Vazamento de Dados: Dano Moral não é presumido

A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em decisão recente, deu provimento do Recurso Especial interposto pela empresa Eletropaulo, reformando, por unanimidade, o acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), que havia condenado a concessionária de energia ao pagamento de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a título de indenização por danos morais em virtude do vazamento de dados pessoais de uma cliente.

Ao ajuizar a ação, a consumidora alegou que foram vazados seus dados pessoais como nome, data de nascimento, endereço, telefone e número do documento de identificação e que estas informações teriam sido acessadas por terceiros e, posteriormente, compartilhadas mediante pagamento.

Em primeira instância, a ação foi julgada improcedente. Contudo, o TJSP, quando da análise do recurso interposto pela parte Autora, reformou a decisão para condenar a Eletropaulo ao pagamento da indenização, sob justificativa de que teria havido falha na prestação de serviços.

Na sequência, a Eletropaulo interpôs recurso ao STJ, fundado na impossibilidade de análise da demanda apenas sob a ótica consumerista e na omissão quanto aos termos da  Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).

Quando do julgamento do Recurso, o Relator Ministro Francisco Falcão entendeu pelo provimento do recurso da concessionária, asseverando, apesar da falha no tratamento de informações pessoais, o vazamento de dados, por si só, não é suficiente para gerar dano moral indenizável, sendo necessário, portanto, a comprovação do efetivo prejuízo causado pela exposição das informações.

– Ana Beatriz Vinesof

Algumas novidades da ANPD

O ano de 2023 acabou de começar e, com ele, a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) deixou de ser uma autarquia com status de agência reguladora vinculada à Secretaria Geral da Presidência da República e passou a ser vinculada ao Ministério da Justiça.

O instrumento jurídico utilizado para tanto foi o Decreto n° 11.348, datado de 1º de janeiro de 2023, que, estabeleceu, também, a competência do Ministro da Justiça e Segurança Pública para ditar as políticas do Tratamento de Dados Pessoais, inclusive, com estratégia comum baseada em modelos de gestão e de tecnologia que permitam a integração e a interoperabilidade dos sistemas de tecnologia da informação dos entes federativos, nas matérias afetas à Justiça e Segurança Pública.

A nova vinculação da ANPD reflete no Conselho Nacional de Proteção de Dados Pessoais e da Privacidade que, também, fica vinculado ao Ministério da Justiça.

Os profissionais que lidam com proteção de dados no Brasil estão confiantes que esses novos rumos da ANPD viabilizem a sua completa estruturação, para que as suas atribuições, previstas no artigo 55-J da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), sejam executadas na íntegra.

Por hora, a ANPD vem editando seus atos normativos, especialmente, de cunho pedagógico, a exemplo do lançado no último dia 23 de dezembro de 2022. Trata-se do novo formulário para comunicação de incidentes de segurança (CIS) pelos controladores de dados pessoais para a ANPD. 

Prevista pela Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), a comunicação de incidente de segurança (CIS) permite aos titulares tomarem conhecimento de eventuais violações de seus dados pessoais. Possibilita, também, que os agentes de tratamento demonstrem à Autoridade o cumprimento de suas obrigações legais relativas ao incidente e a adoção de medidas de segurança adequadas às suas atividades de tratamento de dados.

O novo formulário foi desenvolvido para facilitar o preenchimento pelos controladores e a análise das comunicações de incidentes pela ANPD, sendo certo que restou ampliado o uso de respostas estruturadas, bem assim, foram incluídas orientações sobre o processo de comunicação de incidentes no seu bojo.

O novo formulário só pode ser encaminhado em formato pdf, por meio do Peticionamento Eletrônico do SUPER.BR (Sistema Único de Processo Eletrônico em Rede). 

A implantação do novo formulário para a comunicação de incidente de segurança (CIS) reforça a importância da atuação, junto às empresas, do Encarregado de Dados, ou DPO – Data Protection Officer, impondo, por conseguinte, a necessária e indispensável adequação dos diversos setores da economia brasileira aos ditames da Lei Geral de Proteção de Dados.

Recuperação Judicial e Revisão dos Contratos

Em recentíssimo julgado, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que a habilitação do crédito e a posterior homologação do plano de recuperação judicial não impedem a rediscussão do seu valor em sede de ação revisional de contrato (Resp n° 1700606 – PR).

