A importância do respeito ao sigilo médico

A responsabilidade pela quebra do sigilo médico decorre da importância da referida prática para a relação médico-paciente. É mais que um pilar fundamental para a prestação de qualquer serviço de saúde, mas também uma obrigação legal que todo profissional de saúde deve cumprir, aplicável a todas as informações obtidas em razão da função ou cargo que exerce.

No Código de Ética Médica, por exemplo, há um capítulo destinado exclusivamente ao tema do sigilo profissional, tamanha a sua importância, e no referido capítulo IX há a previsão expressa, no artigo 73, de que “é vedado ao médico revelar fato de que tenha conhecimento em virtude do exercício de sua profissão, salvo por motivo justo, dever legal ou consentimento, por escrito, do paciente”.

Inclusive resta consignado ainda no Código de Ética Médica e na Resolução nº 1.605/2000 do CFM que a proibição da disponibilização das informações permanece i) mesmo que o fato seja de conhecimento público ou o paciente tenha falecido; ii) quando for prestar depoimento como testemunha, tendo que declarar o seu impedimento ao Juízo; e, iii) na investigação de suspeita de crime, quando o médico estará impedido de revelar segredo que possa expor o paciente a processo penal.

Assim, para que seja possível a disponibilização das informações com segurança, deve o profissional de saúde se certificar de que existe a autorização expressa do paciente, ou de seus responsáveis legais em caso de menor; ou, quando houver necessidade da notificação compulsória de doenças transmissíveis com a comunicação realizada exclusivamente à autoridade competente.

Decisões recentes sobre responsabilidade pela quebra do sigilo médico

Ademais, ratificando o que aqui se expõe, interessante citar as recentes decisões proferidas pelos tribunais pátrios, onde foi reconhecida a nulidade das provas obtidas em ofensa ao sigilo médico, veja-se:

  • Em recente decisão, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) concedeu habeas corpus (RHC 181.907/MG) para trancar ação penal contra uma mulher acusada de tentativa de aborto diante das provas obtidas mediante quebra de sigilo profissional entre médico e paciente.
  • Há também decisões no Tribunal de Justiça de São Paulo e no Tribunal de Justiça de Santa Catarina no sentido de condenar o profissional de saúde ao pagamento de indenização por dano moral em razão da disponibilização indevida das informações da saúde do paciente.

Nesse cenário, fica clara a necessidade de todos os profissionais de saúde permanecerem vigilantes quanto ao cuidado com as informações obtidas em razão de sua atividade, atentando-se à responsabilidade pela quebra do sigilo médico e as consequências pela da sua inobservância, o que pode acarretar desde a responsabilidade civil ao pagamento de indenizações aos pacientes, como a denúncia aos Conselhos de Classe e ao Ministério Público, e aplicação de penas judiciais e administrativas.

Decisão da 3ª Turma do TST valida cláusula coletiva que estipulava a compensação da gratificação de função de um bancário com horas extras reconhecidas em ação trabalhista

A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho validou a cláusula coletiva que estipulava a compensação da gratificação de função de um bancário com horas extras reconhecidas em ação trabalhista. O colegiado afirmou que a gratificação possui caráter salarial e ajustes sobre essa parcela são admissíveis mediante convenção ou acordo coletivo.

Isso foi possível porque a cláusula 11ª da Convenção Coletiva de Trabalho dos Bancários (2018/2020 e 2020/2022) permitia que, em situações em que horas extras além da sétima e oitavas horas de trabalho fossem reconhecidas judicialmente, a gratificação de função poderia ser utilizada para compensar os valores devidos.

Essa compensação está prevista em Convenção Coletiva, negociada pelos Sindicatos dos Bancários, e a cláusula coletiva que instituiu a gratificação é expressa ao vedar sua cumulação com as horas extras a qualquer título.

A questão da validade da cláusula 11 das Convenções Coletivas dos Bancários vem sendo objeto de muitos debates na Justiça do Trabalho. A referida norma coletiva estabelece que os empregados bancários que recebem a gratificação de função devem ter uma jornada de trabalho de 8 horas diárias, dispondo, ainda, que, havendo decisão judicial que afaste o enquadramento de empregado na exceção prevista no § 2º do art. 224 da CLT, o valor devido relativo às horas extras e reflexos será integralmente deduzido/compensado com o valor da gratificação de função e reflexos pagos ao empregado.

