Multa prevista em acordo homologado judicialmente tem natureza de cláusula penal, decide o STJ

No julgamento do Recurso Especial nº 1.999.836/MG, de Relatoria da Min. Nancy Andrghi, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, entendeu que a multa prevista em acordo homologado judicialmente tem natureza jurídica de multa contratual (cláusula penal), e não de astreintes. Assim, a sua redução se submete às normas do Código Civil (CC).

Com base neste entendimento, negou-se provimento ao referido Recurso Especial, uma vez que a imobiliária recorrente sustentava que a multa por atraso no cumprimento da obrigação, pactuada em transação homologada judicialmente, deveria caracterizar-se como astreintes, e, por isso, poderia ser revisada a qualquer tempo, por força do artigo 537, parágrafo 1º, do Código de Processo Civil.

Mas, ao contrário disso, a relatora do julgamento do recurso no STJ, a ministra Nancy Andrighi, observou que a transação é um contrato típico, previsto nos artigos 840 e 842 do Código Civil, de modo que a multa discutida no referido caso, por decorrer de acordo firmado entre as partes, tem natureza jurídica de multa contratual, ou seja, a chamada cláusula penal, prevista nos artigos 408 a 416 do Código Civil.

Inclusive, a Magistrada ainda ressaltou que o artigo 413 do Código Civil prevê expressamente a possibilidade da multa ser reduzida equitativamente pelo juiz se a obrigação principal tiver sido cumprida em parte, ou se o montante da penalidade for manifestamente excessivo, tendo em vista a natureza e a finalidade do negócio.

E finalizou explicando, no referido julgamento, que como a multa prevista em transação homologada judicialmente tem natureza de cláusula penal, e não de astreintes, a imobiliária (recorrente) deveria ter fundamentado o pedido de revisão do valor com base no artigo 413 do CC, e não no artigo 537, parágrafo 1º, do CPC. Além disso, a E. Ministra comentou que a análise de eventual desproporcionalidade da cláusula penal só ocorre excepcionalmente em recurso especial, em razão da Súmula 5 e da Súmula 7 do STJ.

 No referido julgamento, portanto, a 3ª Turma do STJ deixou claro que a multa contratual derivada de um acordo homologado judicialmente tem a natureza de uma cláusula penal, regulamentada pelos artigos 408 a 416 do Código Civil, só podendo sofrer alguma revisão consoante as hipóteses expressamente elencadas no artigo 413 do mesmo código.

STF julga constitucional condicionar liberação de mercadorias importadas ao recolhimento de diferença tributária e multa

O Supremo Tribunal Federal, no dia 16/09/2020, julgou o Tema 1.042, com repercussão geral reconhecida, para firmar a tese de que “é constitucional vincular o despacho aduaneiro ao recolhimento de diferença tributária apurada mediante arbitramento da autoridade fiscal”, configurando um cenário desfavorável ao contribuinte importador.

Como se sabe, a entrada de mercadorias no Brasil ocorre através do procedimento de despacho aduaneiro, no qual a Autoridade Aduaneira deve verificar a regularidade da importação realizada pelo importador, o recolhimento dos tributos incidentes e, por fim, possibilitar o desembaraço aduaneiro da mercadoria.

Ocorre que, caso se verifique o recolhimento tributário a menor do que entende ser devido, a Receita Federal deverá impossibilitar a internalização do bem, até que o contribuinte efetue o adimplemento da diferença do tributo e da multa aplicada, conforme determina o artigo 571, §1º, inciso I, do Regulamento Aduaneiro (Decreto nº 6.759/2009).

Nesse sentido, a discussão levada a julgamento pela Corte Suprema derivou, principalmente, do conflito entre este procedimento legal de conferência e desembaraço aduaneiro e o regramento estabelecido na Súmula nº 323 do STF, a qual prevê a proibição de apreensão de mercadorias como meio coercitivo para o pagamento de tributos.

Em instância anterior deste Recurso Extraordinário nº1.090.591/SC (leading case), o Tribunal Regional Federal da 4 Região havia entendido que a Receita Federal deveria internalizar a mercadoria importada, ainda que verificada a diferença tributária a ser recolhida, com fundamento na referida súmula, uma vez que, se não o fizesse, estaria apreendendo o bem com o fim de recolher o tributo e a multa incidente.

Contudo, por unanimidade, o STF entendeu que tal procedimento não configuraria uma apreensão da mercadoria, mas apenas a retenção do produto até o momento que forem verificados os requisitos legais a ensejarem a entrega do bem ao importador.

A diferença em relação à “apreensão” de bens, apontada pelo Ministro Alexandre de Moraes, estaria no fato de que, o impedimento da liberação da mercadoria, nestas condições, não seria uma sanção política, pois a tributação da importação possui caráter predominantemente extrafiscal. Ou seja, o que prevalece é a intenção do Estado de proteger a indústria nacional, e não a arrecadação de recursos financeiros.

Portanto, com base nesta decisão, com efeitos para todos os contribuintes, torna-se constitucional que a Alfândega brasileira impeça o desembaraço aduaneiro do bem até o momento em que o importador recolha a diferença tributária aferida na conferência e a respectiva multa incidente.

 


Por Vitor Beltrão