A decisão teve origem em ação proposta por uma empresa em recuperação judicial contra uma instituição bancária, visando à revisão de contratos de empréstimo, em virtude de suposto excesso na cobrança de juros e outras irregularidades.

Em sua defesa, o banco alegou que, ao apresentar o pedido de recuperação, a empresa concordou tacitamente com todas as cláusulas inseridas nos contratos, o que impediria o ajuizamento da ação revisional.

Asseverou, ainda, que seu crédito, de mais de R$ 4 milhões, já devidamente habilitado, não foi impugnado no prazo legalmente previsto, de modo que, sobrevindo a homologação do plano de recuperação, não mais seria possível a rediscussão do valor em ação revisional de contrato bancário.

O Relator do processo no STJ, o Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva ressaltou que, conforme o artigo 59 da Lei n° 11.101/2005, o plano de recuperação judicial implica novação dos créditos anteriores ao pedido e obriga o devedor e todos os credores a ele sujeitos, sendo certo que o reconhecimento judicial da concursalidade do crédito, habilitado ou não, torna obrigatória a sua submissão aos efeitos da recuperação.

O Ministro observou também que a mesma lei, em seu artigo 50, inciso I, quando utiliza um conceito aberto ao tratar das “condições especiais para pagamento”, deixa transparecer que tal norma deve ser interpretada da forma mais ampla possível, admitindo a adoção de qualquer condição que seja aceitável para os credores e que possam contribuir para o soerguimento da empresa recuperanda, ante o princípio da preservação da empresa que norteia o processo recuperacional.

Em relação ao crédito já habilitado, o relator ponderou que, ainda que já tenha sido homologado pelo juízo da recuperação, nada impede que sobrevenham acréscimos ou decréscimos por força de provimento jurisdicional definido em demandas judiciais em curso, a ensejar a aplicação da condição especial definida no plano de recuperação ao novo valor do débito judicialmente reconhecido.

De fato, ante a importância da temática para as empresas que se encontram em recuperação judicial, a consolidação deste entendimento configura uma chance a mais para o efetivo soerguimento empresarial.

Negócios Imobiliários Via Token e Aspectos Registrais

A dinâmica do mercado tem produzido transformações e importantes inovações a respeito da possibilidade da tokenização da propriedade imobiliária.

Para a International Organization of Securities Commissions (IOSCO), a tokenização é “o processo de representar digitalmente um ativo ou propriedade de um ativo”. A criação de direitos ou créditos no meio digital, através da tecnologia blockchain, tem sido conhecida como tokenização.

Em referência ao assunto abordado, temos o recente pronunciamento do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, por meio do Provimento 38/21 da a Corregedoria-Geral da Justiça (CGJ), o qual regulamentou a lavratura de escrituras públicas de permuta de bens imóveis por tokens, bem como o respectivo registro imobiliário.

A escritura pública que motivou a CGJ do Rio Grande do Sul a editar o referido provimento remete à permuta de um imóvel por um token criado através de smart contract na rede principal do Ethereum (main network), tendo sido lavrada em 18 de maio de 2021.

O modelo de tokenização imobiliária proposto pela empresa Netspaces, permutante no ato originário do processo, foi o seguinte:

  1. O proprietário acessa o site da empresa e solicita a digitalização do imóvel de sua propriedade;
  2. O proprietário e a empresa assinam uma escritura de permuta, pela qual a empresa recebe a propriedade do imóvel, que se transformará em propriedade digital;
  3. Neste ato, o proprietário paga o ITBI devido ao município e os custos da escritura;
  4. A seguir, o proprietário paga os custos do registro da escritura no cartório de imóveis. Feito o registro, a mencionada empresa adquire a propriedade efetiva do imóvel;
  5. Uma vez “digitalizado” o imóvel, a empresa registra a transação e a propriedade digital na blockchain em nome do antigo proprietário, o qual terá apenas a propriedade digital, representada por um token.

Ainda de acordo com o modelo proposto, após a “digitalização da propriedade”, o dono do imóvel digital e, por conseguinte, detentor do token que representa essa sua qualidade no ambiente virtual, pode aliená-lo a terceiros, desde que as transações sejam realizadas dentro da plataforma da Netspaces, conforme artigos 33 e 34 do regulamento supracitado.