O relator do Recurso de Revista interposto pelo trabalhador, Ministro José Roberto Pimenta, destacou que, conforme a Súmula 109 do TST, a compensação não é admitida, visto que a gratificação de função tem como finalidade remunerar a maior responsabilidade do cargo, e não o trabalho extraordinário realizado após a sexta hora.

Todavia, o Ministro recordou que o Supremo Tribunal Federal ratificou a constitucionalidade de acordos e convenções coletivas que restrinjam ou excluam direitos trabalhistas, desde que sejam respeitados os direitos absolutamente inegociáveis (Tema 1.046 de repercussão geral), validando a disposição normativa. Segundo o relator, o direito em questão não é considerado absolutamente inegociável e a compensação não implica na supressão de um direito garantido constitucionalmente. A decisão foi unânime.

É importante destacar que vários julgados já concluíram pela invalidade da regra, mantendo a aplicação da Súmula 109 do TST, porém, em sentido totalmente divergente, muitas outras decisões estão acolhendo a disposição normativa, com base na decisão do STF.


Por: Pedro Rodrigues

Possibilidade da redução da jornada de trabalho para empregados com filho portador do Transtorno do Espectro Autista (TEA)

Os indivíduos portadores do Transtorno do Espectro Autista (TEA) sofrem de alterações físicas e funcionais no cérebro, com distúrbios no neurodesenvolvimento que ocasionam resultados diretos nas manifestações motora, da linguagem e no comportamento, que podem ser tratados de inúmeras maneiras.

A atuação da família e profissionais como fonoaudiólogo, fisioterapeutas, psicólogos e pedagogos, desempenham fundamental estímulo para o desenvolvimento de habilidades de socialização e integração social, impactando na alteração do prognóstico do paciente, bem como sua constante evolução e melhoria.

De seu lado, o Direito do Trabalho, na qualidade de ciência jurídica, tenta basilar suas decisões com o intuito de que sejam considerados os aspectos relevantes para o aumento de ações de acessibilidade, inclusão e apoio às pessoas com (TEA).

O Regime Jurídico Único dos servidores públicos federais instituído pela Lei n° 8.112/90, prevê horário especial a pessoas com cônjuge, filho ou dependente com deficiência, sendo certo que a Lei Berenice Piana (12.764/12) equiparou a pessoa com TEA à indivíduos com deficiência, para todos os efeitos legais.

A disposição contida no artigo 98, §§ 2º e 3º, do regime jurídico da referida norma, vem sendo aplicada analogicamente para os demais trabalhadores, inclusive os vinculados ao regime celetista, bem como o Supremo Tribunal Federal (STF) fixou tese sobre a ampliação dos efeitos dessa norma aos servidores estaduais e municipais (Recurso Extraordinário 1237867 – Tema 1097), reconhecendo a eles o direito à redução das horas de trabalho sem redução de remuneração, caso tenham filho ou dependente com deficiência.

Relativamente aos trabalhadores que respondem às regras estabelecidas pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), ainda não há entendimentos generalizáveis e vinculantes sobre a referida redução de jornada, nem tampouco norma que regulamente referido. Entretanto, são inúmeras as decisões, tanto no Tribunal Superior do Trabalho (TST), quanto nos Tribunais Regionais do Trabalho (TRT’s), apoiando-se em interpretação sistemática e aplicação analógica para concessão do direito em comento aos celetistas.

Os Ministros da 8ª Turma do TST, nos autos da Reclamação Trabalhista nº 0000533-36.2019.5.09.0965, envolvendo a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) e o pai de criança com diagnóstico de TEA, empregado público celetista, negaram provimento por unanimidade, ao Agravo de Instrumento em Recurso de Revista interposto pela empresa, que recorreu da decisão do TRT da 12ª Região que deferiu ao trabalhador a redução de jornada (50%), sem diminuição salarial para que o autor acompanhe sua filha nas atividades relacionadas com o respectivo tratamento.

A relatora do acórdão, Ministra Delaíde Miranda Arantes, destacou que a constitucionalização do Direito Administrativo possibilita o uso da analogia como integrador de lacunas normativas ao regime jurídico aplicável ao trabalhador, suscitando ainda os valores e princípios constitucionais.

A ministra afirmou que a proteção desse grupo encontra ampla abrangência no arcabouço normativo pátrio, sintetizada no caráter de direito fundamental de que é dotada a respectiva tutela, sobretudo em face da internalização, com status de emenda constitucional (art. 5 º, § 3 º, da CF), da Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência pelo Decreto 6.949/2009 “.

