Uma vez “digitalizado” o imóvel, a empresa registra a transação e a propriedade digital na blockchain em nome do antigo proprietário, o qual terá apenas a propriedade digital, representada por um token.

Ainda de acordo com o modelo proposto, após a “digitalização da propriedade”, o dono do imóvel digital e, por conseguinte, detentor do token que representa essa sua qualidade no ambiente virtual, pode aliená-lo a terceiros, desde que as transações sejam realizadas dentro da plataforma da Netspaces, conforme artigos 33 e 34 do regulamento supracitado.

Além disso, remanesce ao proprietário digital uma relação possessória sobre a propriedade real, regida pelas disposições do Código Civil. Logo, o direito de usar o imóvel em propriedade digital poderá ser exercido pelo proprietário digital ou, de acordo com a sua vontade, por terceiros, a título gratuito ou oneroso.

Não obstante, a faculdade de fruir do imóvel em propriedade digital pertence ao proprietário digital, o qual poderá transferi-lo em caráter não definitivo a quem queira, a título gratuito ou oneroso.

As vantagens da tokenização imobiliária são inegáveis: possibilitam o fracionamento do valor patrimonial permitindo ao investidor um baixo valor de entrada, permitem a diversificação dos ativos, pois um token pode estar vinculado a diversos imóveis (residenciais, comerciais, industriais etc.). Outras vantagens são a liquidez imediata e a eficiência de custos decorrente da automação e dispensa de intermediários.

Por fim, é notória a importância que a CVM e o Banco Central regulamentem a tokenização de ativos imobiliários. O mercado imobiliário global é imenso, com valor estimado em US$ 280 trilhões. A tokenização dará acesso, fluidez, liquidez e amplo acesso a pequenos investidores a este mercado.

Confira na íntegra: Provimento nº 38/2021 e Regulamento da Propriedade Digital V0.5.

O empregador pode substituir o vale transporte por vale combustível?

O vale transporte é um direito do empregado e encontra previsão na Lei 7.418/1985, devendo ser utilizado, exclusivamente, pelo empregado que utiliza transporte público para ir e voltar do trabalho, independentemente da distância e de quantos transportes necessite para fazer o percurso de ida e volta.

O artigo 458, § 2º, da CLT, prevê que não será considerado salário a utilidade fornecida pelo empregador a título de transporte destinado ao deslocamento para o trabalho e retorno, em percurso servido ou não por transporte público. Ou seja, o benefício apresenta natureza indenizatória e não integra o salário para quaisquer efeitos.

Contudo, o empregador pode, mediante acordo individual, acordo ou convenção coletiva de trabalho, conferir a possibilidade de substituir o benefício do vale transporte por vale combustível, aos seus empregados que usam o seu próprio veículo para o deslocamento residência-trabalho-residência. A opção da substituição deve ser conferida a todos os empregados integrantes do quadro de pessoal da empresa, considerando o princípio da isonomia, que diz que os trabalhadores devem ser tratados de igual maneira.

Nesses casos, o valor pago a título de vale combustível deverá ser exatamente o mesmo a que o empregado teria direito se optasse pelo vale transporte, nos termos do artigo 1º da Lei 7.418/1985. Significa dizer que, considerando o número de vale transporte que o empregado teria direito para deslocamento residência-trabalho e vice-versa, o valor do benefício concedido em forma de vale combustível deve guardar a mesma proporcionalidade.

Além disso, o empregador deverá proceder com o desconto de 6% (seis por cento) sobre o salário do empregado, discriminando o desconto em folha de pagamento como vale combustível. Se observado tal desconto, o valor pago como vale combustível não será considerado salário e, portanto, não será considerado para base de cálculo de qualquer direito trabalhista ou previdenciário.  

Caso o empregador deixe de descontar o percentual acima indicado do salário do empregado, ou desconte percentual inferior, a diferença deverá ser considerada como salário indireto e sobre ela incidirá contribuição previdenciária e demais tributos. Desse modo, temos que o vale transporte é um direito e deve ser subsidiado pelo empregador, todavia, pode ser renunciado pelo empregado, desde que por escrito. O vale combustível pode substituir o vale transporte desde que haja um acordo entre empregado e empregador nesse sentido. Contudo, devem ser observados os seguintes requisitos para que essa substituição não seja considerada salário: (i) possibilidade de substituição mediante acordo individual ou negociação coletiva; (ii) desconto de 6% (seis por cento) sobre o salário base do empregado; e (iii) previsão do desconto em folha de pagamento como vale combustível.