Além disso, remanesce ao proprietário digital uma relação possessória sobre a propriedade real, regida pelas disposições do Código Civil. Logo, o direito de usar o imóvel em propriedade digital poderá ser exercido pelo proprietário digital ou, de acordo com a sua vontade, por terceiros, a título gratuito ou oneroso.

Não obstante, a faculdade de fruir do imóvel em propriedade digital pertence ao proprietário digital, o qual poderá transferi-lo em caráter não definitivo a quem queira, a título gratuito ou oneroso.

As vantagens da tokenização imobiliária são inegáveis: possibilitam o fracionamento do valor patrimonial permitindo ao investidor um baixo valor de entrada, permitem a diversificação dos ativos, pois um token pode estar vinculado a diversos imóveis (residenciais, comerciais, industriais etc.). Outras vantagens são a liquidez imediata e a eficiência de custos decorrente da automação e dispensa de intermediários.

Por fim, é notória a importância que a CVM e o Banco Central regulamentem a tokenização de ativos imobiliários. O mercado imobiliário global é imenso, com valor estimado em US$ 280 trilhões. A tokenização dará acesso, fluidez, liquidez e amplo acesso a pequenos investidores a este mercado.

Confira na íntegra: Provimento nº 38/2021 e Regulamento da Propriedade Digital V0.5.

Revisão das atividades concomitantes aprovada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ): oportunidade de aumento da renda mensal da aposentadoria

Em 2020, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) afetou o Tema Repetitivo nº 1.070 com a finalidade de definir a possibilidade ou não de somar as contribuições oriundas de atividades exercidas para dois ou mais empregadores no cálculo dos benefícios do INSS. De acordo com o julgamento ocorrido em 11/05/2022, foi fixada a seguinte tese para o Tema nº 1.070: “Após o advento da Lei 9.876/1999 e para fins de cálculo do benefício de aposentadoria, no caso de exercício de atividades concomitantes pelo segurado o salário de contribuição deverá ser composto da soma de todas as contribuições previdenciárias por ele vertidas ao sistema, respeitado o teto remuneratório.”

Desde a Lei nº 13.846/2019, editada em 18/06/2019, a forma de cálculo dos benefícios para quem exercia mais de uma atividade remunerada e recolhida contribuição previdenciária em cada uma dessas atividades, foi alterada passando a somar integralmente os salários de contribuição. A grande questão estava nos benefícios concedidos antes de 18/06/2019, onde o INSS considerava a atividade que tinha maior tempo de contribuição como primária e a outra como secundária. Da atividade secundária apenas era considerado no cálculo um percentual menor da média dos salários de contribuição, o que diminuía de forma considerável a renda mensal da aposentadoria.

Com o julgamento do Tema nº 1.070, os aposentados até 18/06/2019 que desempenharam atividades concomitantes e recolherem contribuição previdenciária nos dois ou mais empregos, desde que o recolhimento não tenha atingido o teto do INSS (R$ 7.087,22), pode ter direito à revisão do benefício na via judicial. Isso acontece mais comumente com médicos, dentistas, enfermeiros, vigilantes, professores e profissionais autônomos.

Ainda, merece atenção o prazo decadencial, pois somente poderá pedir a revisão de forma judicial o segurado que tenha recebido a primeira aposentadoria há menos de 10 anos. Portanto, é  necessária a avaliação de um especialista em direito previdenciário antes de ingressar com o pedido na via judicial, para analisar se o aposentado se encaixa nos requisitos e se a revisão será positiva, aumentando a renda mensal da aposentadoria, caso sejam somados integralmente os salários de contribuição das atividades concomitantes.

Foram publicadas as leis que tratam da Outorga Onerosa e da Transferência do Direito de Construir, complementares ao Plano Diretor do Município do Recife

Em 23 de março deste ano, foi dado um importante passo para o desenvolvimento urbano do município de Recife com a publicação de duas leis que regulamentam a Outorga Onerosa e a Transferência do Direito de Construir: a lei municipal de nº 18.900/2022, regulamenta o instrumento urbanístico da Outorga Onerosa do Direito de Construir (OODC), e a lei municipal de nº 18.901 estabelece as normas e procedimentos que regulamentam a aplicação do instrumento urbanístico da Transferência do Direito de Construir (TDC), ambas estavam previstas na Lei Complementar nº 02/2021, a qual instituiu o Plano Diretor do Município do Recife.