Para o Direito do Trabalho contemporâneo, aqueles regidos pela CLT e responsáveis por pessoas com TEA, devido a inexistência de norma infraconstitucional específica que verse sobre a redução de jornada, no âmbito do Poder Judiciário é preciso fazer uso da interpretação sistemática e analógica como forma imperativa na resolução das lides.

Dito disto, cabe à Justiça do Trabalho conciliar os interesses discordantes entre às empresas e os empregados responsáveis por indivíduos diagnosticados com TEA, encontrando uma medida razoável entre eles, possibilitando que, por exemplo, a criança tenha acompanhamento nas atividades multidisciplinares que contribuem para seu desenvolvimento, sem os cuidadores serem empurrados para fora do mercado de trabalho, ao mesmo tempo que tal circunstância não proporcione ônus não suportável para a empresa. É um desafio concreto do Direito contemporâneo. Na temática sobre a redução da jornada de trabalho para empregados com filho portador do TEA, é preciso o exame da exequibilidade e repercussões econômicas e sociais das decisões pelos magistrados brasileiros, levando em consideração as convenções internacionais ratificadas pelo Brasil,  (como a Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência), a Constituição da República e as leis ordinárias, hierarquicamente, com o intuito de resguardar a garantia dos direitos fundamentais de cada cidadão.


Por: Gabriela Azoubel

O Superior Tribunal de Justiça afasta o Código de Defesa do Consumidor em quebra antecipada de contrato com alienação fiduciária

A quebra antecipada de um contrato de compra e venda de imóvel com garantia de alienação fiduciária não acarreta a aplicação das normas do Código de Defesa do Consumidor. Nesse cenário, as disposições da Lei 9.514/1997 continuam em vigor. Com base nessa interpretação, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça deu provimento ao recurso especial interposto por uma empresa incorporadora de imóveis, a fim de evitar a obrigação de reembolsar parte dos pagamentos efetuados por um comprador que desistiu do contrato.

A desistência, neste caso específico, ocorreu porque o comprador, antecipadamente, percebeu que não teria condições de cumprir com as obrigações financeiras. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (TJRN) decidiu que ele tinha o direito de receber um reembolso parcial referente ao que já havia pagado. O TJRN aplicou a Súmula 543 do STJ ao caso, a qual determina que a rescisão de um contrato de compra e venda de imóvel sujeito ao CDC resulta em reembolso parcial das parcelas ao comprador, com uma retenção de 25% pelo vendedor.

Entretanto, esse contrato envolve uma garantia de alienação fiduciária, na qual a propriedade do imóvel é transferida para a instituição financeira que forneceu o financiamento e só é restituída quando a dívida é totalmente quitada.A incorporadora solicitou, portanto, a aplicação do procedimento previsto na Lei 9.514/1997, que estabelece que, caso a dívida não seja paga integralmente ou em parte, a propriedade do imóvel é consolidada em nome do credor fiduciário. Em seguida, o credor deve realizar um leilão público do bem em até 30 dias, com o intuito de quitar a dívida, incluindo juros convencionais, penalidades, encargos contratuais e custas do leilão. Qualquer valor excedente, se houver, deve ser entregue ao devedor.

A 3ª Turma do STJ já havia estabelecido um precedente em 2020 indicando que, em casos de incapacidade financeira do comprador para cumprir com as parcelas, o procedimento da Lei 9.514/1997 deve ser seguido. Essa posição foi reafirmada pela ministra Nancy Andrighi, relatora do caso atual. Para a ministra Nancy Andrighi, mesmo quando o comprador antecipa a quebra do contrato, a aplicação do Código de Defesa do Consumidor deve ser descartada. Isso ocorre porque, ao declarar sua intenção de não cumprir o contrato, o comprador torna iminente seu futuro inadimplemento, o que é suficiente para aplicar a Lei 9.514/1997.

Essa decisão é significativa, pois em outubro do ano anterior, a 2ª Seção do STJ estabeleceu uma tese afirmando que o CDC não se aplica em casos de rescisão de contratos de compra e venda de imóveis com garantia de alienação fiduciária. O colegiado entendeu que a Lei 9.514/1997 é mais recente e específica em relação ao Código de Defesa do Consumidor, prevalecendo sobre este último.

Todavia, havia uma dúvida se essa tese se aplicaria em casos de rescisão antecipada do contrato, uma vez que essa é uma prática sem regulamentação legal no Brasil, mas amplamente utilizada em processos. A ministra Nancy Andrighi, porém, concluiu que, mesmo em tais circunstâncias, o Código de Defesa do Consumidor não deve ser aplicado. Isso ocorre porque, ao manifestar sua intenção de não cumprir o contrato, o comprador já deixa claro seu futuro inadimplemento, o que é suficiente para justificar a aplicação da Lei 9.514/1997.