Publicada Lei que amplia possibilidades da transação tributária

Na semana passada, foi publicada a Lei nº 14.375/22, que ampliou as hipóteses de realização de transação tributária para permitir a inclusão de débitos que são objeto do contencioso administrativo fiscal. A transação poderá ser proposta pela Receita Federal do Brasil, de forma individual ou por adesão, ou por iniciativa do próprio devedor.

A partir de sua regulamentação, os contribuintes poderão transacionar débitos ainda em discussão na esfera administrativa, antes mesmo, portanto, de sua inscrição em dívida ativa. A nova lei ainda ampliou o prazo para que os débitos sejam quitados em até 10 anos, com descontos de até 70% nos juros, multas e encargos legais.

Dentre outras inovações trazidas, a norma também passou a permitir a utilização de créditos de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da CSLL para quitar até 70% da dívida, bem como a utilização de precatórios, além de esclarecer que os descontos concedidos não deverão integrar a base de cálculo do IRPJ, da CSLL, do PIS e nem da COFINS.

A nova hipótese de transação tributária ainda precisa ser regulamentada pela Receita Federal do Brasil, o que deve ocorrer nas próximas semanas.

Mudanças na Lei de Alienação Parental e no Estatuto da Criança e do Adolescente: entenda as repercussões

Publicada em 19/05/2022, a Lei 14.340/2022 trouxe mudanças significativas para a Lei de Alienação Parental (12.318/2010) e para o Estatuto da Criança e do Adolescente (8.069/1990), dentre elas a garantia à convivência familiar, resguardando o direito da criança e do adolescente de conviverem com ambos os genitores, ainda que de forma assistida.

A alienação parental é um termo jurídico utilizado para caracterizar toda interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos pais, pelos avós ou por qualquer adulto que tenha a criança ou o adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância. Essa alienação, em grande parte dos casos, tem o objetivo de prejudicar o vínculo da criança ou do adolescente com o (a) genitor (a).

Como se observa, a prática da alienação parental fere o direito fundamental da criança à convivência familiar saudável, sendo, ainda, um descumprimento dos deveres relacionados à autoridade dos pais ou decorrentes de tutela ou guarda.

A legislação prevê algumas práticas que podem configurar a alienação parental, como por exemplo: realizar campanha de desqualificação da conduta do (a) genitor (a) no exercício da paternidade ou maternidade; dificultar o exercício da autoridade parental; dificultar o contato da criança ou do adolescente com o (a) genitor (a); dificultar o exercício do direito regulamentado à convivência familiar; omitir deliberadamente ao (à) genitor (a) informações pessoais relevantes sobre a criança ou o adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço; mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando dificultar a convivência da criança ou do adolescente com o (a) genitor (a), com familiares ou com os avós; etc.

Considerando-se ser uma prática que afeta diretamente na formação da criança e do adolescente em seus aspectos intelectual, cognitivo, social e emocional, o Direito e a Psicologia têm se debruçado sobre o tema a fim de buscar medidas efetivas ao combate desse comportamento, sem, contudo, prejudicar o direito do menor à convivência com o genitor que praticou a alienação.

E é justamente com base nessa premissa que foram sancionadas mudanças na legislação pertinente ao tema, partindo-se do pressuposto de que o combate à alienação deve primar pela garantia do direito do menor de ter a presença de ambos os pais em seu desenvolvimento.

A exclusão da presença do genitor alienador combate um problema e, em contrapartida, traz outro, que é a ausência da presença materna ou paterna, a depender do caso, no desenvolvimento do menor.

À vista disso, a Lei 14.340/2022, publicada recentemente, determinou que mesmo quando houver comprovada alienação parental, será assegurada a garantia mínima de visitação assistida no fórum em que tramita a ação ou em entidades conveniadas com a Justiça, ressalvados os casos em que há iminente risco de prejuízo à integridade física ou psicológica da criança ou do adolescente, atestado por profissional eventualmente designado pelo juiz para acompanhamento das visitas.