Desde o final de 2020, quando da publicação do Plano Diretor do Recife, estas leis estavam pendentes de edição, o que impossibilitava o licenciamento de novos empreendimentos que se utilizassem da OODC e da TDC.

Em linhas gerais, a OODC viabiliza a concessão do direito de construir referente ao potencial construtivo adicional, mediante pagamento de contrapartida financeira a ser realizada pelos beneficiários. Trata-se de uma fórmula simples, na qual o potencial construtivo adicional corresponderá à diferença entre o potencial construtivo máximo a ser utilizado e o potencial construtivo básico. O pagamento da OODC aplica-se a todos os empreendimentos que utilizarem potencial construtivo adicional conforme projeto aprovado, inclusive de reforma com acréscimo de área, alteração durante a obra ou legalização. I seu valor será fixado no ato do requerimento da licença de construção do empreendimento. Já a TDC diz respeito à autorização ao proprietário de imóvel urbano em exercer em outro local ou a alienar o seu direito de construir até o coeficiente de aproveitamento básico, quando, por razões de interesse público, esse direito não puder ser exercido, no todo ou em parte, no terreno de origem. Desse modo, já é possível às construtoras licenciarem seus projetos que se enquadrem nas hipóteses da aplicação destes dois instrumentos.

SAFs – breves considerações

As Sociedades Anônimas de Futebol (SAFs), abalizadas pela recente Lei n° 14.193/21, vêm se tornando um caminho natural a ser seguido ou, pelo menos discutido, por grande parte dos clubes brasileiros de futebol, que, preponderantemente, adotam o modelo associativo.

A nova Lei vem permitindo aos clubes, além da implementação de mecanismos próprios do instituto da Recuperação Judicial, a constituição de uma empresa e a consequente transferência de seus ativos e direitos relativos ao futebol, podendo ser negociados com investidores que venham a se tornar responsáveis pela administração.

Já com alguns meses de valência, a Lei já possibilitou a observação de alguns casos interessantes de adequação aos seus termos, mesmo impondo uma série de exigências, a saber: a adoção de medidas de gestão, transparência e responsabilidade. Porém, o mais importante para se falar na criação de uma SAF, não está na lei. Trata-se de vontade política. Os atuais cartolas terão que abrir mão do seu poder em favor do investidor, e isso não é simples.

No Brasil, alguns cenários são possíveis em termos de constituição das SAFs, sendo preliminarmente visto como mais adequado aos clubes, como no caso de Botafogo, Cruzeiro e Vasco, 3 das agremiações mais tradicionais e relevantes do país.

Até o presente momento, Botafogo e Cruzeiro já bateram o martelo quanto à convolação em SAF, tendo transferido suas vagas nos campeonatos de disputa no ano de 2022, conquistadas pelos clubes, às respectivas SAFs.

Registre-se que para um Clube de Futebol se tornar uma SAF há necessidade de aprovação pelos Conselhos Deliberativos dos respectivos clubes interessados no modelo, mesmo sendo vantajosa essa transformação. Sim, a SAF tem uma tributação mais vantajosa que os outros tipos de regime, como a sociedade limitada ou anônima, por exemplo. Além disso, um outro benefício que podemos citar com a conversão do Clube de Futebol em SAF é a centralização das dívidas cíveis e trabalhistas, configurando-se em uma alternativa viável para associações, sem fins lucrativos, que estavam em estado de insolvência.

Vejam que o texto legal permite a conciliação e manutenção do aspecto peculiar do futebol nacional, inconteste manifestação cultural e econômico-social, razão pela qual diversos outros clubes discutem a aderência ao formato, alguns até em processo mais avançado, com acordo apalavrado com investidores.

É inevitável atrelar a onda das SAFs ao momento econômico vivido em meio à pandemia de COVID-19, fator que agravou severamente a situação de vários clubes nacionais. A realidade de dívidas milionárias tornou-se deletéria, gerando a demanda de algum mecanismo que permitisse o soerguimento das diversas agremiações em cheque, assim como acontece no mundo empresarial, inclusive por meio do instituto recuperacional, possível às SAFs ante a previsão do artigo 25 da Lei n° 14.193/21.