Em resumo, a decisão da 3ª Turma do STJ enfatiza a importância da Lei 9.514/1997 em contratos de compra e venda de imóveis com garantia de alienação fiduciária, mesmo quando ocorre a quebra antecipada do contrato pelo comprador. Isso assegura a estabilidade no mercado e protege os interesses das partes envolvidas.

Acórdão na íntegra: REsp 2.042.232.

Notificação por e-mail, em ação de busca e apreensão, não comprova mora do devedor

“Em julgamento do REsp 2022423, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, estabeleceu que, em ação de busca e apreensão regida pelo Decreto-Lei 911/1969, é inadmissível a comprovação da mora do réu mediante o envio da notificação extrajudicial por e-mail. 

Sabe-se que é crescente uso de ferramentas digitais para o exercício da comunicação, inclusive, o judiciário vem adotando medidas para o acesso rápido e econômico, tais como Juízo 100% Digital, o Balcão Virtual, a Plataforma Digital do Poder Judiciário, a Base de Dados Processuais do Poder Judiciário (DataJud) e a implantação do sistema Codex, que consolida bases de dados processuais para prover conteúdo textual de documentos.

Neste ponto  afirmou a relatora, ministra Nancy Andrighi “Se é verdade que, na sociedade contemporânea, tem crescido o uso de ferramentas digitais para a prática de atos de comunicação de variadas naturezas, não é menos verdade que o crescente uso da tecnologia para essa finalidade tem de vir acompanhado de regulamentação que permita garantir, minimamente, que a informação transmitida realmente corresponde àquilo que se afirma estar contido na mensagem e que houve o efetivo recebimento da comunicação”

Seguindo este entendimento que se firmou a tese de que em ação de busca e apreensão regida pelo Decreto-Lei nº 911/1969, seria inadmissível a comprovação da mora do réu mediante o envio da notificação extrajudicial por e-mail, negando provimento ao recurso especial de um banco contra decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS).

Em análise ao caso concreto, cumpre salientar que o Banco Recorrente, arguiu a tese de que a comunicação dirigida ao endereço eletrônico seria válida para constituir em mora o devedor fiduciante, oportunidade na qual tais fatos seriam comprovados ao desenvolver da instrução processual.

A alienação fiduciária é uma modalidade de garantia, comumente utilizada nos empréstimos bancários. Nesta modalidade o devedor dá como garantia propriedade, ao passo que mantém a posse direta do bem, ficando a instituição financeira credora e proprietária até que seja realizado o adimplemento de todas as parcelas do financiamento/empréstimo pelo Devedor.

Em caso de inadimplemento do Devedor, o Decreto-Lei nº 911/1969 faculta ao credor o ajuizamento de ação de busca e apreensão, conforme prevê o artigo 3º da referida lei, para que possa vender o bem a terceiro, e aplicar o valor obtido em seu crédito e nas despesas decorrentes, devolvendo o percentual restante ao Devedor.

Ocorre que, a fim de viabilizar a concessão de liminar na ação de busca e apreensão, seria necessária a comprovação da mora, nos termos do § 2º do art 2.º do Decreto-Lei nº 911/1969.

Anteriormente, exigia-se a comprovação da constituição em mora por carta registrada em cartório ou por meio de protesto do título, entretanto, após a alteração do Decreto-Lei nº 911/1969 pela Lei nº 13.043/2014, passou-se a permitir o envio de “carta registrada com aviso de recebimento, não se exigindo que a assinatura constante do referido aviso seja a do próprio destinatário.”

Neste ponto, embora a alteração da lei possibilitasse a flexibilidade quanto ao meio de comprovação de mora, destaca a ministra Nancy Andrighi que a alteração do decreto “não pode ser interpretada como se a partir de então houvessem múltiplas possibilidades à disposição exclusiva do credor, como, por exemplo, o envio da notificação por correio eletrônico, por aplicativos de mensagens ou redes sociais”

Desta feita, em que pese seja comprovado o recebimento e leitura pelo Devedor, este meio de constituição de mora não seria possível nesta hipótese, uma vez que não seria possível considerar que, com o envio por e-mail, a notificação extrajudicial atingiu a sua finalidade, pois a ciência inequívoca quanto ao recebimento demandaria o exame de vários aspectos, tais como: existência de correio eletrônico do devedor fiduciante, o efetivo uso da ferramenta por parte dele, estabilidade e segurança da ferramenta de e-mail, entre outros. Desse modo, por unanimidade, fora conhecido em parte do recurso especial interposto pelo Banco para negar-lhe provimento, sendo firmada a tese de que “Notificação por e-mail, em ação de busca e apreensão, não comprova mora do devedor”.