Importante esclarecer que a garantia acima mencionada não interferiu nas medidas legais já existentes e aplicáveis nos casos em que for declarada judicialmente a prática da alienação parental, a exemplo da possibilidade do alienador ser judicialmente advertido e/ou multado, além de perder a guarda do menor e ser conduzido a acompanhamento psicológico e/ou biopsicossocial.

                Além da garantia mínima de visitação, a Lei 14.340/2022 estabelece mudanças quanto ao acompanhamento psicológico ou biopsicossocial, determinando a sua realização periódica, bem como a emissão de ao menos um laudo inicial, que contenha a avaliação do caso e o indicativo da metodologia a ser empregada, e de um laudo final, ao término do acompanhamento.

A Lei 14.340/2022 também estipulou que quando for necessário o depoimento ou oitiva dos filhos, tais procedimentos serão realizados obrigatoriamente nos mesmos termos da Lei 13.431/2017, sob pena de nulidade processual. A referida norma estabelece o sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente vítimas ou testemunhas de violência.

Outra mudança significativa trazida pela Lei 14.340/2022 está prevista no artigo 157 do Estatuto da Criança e do Adolescente, que repercute diretamente da Lei de Alienação Parental. Antes da alteração normativa, o Juiz poderia determinar a perda ou suspensão do poder familiar sem ouvir o menor ou a parte contrária. Com essa mudança, o artigo passou a vigorar com o parágrafo 3º, o qual estipula que a liminar seja, preferencialmente, precedida de entrevista da criança ou do adolescente perante equipe multidisciplinar e de oitiva da outra parte.

Foram também acrescentados artigos à Lei de Alienação Parental no sentido de assegurar a realização de estudo psicológico, biopsicossocial ou qualquer outra avaliação exigida por esta Lei ou por determinação judicial, mesmo na ausência ou insuficiência de serventuários responsáveis, conferindo ao magistrado a possibilidade de nomear perito com qualificação e experiência pertinentes ao tema.

Por fim, também foi sancionada mudança normativa para determinar que nos processos de Alienação Parental em que estejam pendentes de laudo psicológico ou biopsicossocial há mais de 6 (seis) meses, quando da publicação dessa Lei, será determinado prazo de 3 (três) meses para a apresentação da avaliação requisitada. Em linhas gerais, denota-se que a Lei 14.340/2022 buscou assegurar a convivência da criança e do adolescente inclusive com o genitor alienador, minorando os transtornos psicológicos decorrentes da privação da convivência do menor com ambos os pais, bem como garantir celeridade ao processo de alienação parental por meio de determinação de prazos para disponibilização de laudo psicológico ou biopsicossocial, com claro intuito de que o menor não seja prejudicado por eventual morosidade na solução do conflito instaurado entre os seus pais.

O princípio da competência-competência na Arbitragem

A arbitragem constitui meio adequado de resolução de conflitos, sendo norteada por diversos princípios, dentre os quais pode-se destacar o princípio da Kompetenz-Kompetenz.

A Lei de Arbitragem prevê, expressamente, a adoção do aludido princípio em seu art. 8º, parágrafo único, ao estabelecer que cabe ao árbitro decidir sobre a existência, validade e eficácia da convenção de arbitragem:

“Art. 8º A cláusula compromissória é autônoma em relação ao contrato em que estiver inserta, de tal sorte que a nulidade deste não implica, necessariamente, a nulidade da cláusula compromissória.

Parágrafo único. Caberá ao árbitro decidir de ofício, ou por provocação das partes, as questões acerca da existência, validade e eficácia da convenção de arbitragem e do contrato que contenha a cláusula compromissória.”

Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça tem reafirmado que sua jurisprudência se firmou no sentido de que, de acordo com o princípio da competência-competência, cabe ao Juízo Arbitral deliberar acerca de sua competência sempre que estiverem sendo discutidas questões relativas à existência, validade e eficácia do compromisso arbitral firmado contratualmente entre as partes.