A Sociedade Anônima do Futebol passa a responder pelas obrigações que lhe forem transferidas no momento da sua constituição, podendo assumir as dívidas advindas das gestões do clube que a precedeu. O novo sócio controlador, portanto, pode quitar integralmente as dívidas (principalmente as de curto prazo que travam o clube), negociar o pagamento delas diretamente com os credores e/ou requerer a Recuperação Judicial. Já vislumbrando essa possibilidade, a lei definiu que 20% (vinte por cento) da receita corrente mensal será destinada ao pagamento das obrigações, conforme plano aprovado pelos credores.

É importante mencionar que as diferenças da SAF para o tradicional modelo associativo dos clubes ou de uma empresa tradicional, é que ele se mostra mais transparente, com regras claras de governança e com fiscalização pela Comissão de Valores Mobiliários, a CVM, o que deixa o negócio mais interessante para os investidores, por se mostrar mais seguro.

O leitor pode se perguntar se não existe riscos para essa operação? Sim, há riscos e eles decorrem, justamente, desse regramento mais severo, que impõe consequências no caso de não observância dessas medidas, que vai da responsabilização pessoal dos gestores até mesmo falência do clube.

Inobstante, essa situação não vem intimidando os Clubes de Futebol, inclusive, os de Pernambuco.

Vejamos o caso do Santa Cruz Futebol Clube, tradicional clube da capital pernambucana. Buscando a reestruturação e renegociação de seu passivo, bem como a preservação da atividade operacional, o Santa requereu, no início de 2022, a instauração de procedimento de mediação pré-recuperacional, a medida em que buscará a composição com seus credores através dos mecanismos de conciliação e mediação legitimados. Além disso, foi distribuído pedido de tutela cautelar antecedente, com pedido de suspensão das execuções e medidas constritivas e expropriatórias pelo prazo de 60 (sessenta) dias, tempo necessário, em tese, para que as mediações ocorram e sejam concretizadas.

A decisão prolatada no pedido cautelar (de nº 0014524-96.2022.8.17.2001), pelo juiz de Direito, Dr. Ailton Soares Pereira Lima, referendou a possibilidade de uma empresa, em caráter antecedente à instauração da Recuperação Judicial, iniciar o período de autocomposição com seus credores, bem como a suspensão cautelar de execuções em meio às negociações.

No que tange a discussão em torno da convolação em SAF, a decisão versa sobre a evidente legitimidade ativa do Requerente, no sentido de que o Santa Cruz Futebol Clube pode requerer Recuperação Judicial. Leia-se: “a despeito de constituída sob a forma de associação, a sociedade atua e exerce atividade econômica organizada, com óbvia finalidade de obtenção de lucro, ainda que não seja voltado à distribuição entre os associados. Nesses casos, a despeito da forma, há, ali, o que se pode chamar de elementos de empresa (… Nesses casos excepcionais em que verificada a empresarialidade da atividade, em consonância com os elementos caracterizadores descritos no Art. 966 do CC, não há razão para negar o reconhecimento da natureza empresarial à associação civil. E o mercado do futebol no Brasil ilustra com clareza esta realidade”.

A argumentação se estende, atestando a ideia de que os clubes do futebol brasileiro já se estruturam como empresas, e que agora há sustentação na Lei Federal n° 14.193/21, que, no seu artigo 1º, §1º, I, define o  “clube” como “associação civil, regida pela Lei nº. 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), dedicada ao fomento e à prática do futebol”. O artigo 13 da novel legislação também corrobora a ideia de empresa aos Clubes de Futebol, quando assevera que “o clube” poderá efetuar o pagamento de seu passivo “por meio de recuperação judicial ou extrajudicial, nos termos da Lei nº. 11.101, de 09 de fevereiro de 2005”.

Outras decisões judiciais se apresentam sobre o assunto, chancelando o instituto da SAF, a exemplo do pedido recuperacional formulado pela Associação Chapecoense de Futebol, o qual foi deferido por decisão da 1ª Vara Cível da Comarca de Chapecó/SC (processo de nº 5001625- 18.2022.8.24.0018).

A decisão supra é de fundamental importância para o estudo dos efeitos preliminares da chamada “Lei das SAFs”. Independentemente da natureza jurídica, seja empresa ou associação, a principal mudança no futebol brasileiro, especialmente, tem que ser de gestão, que precisa ser profissional, transparente e eficiente. Portanto, torcedor, não acredite em mágica, mas cobre sempre trabalho responsável dos seus Clubes, exigindo, inclusive, a sua transformação em SAF.