Reconhecimento de união poliafetiva

Após tentativa de oficialização da união em cartório, o trisal formado por um homem de 45 anos e duas mulheres, uma de 51 e outra de 32, demandou o reconhecimento da união judicialmente, motivados pela espera do primeiro filho, cujo nascimento está previsto para outubro.

A negativa de registro notarial tem como base decisão proferida na 270ª Sessão Plenária do plenário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em 26/06/2018, por meio do Pedido de Providência nº 0001459-08.2016.2.00.0000, que determinou que os cartórios não podem registrar uniões poliafetivas, ante a ausência de respaldo na legislação nem na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), sendo a atividade cartorária limitada a previsão expressa.

A escritura pública declaratória é o instrumento pelo qual o tabelião dá contorno jurídico à manifestação da vontade do declarante, cujo conteúdo deve ser lícito, uma vez que situações contrárias à lei não podem ser objeto desse ato notarial.

Em razão da decisão judicial, o cartório terá que aceitar o registro e, para tanto, o homem e a mulher que já estavam casados precisaram se divorciar para fazer o pedido. Para além do reconhecimento da união, será assegurado ao nascituro o assentamento multiparental no registro civil.

Para Marcos Alves da Silva, vice-presidente da Comissão de Estudos Constitucionais da Família do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, a sentença que reconheceu a união estável do trisal mostra que “as famílias brasileiras, em suas múltiplas configurações concretas, não podem ser invisibilizadas pelo Direito”, ainda que a orientação atual do Conselho Nacional de Justiça – CNJ seja no sentido de não oficializar uniões poliafetivas.

Em que pese o sistema o nosso sistema jurídico esteja organizado com base na monogamia, é necessário que estas regras sejam adaptadas para adequação aos costumes adquiridos em razão dos novos comportamentos sociais. Mesmo porque, a ética e os princípios constitucionais asseguram o respeito a liberdade dos sujeitos de estabelecerem suas famílias como desejem, e, desde que não atinjam direitos de terceiros, não há razão para obstar o seu reconhecimento jurídico.

A Constituição Federal, em seu artigo. 226, assegura a proteção do Estado a família, independente da sua forma. Portanto, ao passo que existir sociedade enquanto entidade mutante, essas e outras formas de viver a conjugalidade sempre surgirão. A decisão da Comarca de Novo Hamburgo é de 1º grau e cabe recurso por parte do Ministério Público, entretanto, não é possível olvidar a existência da união estável poliafetiva pela perspectiva social e, por consequente, a necessidade de criação de instrumentos jurídicos para proteção de direitos.

Reflexão sobre o marco legal do transporte público coletivo urbano

O transporte público de passageiros enfrenta um momento de grande expectativa em relação à possibilidade de aprovação, ainda neste ano, do marco legal da categoria, pleito defendido por muitos como a salvação do setor.

No entanto, oportuno discorrer sobre a real necessidade de mais uma norma para repercutir o assunto. E a dúvida ocorre justamente em razão da vasta quantidade de leis, decretos, artigos, incisos e parágrafos que se relacionam à temática. Nesta toada, é prudente refletir se o texto apenas somará ao que já existe no ordenamento brasileiro, sem acrescentar conteúdo capaz de dar um salto de qualidade ao serviço. Me parece mais uma tentativa de trunfo político num compilado de previsões já existentes, que na prática não amenizará a preocupação que paira.

Dentre algumas normas aplicadas ao setor, estão desde a Constituição Federal, passando pela Lei Geral de Licitações, alterada recentemente, Lei das Concessões, Parcerias Público Privadas, Política Nacional da Mobilidade Urbana, Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, o Estatuto da Cidade, até normativos estaduais e municipais que, dentro de cada competência constitucional, atuam sobre o tema.

Antes de justificar a desnecessidade de formalização de mais uma norma que trate dos grandes problemas que possuem identidade com a pauta, importante destacar que o tema do marco legal vem sendo discutido através de duas iniciativas. Uma delas é o PL 3278/2021, de autoria do então senador Antonio Anastasia (PSD-MG), atualmente ministro do TCU, que restou arquivada ao final da legislatura passada, mas que voltou a tramitar em razão de um pedido do senador Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB).