No AREsp nº 1276872 / RJ (2018/0084050-9), por exemplo, o Ministro Og Fernandes reafirmou a precedência do Juízo Arbitral para a análise e apreciação dos litígios decorrentes de contratos que disponham de cláusula arbitral, em atenção ao princípio da competência-competência:

“Tal entendimento não destoa da jurisprudência do STJ que se firmou no sentido de que, segundo o princípio do kompetenz-kompetenz, previsto no art. 8º da Lei n. 9.307/1996, cabe ao juízo arbitral, com precedência sobre qualquer outro órgão julgador, deliberar a respeito de sua competência para examinar as questões que envolvam a existência, validade e eficácia da convenção de arbitragem e do contrato que tenha cláusula compromissória.”

Na oportunidade, o ilustre Ministro destacou que “a Jurisprudência do STJ segue diretriz de que a aplicação do princípio da competência-competência deve ser observada da forma mais rigorosa possível”.

Importante destacar que a doutrina está alinhada com o entendimento do STJ, destacando a importância de atribuir-se ao árbitro a análise de sua própria competência, como faz Francisco José Cahali (in Curso de Arbitragem, CAHALI, José Francisco. Curso de Arbitragem. 7ª ed. São Paulo: Ed. RT, 2018) no trecho abaixo transcrito:

“[…] Esta regra é de fundamental importância ao instituto da arbitragem, na medida em que, se ao Judiciário coubesse decidir, em primeiro lugar, sobre a validade da cláusula, a instauração do procedimento arbitral restaria postergada por longo período, e, por vezes, apenas com o intuito protelatório de uma das partes em esquivar-se do cumprimento da convenção. O princípio, desta maneira, fortalece o instituto, e prestigia a opção das partes por esta forma de solução de conflitos, e afasta, em certa medida, o risco de desestímulo à contratação da arbitragem, em razão de potencial obstáculo prévio a surgir no Judiciário diante da convenção, por maliciosa manobra de uma das partes. […]”

(Grifou-se)

Desse modo, não há dúvidas de que o árbitro possui a prerrogativa de decidir a respeito de sua própria competência, avaliando, prioritariamente, a abrangência de sua jurisdição e, consequentemente, a existência, validade e eficácia do compromisso arbitral contratualmente firmado entre as partes.

Com isso, resta confirmada a precedência lógico-temporal do Juízo Arbitral em detrimento do Poder Judiciário, de modo que tais questões somente devem ser levadas ao Judiciário após a prolatação da Sentença Arbitral, na hipótese de as partes constatarem a existência de algum dos vícios elencados no art. 32 da Lei de Arbitragem que possam ensejar na nulidade da referida sentença. Assim, é evidente que, sempre que prevista cláusula arbitral no contrato firmado entre as partes, qualquer conflito dele decorrente deve ser analisado precipuamente pelo Juízo Arbitral, seja para decidir sobre sua competência para a solução da questão posta a julgamento, seja para avaliar a existência, validade e eficácia da cláusula arbitral contratualmente prevista.

A relevância dos programas de compliance ambiental

O sucesso do compliance no direito corporativo-financeiro disseminou tal instituto para diversas outras áreas, dentre elas, do direito ambiental. No entanto, como verdadeiro impulsionador do compliance ambiental, tem-se a exigência da sociedade, consumidores, órgãos governamentais e terceiro setor para que as empresas transpareçam preocupação na preservação do ambiente, assim como adotem práticas sustentáveis que visem o menor impacto à natureza.

As práticas sustentáveis, portanto, vêm aparecendo como possibilidade de aumento do valor de mercado da atividade empresária, elevando seu conceito junto ao público devido às estratégias de marketing. Dessa forma, as empresas vêm aliando o desenvolvimento econômico à preservação do meio ambiente, evitando futuras demandas judiciais decorrentes de possíveis danos ambientais por meio da prevenção de riscos, bem como, garantindo a aprovação dos consumidores e mercado em geral.

Não é só, contudo.

Apesar de que ainda persiste certa visão gerencial arcaica em alguns setores da economia brasileira, que entende que as obrigações ambientais e regulatórias são empecilhos burocráticos, a realidade das severas legislações ambientais vêm despertando a preocupação dos empresários sobre possíveis multas, dever de reparação de danos e outras sanções decorrentes dos danos ambientais ocasionados pela atividade empresarial inadequada e danosa à natureza.