Senado aprova o PL 548/2019, que aborda as assembleias virtuais

Aprovado em 15 de fevereiro de 2022 e proposto pela senadora Soraya Thronicke (PSL-MS), o Projeto de Lei nº 548/2019 passa pelo Senado e segue à  sansão presidencial. Com o objetivo de reforçar a necessidade de oportunizar outras formas de se realizar uma reunião ou assembleia além da forma presencial, o projeto autoriza a realiazaçõ de assembleias e votações virtuais pelos condomínios.

Nesse sentido, a convocação da assembleia deverá dispor de instruções sobre a sua realização exclusivamente por meio virtual, ou híbrido(mista), quando há possibilidade de participar presencial e virtualmente, com instruções de acesso, manifestação e coleta de votos. Ao final, a ata será lavrada após a somatória e divulgação dos votos. Além disso, todos os documentos pertinentes à ordem do dia poderão ser disponibilizados de forma física ou eletrônica.

A administração, contudo, não poderá ser responsabilizada por problemas dos dispositivos ou conexão à internet daqueles que participam, nem por outras situações que não estejam sob o seu controle.

Ainda, no caso de não ser alcançado o quórum, é permitido à assembleia, por decisão da maioria dos presentes, declarar a sessão permanente, desde que: havendo mais de uma suspensão, a deliberação ocorra no prazo total máximo de 90 (noventa) dias, contados da sessão inicial, sejam indicadas a data e a hora da continuação dos trabalhos, sendo apontado o tema pendente de deliberação, e os presentes sejam alertados e os ausentes convocados, anexando-se a ata parcial, que deve contemplar o que ocorrer na continuação dos trabalhos.

As reuniões virtuais e híbridas são mais democráticas, pois permitem que mais pessoas possam participar, agilizando, com isso, o processo de deliberação das pautas. Apesar de na prática vários condomínios já se utilizarem dessas inovações, é importante que exista uma lei regulando o assunto.

Confira na íntegra: PL 548/2019.

A adoção da “Fórmula do Valor Presente” como redutor para pagamento de pensão mensal vitalícia em parcela única.

A Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) adotou, recentemente, a “Fórmula do Valor Presente” como critério para o pagamento da pensão mensal em parcela única.

Tal fórmula é bastante conhecida na área das ciências exatas e é utilizada para diversos fins, inclusive na amortização de quantias referentes a empréstimos pagos antes do vencimento.

Para o colegiado, o método permite uma retirada periódica que corresponda à renda mensal e que, ao mesmo tempo, amortize parte do capital, de forma que ele se esgote ao final do período de duração estipulado.

Para contextualizar, no caso do julgamento (RRAg-258-62.2014.5.05.0193), uma ex-bancária obteve o reconhecimento do direito à indenização por danos materiais em decorrência de incapacidade total e permanente da autora para as funções que exercia, indenização esta na forma de pensão mensal até que completasse 65 anos e tendo como base o piso salarial da categoria. Como o pagamento seria feito de uma só vez, o Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região, tribunal de origem da ação, aplicou redutor por arbitramento, qual seja, de 50%.

Já no TST, parte da discussão girou em torno da aplicação de redutor no caso do pagamento da pensão vitalícia em única parcela e a decisão proferida pelo Tribunal Regional foi reformada. Para o Ministro-relator Amaury Rodrigues Pinto Junior, a opção pelo pagamento da indenização de pensão em cota única tem como efeito a redução do valor a que o empregado teria direito em relação à percepção da pensão paga mensalmente.

Foi considerado que no pagamento de indenização por dano material em parcela única ocorre a antecipação temporal de parcelas que deveriam ser pagas em diversos meses, sendo adequada a utilização de um critério redutor.

O método adotado, “Fórmula do Valor Presente”, para a conversão da pensão mensal vitalícia em parcela única, considera o valor periódico e o tempo de duração do pensionamento. No caso, ficou determinado que o montante final da indenização deve permitir uma retirada periódica que corresponda à renda mensal do trabalhador e, ao mesmo tempo, amortize parte do capital de forma que ele se esgote apenas ao final do período de duração estipulado (o tempo de expectativa de vida, conforme tabela de mortalidade do IBGE).