Em paralelo, no ano passado, técnicos da Secretaria Nacional de Mobilidade Urbana (Semob), vinculada ao Ministério das Cidades, elaboraram uma minuta de texto submetida à consulta pública, que recebeu cerca de 900 sugestões de aprimoramento. Após a consolidação, o documento ficou pronto para ser encaminhado para realização de audiência pública, estágio atual que se encontra. Após esta etapa, a versão final será encaminhada à Casa Civil da Presidência da República.

A expectativa é que os textos propostos pelo Legislativo (PL 3278) e Executivo (Semob) sejam unificados e que contenham um conjunto de normas que regule a prestação dos serviços públicos de transportes urbanos de passageiros.

No entanto, em linha com o questionamento acima, salvo melhor juízo, o arcabouço normativo sobre a temática é mais que suficiente para contribuir com o setor, devendo as condutas específicas serem tratadas em cada caso concreto nos editais e contratos públicos. O temor no alto investimento por parte do empresário não ocorre em razão da ausência de normas legais, mas sim por conta da incerteza quanto ao cumprimento delas. Na verdade, o receio ameaça não apenas o setor, mas o desenvolvimento econômico do nosso país.

É de se destacar, portanto, que dentre os principais assuntos que se destacam, estão segurança jurídica, equilíbrio econômico-financeiro, alocação de riscos e remuneração adequada. Todos esses grandes temas já estão previstos em diversas normas, consoante passamos a demonstrar a seguir.

Com relação às normas que trazem expressões que se aplicam ao setor, podemos iniciar pela Carta Magna, que prevê que o transporte é um direito social e dos trabalhadores, colocando-o na mesma importância da saúde, educação, alimentação, moradia.

Destaca ainda o caráter essencial do transporte público e a competência dos municípios para organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão esse serviço, sempre através de licitação, conferindo, portanto, previsibilidade, formalidade e regramentos claros e objetivos na relação jurídica.

No tocante à necessidade de financiamento de programas de infraestrutura em transporte, o assunto restou definido na lei que instituiu a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) relativa às atividades de importação ou comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados e álcool combustível.

Outra norma de bastante interesse é o Estatuto das Cidades, que enfrenta problemas que ultrapassam questões atinentes ao transporte coletivo de passageiros, passando pela abordagem de uma política objetiva acerca do pleno desenvolvimento das funções sociais locais e da propriedade urbana, bem como serviços públicos adequados aos interesses e necessidades da população e às características locais.

Podemos citar também passagens da Lei Geral de Licitações, das Concessões e das Parcerias Público Privadas, que em seus respectivos textos trazem diretrizes que conferem segurança jurídica nas operações de serviço do transporte público de passageiros.

A lei de licitações atual aponta que as contratações públicas devem submeter-se a práticas contínuas e permanentes de gestão de riscos e de controle preventivo, inclusive mediante adoção de recursos de tecnologia da informação, e, além de estarem subordinadas ao controle social, levando em consideração os custos e os benefícios decorrentes de sua implementação, com segurança jurídica para todos os envolvidos e com resultado mais vantajoso para a administração.

A mesma lei trata da preocupação de muitos operadores, qual seja, a necessidade de previsão no edital de uma matriz que aloque os riscos entre o contratante e o contratado, hipótese em que o cálculo do valor estimado da contratação poderá considerar uma taxa compatível com o objeto da licitação e com os riscos atribuídos ao contratado, de acordo com metodologia predefinida pelo ente federativo.

Já a lei das concessões é cristalina ao assegurar que os contratos firmados com a Administração devem conferir segurança, equilíbrio econômico-financeiro e previsibilidade aos partícipes da prestação dos serviços.

No mesmo sentido, a Lei das PPP’s trouxe mais elementos que reforçam os mesmos pontos centrais necessários a conferir segurança jurídica nas relações com o Poder Público, ao apontar cláusulas necessárias que devem constar as formas de remuneração, critérios objetivos de avaliação de desempenho do parceiro privado.

Vale citar ainda a Lei 12.587/2012, que instituiu a Política Nacional da Mobilidade Urbana e trata acerca do regime econômico e financeiro da concessão e da permissão do serviço de transporte público coletivo, com definição para o edital prever a desvinculação da tarifa pública daquela que deve remunerar o operador, de forma a assegurar a cobertura dos reais custos do serviço prestado ao usuário.