Nesse ponto, é importante registrar que o valor das indenizações – de caráter solidário – decorrentes de condenações em reparação de danos causados pela atividade empresária pode ser muito superior ao ativo da empresa, o que poderá levar à responsabilização civil de seus administradores, acionistas, controladores, financiadores e de outros agentes econômicos que participaram da cadeia logística e que lucraram de alguma forma com a atividade.

É o programa de compliance ambiental responsável por antecipar eventuais irregularidades e identificar os pontos vulneráveis da empresa no âmbito de sua área de atuação. Contando com a participação de todos os setores e pessoas do quadro empresarial, os quais devem estar cientes da abrangência do programa e comprometidos com o cumprimento da legislação ambiental, é possível evitar acontecimentos danosos ao meio ambiente e problemas com os órgãos fiscalizadores de proteção ambiental, por autuações, sanções e/ou litígios.

Ademais, o compliance ambiental tem por objetivo monitorar e assegurar que as empresas cumpram rigorosamente as leis e normas ligadas ao meio ambiente, prevenindo e controlando riscos inerentes às atividades empresariais, isto a partir de uma revisão periódica das normas e dos processos produtivos, dentre outras medidas como a realização de auditorias internas e externas independentes, etc.

Arrematando, é importante dizer que não é por acaso que a longevidade dos empreendimentos econômicos depende de sua sensibilidade com relação aos eventos que lhe entornam, sendo instrumento imprescindível, portanto, o compliance ambiental, porque é mecanismo capaz de sustentar a atividade econômica dentro da legalidade, fornecendo às empresas a possibilidade de uma operação com maior responsabilidade, segurança e sustentabilidade.

Disponibilidade do direito de produção de provas e a prevalência da autonomia da vontade das partes no processo arbitral.

A flexibilidade do procedimento arbitral é uma das características mais marcantes da arbitragem, de modo que o procedimento pode ser sempre adequado ao litígio sob julgamento, atendendo aos interesses das partes envolvidas.

Essa flexibilidade está atrelada à preservação da autonomia da vontade das partes, as quais podem transacionar sobre as regras aplicáveis ao procedimento arbitral e, inclusive, as regras de direito aplicáveis à espécie, atentando-se apenas aos bons costumes e à ordem pública, conforme prevê o at. 2º da Lei nº 9.307/1996[1].

Para tanto, é essencial que as partes e os árbitros adotem uma postura cooperativa entre si, viabilizando, desse modo, a manifestação de todos os envolvidos sobre as questões postas para deliberação do Tribunal Arbitral.

Tal prática caracteriza o contraditório participativo, elemento essencial à viabilização de um procedimento justo e que se adeque às necessidades das partes envolvidas, pois, com sua aplicação, é assegurada às partes a possibilidade de manifestarem-se sobre todas as questões postas em discussão, assim como a possibilidade de influenciarem na decisão do árbitro ou do Tribunal Arbitral acerca da (des)necessidade de produção de provas adicionais.

Com isso, é permitido ao árbitro a análise acerca da pertinência de determinada prova e o momento adequado para sua execução, mas sempre sob a garantia de que as partes sejam devidamente ouvidas.

Em importante decisão, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, sob a relatoria do Ministro Marco Aurélio Bellizze, proferiu Acórdão nos autos do REsp nº 1903359 / RJ (2018/0320599-9), na qual foram analisadas as questões inerentes ao contraditório participativo e à necessidade de observância da vontade expressada pelas partes, com vistas a analisar a existência, ou não, de seu cerceamento de defesa.

No caso sob análise, foi ajuizada ação anulatória de sentença arbitral, com o propósito de desconstituir a sentença proferida no âmbito do procedimento arbitral, sob a justificativa de que a sentença proferida pelo Tribunal Arbitral teria incorrido em cerceamento de defesa e em indevido julgamento por equidade.

No presente artigo, abordaremos apenas a questão relativa à possibilidade, ou não, de cerceamento do direito de defesa da parte autora da ação, durante o procedimento arbitral, à medida em que analisamos o Acórdão proferido pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça e de relatoria do Ministro Marco Aurélio Bellizze – REsp nº 1903359 / RJ (2018/0320599-9).