Por fim, ficou determinado, pela Primeira Turma do TST, que deve ser adotada a fórmula que permite realizar o cálculo do “valor presente” apenas quanto às prestações mensais futuras, enquanto os valores pretéritos ao momento do pagamento do pensionamento deverão ser quitados pelo valor integral.

Para tanto, o cálculo deve levar em conta três variáveis: a última remuneração do trabalhador; a quantidade de meses que faltarem para atingir o tempo de expectativa de vida, conforme tabela de mortalidade do IBGE; e a taxa de juros a ser descontada, correspondente a 0,5% ao mês.

6ª Turma do TST decide que obrigação de recolher FGTS não é satisfeita quando o depósito é realizado diretamente na conta do trabalhador

O Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) foi criado com o objetivo de proteger o trabalhador demitido sem justa causa, mediante a abertura de uma conta vinculada ao contrato de trabalho. Em outras palavras, é uma reserva de dinheiro destinada a amparar o trabalhador momentaneamente desempregado.

Seu regulamento está previsto na Lei 8.036/1990, que prevê, em seu artigo 15, que todos os empregadores ficam obrigados a depositar, até o dia 7 (sete) de cada mês, em conta bancária vinculada, a importância correspondente a 8% (oito por cento) da remuneração paga ou devida, no mês anterior, a cada trabalhador.

O artigo 18 da Lei 8.036/1990 prevê que em caso de rescisão do contrato por parte do empregador, ficará este obrigado a depositar na conta vinculada do trabalhador no FGTS os valores relativos aos depósitos referentes ao mês da rescisão e ao imediatamente anterior, que ainda não houver sido recolhido.

Foi com base em tais artigos que a Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST), firmou entendimento no sentido de que a obrigação de recolher o FGTS não é cumprida enquanto não se a realiza por meio de depósito em conta vinculada e determinou que uma empresa de assessoria contábil deposite os valores devidos mensalmente e a multa de 40% (quarenta por cento) na conta de um trabalhador contratado por meio de uma pessoa jurídica (“pejotização”).

No caso levado a julgamento da Corte Trabalhista, o trabalhador alegou que recebia salário no valor de R$ 12.087,00 mais R$ 970,00, sendo este valor pago “por fora”, de modo que seu salário somava R$ 13.057,00. Pleiteou os depósitos do FGTS de todo o período da prestação de serviço. Em defesa, a empresa de assessoria contábil afirmou que o trabalhador, além dos R$ 12.087,00 mensais, recebia, na verdade, mais R$ 967,00 a título de FGTS, tendo anexado aos autos do processo os comprovantes de depósito dos valores, em conta poupança do reclamante, com descrição FGTS. Por fim, aduziu a empresa que o fato de não ter observado que os depósitos deveriam ser realizados em conta vinculada ao FGTS não impõe novo pagamento, uma vez que o ordenamento jurídico brasileiro veda o enriquecimento sem causa.

O juízo de primeira instância condenou a empresa ao recolhimento do FGTS na conta vinculada do trabalhador, com o entendimento de que o depósito em sua conta poupança não é a forma devida de pagamento da parcela. Contudo, o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região acolheu o argumento da empresa de que o pagamento direto dizia respeito ao FGTS e, portanto, não caberia novo recolhimento.

Ao chegar à análise do TST, a Sexta Turma decidiu que a manutenção da decisão proferida pelo TRT da 2ª Região violava os artigos 15 e 18 da Lei 8036/1990, pois a obrigação de recolher o FGTS não é cumprida enquanto não se realiza por meio de

depósito em conta vinculada, que permite, inclusive, a utilização desses aportes para fim social, transcendendo o interesse individual do trabalhador. A empresa foi condenada ao recolhimento do FGTS, incluindo em sua base de cálculo o valor depositado ilegalmente, em conta particular do trabalhador, com essa finalidade.

Assim, alertamos que a realização de depósito paralelo para equivaler ao FGTS não exonera o empregador de realizar o depósito em conta vinculada e tal conduta pode ser considerada fraude ao FGTS. Além disso, o FGTS reveste-se da natureza de salário-diferido e, se recolhido de forma ilegal, como no caso ora analisado, passa a compor o salário do trabalhador.