Como visto nos exemplos citados, os textos legais apontam diversos temas bastante relevantes ao setor. Poderíamos trazer outras previsões normativas interessantes sobre o tema, mas o que importa, afinal, é deixar a mensagem de dúvida acerca da necessidade de um Marco Legal, quando já temos diversas leis que conferem os regramentos necessários. O ponto em questão reforça que o problema não está na ausência de previsão legal sobre os temas relevantes e atinentes ao setor, mas sim na aplicação da lei no caso concreto, gerando a conhecida expressão da insegurança jurídica no Brasil.

Por fim, não se pode deixar de lado a importância que os instrumentos convocatórios reflitam a realidade de cada sistema, com a indicação das matrizes de risco de parte a parte e regras que possam ser adaptadas durante o período dos contratos de longo prazo, abolindo as previsões estáticas que dificultam as tomadas de decisões. Sobre esse ponto, podemos citar a necessidade de alguns sistemas em substituir a frota a diesel por novos equipamentos com energia mais limpa.

A dificuldade dos gestores esbarra nas previsões dos contratos em curso, que definem a exigência da característica dos veículos durante o curso do contrato administrativo, normalmente de longo prazo. Alguns definem padrão específico e esta previsão aflige o poder público para, por exemplo, autorizar a substituição dos carros por uma matriz elétrica, que possuem características diferentes e outros custos atrelados. Outro dificultador é a incapacidade de a tarifa pública cobrir o aumento do custo e a ausência de previsão nos editais de pagamento do operador por fontes alternativas de recursos.

Em tempos de ESG e de grande avanço da inteligência artificial, cujos temas se atualizam mais rapidamente que a norma jurídica, os editais devem prever situações que se amoldem à realidade de cada tempo, tudo isso para buscar o interesse das partes. Previsões que prestigiem o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos, com divisão justa dos riscos, farão com que haja maior interesse em realizar investimentos por parte dos empresários e os gestores possam com tranquilidade, tomar decisões sem ter o receio de colocar em risco o seu CPF quando da análise das contas pelos órgãos reguladores ou mesmo por qualquer decisão judicial equivocada.

Como visto, a insegurança jurídica gera impactos negativos nas tomadas de decisões por parte dos gestores e dos transportadores e o saldo desta equação gera impacto direto na qualidade da prestação do serviço para a população usuária, constitucionalmente detentora do direito social ao transporte.

Por: Ricardo Dalle no site do JOTA

STJ reconhece impenhorabilidade de bem de família mesmo em nome de pessoa jurídica

Em recente decisão, através do REsp 1.514.567, a 4ª Turma o Superior Tribunal de Justiça (STJ) trouxe o entendimento de que, mesmo que o imóvel esteja registrado em nome de pessoa jurídica, caso utilizado como residência pelos seus sócios, poderá ser protegido pela impenhorabilidade de que trata a Lei nº 8.009/1990.

Referida decisão reconhece a importância dos modelos de empresas patrimoniais, enfatizando a necessidade de proteção de direitos dos seus sócios, abrangendo a impenhorabilidade do imóvel em nome de empresa, que utilizado como moradia, como também garante a continuidade dos negócios familiares, preservando o patrimônio pessoal dos seus sócios, resguardando direitos fundamentais de dignidade e moradia. Confira-se excerto do julgado:

“A impenhorabilidade da Lei nº 8.009/1990, ainda que tenha como destinatários as pessoas físicas, merece ser aplicada a certas pessoas jurídicas, às firmas individuais, às pequenas empresas com conotação familiar, por exemplo, por haver identidade de patrimônios. (…) Penso, portanto, ser conveniente exame acurado da questão para definir (…) de forma inversa à finalidade original do instituto, para proteger o sócio da empresa proprietária do imóvel penhorado, subtraindo da execução o bem que asseguraria a satisfação de créditos de responsabilidade da própria sociedade. (…) Entendo que, havendo desconsideração da personalidade em proveito de sócio morador de imóvel de titularidade da sociedade, haverá, na prática, desfalque do patrimônio social garantidor do cumprimento das obrigações da pessoa jurídica e, portanto, sendo a desconsideração via de mão dupla, poderão, ao meu sentir, ser executados bens pessoais dos sócios até o limite do valor de mercado do bem subtraído da execução”.

Para tanto, deve ser comprovado que o imóvel realmente é utilizado como residência familiar de sócios, como também haver a indicação de boa-fé do sócio morador, o qual não deve ter adotado essa residência após a instauração do processo, no intuito de impedir que este venha a sofrer com a penhora. Ressalte-se que, conforme julgado, em troca, o patrimônio pessoal dos sócios poderá ser alcançado para saldar a dívida, caso necessário.