Neste particular, a parte interessada alegou em suas razões que a não produção de prova pericial por ela requerida quando da instauração do procedimento arbitral acarretou cerceamento de seu direito de defesa, principalmente pelo fato de que sua pretensão supostamente não teria sido acolhida em razão da ausência de comprovação dos fatos alegados em sua exordial, o que, em teoria, não teria ocorrido se a prova pericial tivesse sido produzida.

Diante de todo o contexto dos autos, o Superior Tribunal de Justiça entendeu que não havia que se falar em cercamento do direito de defesa da parte interessada, pois “a não produção de outras provas, sobretudo a pericial, refletiu o desejo e a compreensão das partes acerca de sua absoluta desnecessidade, o que, repisa-se, foi externado e ratificado pelo comportamento inerte da interessada.”

Isso porque, na audiência de instrução realizada durante o procedimento arbitral foram colhidos depoimentos de testemunhas técnicas e, ao final do ato procedimental, apesar de questionada, a parte interessada não reiterou o pedido inicialmente formulado acerca da necessidade de realização de prova pericial, afirmando, expressamente, estar satisfeita com as provas até então produzidas, não restando dúvidas, pois, de que lhe fora assegurado o contraditório participativo.

Importante destacar que a oitiva das testemunhas técnicas foi uma das razões que tornou desnecessária a realização da prova pericial incialmente requerida pela parte interessada.

Nesse particular, é necessário registrar que, em que pese a nomenclatura comumente utilizada ser “testemunha técnica” (expert witness), a doutrina considera essa espécie probatória não como uma prova testemunhal, mas sim como uma prova técnica, uma vez que essa espécie de prova é produzida por profissionais especializados na área do conhecimento necessário para a solução da lide, sendo-lhes exigida independência e imparcialidade de seus laudos e depoimentos.

Sobre o tema, Marcelo Mazzola explica que:

“Além das testemunhas convencionais, na arbitragem é comum a participação das testemunhas técnicas (expert witness). São pessoas convocadas para emitir sua opinião em razão de seu conhecimento técnico sobre determinada matéria. Faz lembrar a prova técnica simplificada na esfera processual (art. 464, §§ 2º e 3º, do CPC/15).”[2].

(Grifou-se)

É evidente que a realização de prova técnica não exclui a possibilidade de realização de prova pericial, acaso as partes e o árbitro entendam que ela se demonstra necessária, o que, evidentemente, não foi a hipótese dos autos.

No entanto, é certo que, na hipótese, a parte interessada não renovou seu pedido de realização de prova pericial, embora pudesse tê-lo feito tanto ao final da audiência de instrução, quanto quando da prática de outros atos, na oportunidade de apresentação de alegações finais e até mesmo em eventual pedido de esclarecimentos quanto à Sentença Arbitral.

Nesse sentido, não há que se falar em cerceamento de defesa quando o que se observa, em verdade, é a estrita observância da vontade expressada pelas partes, as quais se deram por satisfeitas no que concerne às provas produzidas.

E tanto é assim que o Ministro Marco Aurélio Bellizze assevera em seu Voto que:

“A detida observância da vontade expressada pelas partes, a qual rege, de modo preponderante, o procedimento arbitral, não pode caracterizar, ao mesmo tempo, cerceamento de defesa.

Aliás, caso o árbitro deliberasse pela realização de determinada prova, mesmo após a parte a que aproveita ter se manifestado por sua desnecessidade, poderia expressar um agir oficioso tendente a frustrar a imparcialidade que legitimamente se espera do árbitro.” (Grifou-se)

Sendo assim, não há dúvidas de que a caracterização, ou não, do cerceamento do direito de defesa está diretamente atrelada ao contraditório participativo e à necessidade de observância da vontade expressada pelas partes ao longo de todo o procedimento arbitral, permitindo, desse modo, sua flexibilidade com vistas ao atendimento da necessidade das partes.

Desse modo, se a parte anteriormente interessada na produção de determinada prova afirma estar satisfeita com as provas já coligidas, não destacando a relevância da produção de outras provas, não há se falar em cerceamento do direito de defesa, mas sim na prevalência e respeito à vontade exteriorizada pela parte.

Assim, na hipótese de terem as partes sido ouvidas pelo juízo arbitral acerca da necessidade de produção de mais provas para a instrução do processo, respeitando-se o contraditório participativo, e elas expressarem sua satisfação com as provas até então coligidas, não haverá que se falar em cerceamento de sua defesa, pois a vontade por elas exteriorizada estará prevalecendo e sendo respeitada pelo juízo arbitral.


[1] Art. 2º A arbitragem poderá ser de direito ou de equidade, a critério das partes.

§ 1º Poderão as partes escolher, livremente, as regras de direito que serão aplicadas na arbitragem, desde que não haja violação aos bons costumes e à ordem pública.

§ 2º Poderão, também, as partes convencionar que a arbitragem se realize com base nos princípios gerais de direito, nos usos e costumes e nas regras internacionais de comércio.

§ 3o A arbitragem que envolva a administração pública será sempre de direito e respeitará o princípio da publicidade.

[2] MAZZOLA, Marcelo. Temas contemporâneos na arbitragem: do clássico ao circuito alternativo e alguns “curtas-metragens”. Revista de Processo, São Paulo, vol. 291, p. 427 – 466, Maio/2019.

Implementação de Participação nos Lucros e Resultados. Requisitos e vantagens

Uma boa maneira de reconhecer o desempenho dos empregados é por meio do pagamento de Participação nos Lucros e Resultados (PLR), agindo esta verba como ferramenta de “integração entre o capital e o trabalho e como incentivo à produtividade”, conforme disciplina o artigo 1º da Lei nº 10.101/2000 (Lei da PLR), que dispõe sobre o tema.

O artigo 2º desta lei define que a maneira correta para formalizar o pagamento da PLR é por meio de comissão paritária escolhida pelas partes (empregado e empregador), com a participação necessária de um representante indicado pelo sindicato dos trabalhadores da categoria ou de acordo coletivo, a ser firmado com o Sindicato que representa a categoria dos trabalhadores, sendo esta última opção a mais comum.

Além disso, para formalizar o pagamento da PLR, os instrumentos decorrentes da negociação devem cumprir alguns requisitos, para fazer constar (i) regras claras e objetivas quanto à fixação dos direitos substantivos da participação e das regras adjetivas; (ii) indicação dos mecanismos de aferição das informações pertinentes ao cumprimento do acordado; (iii) periodicidade da distribuição; (iv) período de vigência; e (v) prazos para revisão do acordo.

As regras elencadas supra devem ser estabelecidas com, no mínimo, 90 (noventa) dias de antecedência do pagamento da verba, sendo vedado o pagamento de PLR em mais de 2 (duas) vezes no mesmo ano civil e em periodicidade inferior a 1 (um) trimestre civil.

Entre as vantagens no pagamento da PLR, de forma espontânea pela empresa, está a possiblidade de compensação das obrigações oriundas de normas coletivas que versem sobre a mesma verba, a tributação pelo imposto sobre a renda exclusivamente na fonte e a não integração da base de cálculo do imposto devido pelo beneficiário na Declaração de Ajuste Anual, tudo nos moldes do artigo 3º, §5º da Lei referida.

Louvável, ainda, o incentivo que a própria Lei da PLR traz ao recurso da mediação ou arbitragem (meios alternativos de solução de litígios) para solução de qualquer entrave durante o processo de negociação.

Quanto ao pagamento deste benefício ser feito apenas em relação à parte dos empregados, esta conduta não vem sendo acatada pela Justiça do Trabalho, por se afigurar como discriminatória. O Desembargador Dr. José Marlon de Freitas, da 8ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais, Relator do Recurso Ordinário oriundo da Reclamação Trabalhista nº 0000456-68.2015.5.03.0016, ponderou que “considera-se que todos os empregados de uma empresa contribuem para o resultado positivo por ela alcançado, razão pela qual configura-se ato discriminatório a exclusão injustificada do direito de determinados trabalhadores de receberem a verba participação nos lucros e resultados”.

Entender de forma diversa seria ir de encontro ao princípio constitucional da isonomia (art. 5º, caput, da CR), razão pela qual se orienta que, uma vez implementada a PLR, a verba deve, preferencialmente, ser distribuída para todos os empregados da companhia.