Perceptível, portanto, que a jurisprudência, ao adotar dada interpretação, ressalta a importância da proteção dos direitos dos sócios que optam por modelos de empresas patrimoniais, promovendo, sobretudo, a segurança jurídica e contribuindo para o fortalecimento do ambiente empresarial no Brasil.


Escrito por: Ana Carolina Barbosa e Eduarda Câmara

STF determina a suspensão de processos em que houve inclusão de empresa integrante de Grupo Econômico na fase de execução

No último dia 25 de novembro de 2023, o Supremo Tribunal Federal determinou a suspensão de todos os processos trabalhistas que se encontram na fase de execução e que tenham como discussão a inclusão de empresa integrante de Grupo Econômico apenas na fase de execução.

A decisão foi prolatada pelo Min. Dias Toffoli, no Recurso Extraordinário n

º 1.387.795, em que foi reconhecida a repercussão geral do tema relacionado a “inclusão de empresa integrante de grupo econômico em execução trabalhista, sem que ela tenha participado do processo de conhecimento”.

O Tema 1.232, objeto da análise pelo Supremo Tribunal Federal, possui a seguinte descrição: “Recurso extraordinário em que se discute, à luz dos artigos 5º, II, LIV e LV, 97 e 170 da Constituição Federal, acerca da possibilidade da inclusão, no polo passivo de execução trabalhista, de pessoa jurídica reconhecida como do grupo econômico, sem ter participado da fase de conhecimento, em alegado afastamento do artigo 513, § 5º, do CPC, em violação à Súmula Vinculante 10, e, ainda, independente de instauração de incidente de desconsideração da personalidade jurídica (artigos 133 a 137 e 795, § 4º, do CPC)”.

Neste ponto, apesar de o tema ser objeto de discussão na Justiça do Trabalho há mais de duas décadas, ainda sem um posicionamento uniforme no âmbito da Justiça Especializada, há notória insegurança jurídica quanto ao tema.

Tal discussão surgiu após o cancelamento da Súmula 205 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), ocorrido em novembro de 2003, que tinha a seguinte redação:

“GRUPO ECONÔMICO. EXECUÇÃO. SOLIDARIEDADE.

O responsável solidário, integrante do grupo econômico, que não participou da relação processual como reclamado e que, portanto, não consta no título executivo judicial como devedor, não pode ser sujeito passivo na execução.

Observação: (cancelada) – Res. 121/2003, DJ 20, 22 e 25.04.2005”

Importante destacar que, com o advento do Novo Código de Processo Civil, sobreveio uma alteração legislativa importante sobre o tema, no artigo 513, §5º[1]. Tal dispositivo traz à tona a orientação que estava estampada na Súmula 205 do TST, já revogada. No entanto, na Justiça do Trabalho, inexiste, atualmente, um posicionamento firmado a respeito da aplicabilidade de tal dispositivo no âmbito do processo do trabalho, em razão de decisões divergentes quanto ao tema.

O Supremo Tribunal Federal, em decisão prolatada pelo Min. Gilmar Mendes, ao apreciar o tema no ARE 1.160.361, cassou a decisão prolatada pelo TST e determinou que outra fosse proferida, observando a cláusula de reserva de plenário e a Súmula Vinculante nº 10, uma vez que a decisão desconsiderou o artigo 513, §5º do CPC.

Importante destacar que, no âmbito do Supremo Tribunal Federal, estão em trâmite as ADPF 488 (que possui como objeto a inclusão “no cumprimento de sentença ou na fase de execução, pessoas físicas e jurídicas que não participaram da fase de conhecimento dos processos trabalhistas e que não constaram dos títulos executivos judiciais, sob alegação de que fariam parte de um mesmo grupo econômico”) e 951 (cuja discussão envolve a “responsabilidade solidária às empresas sucedidas, diante de simples inadimplemento de suas sucessoras ou de indícios unilaterais de formação de grupo econômico, a despeito da ausência de efetiva comprovação de fraude na sucessão e independentemente de sua prévia participação no processo de conhecimento ou em incidente de desconsideração da personalidade jurídica”).

Considerando toda a celeuma envolvendo o assunto em referência, o Min. Dias Toffoli determinou a “suspensão nacional do processamento de todas as execuções trabalhistas que versem sobre a questão controvertida no Tema nº 1.232 da Gestão por Temas da Repercussão Geral, até o julgamento definitivo deste recurso extraordinário”.

Alguns juízes, inclusive, estão mencionando a possibilidade de ultrapassar a suspensão determinada pelo STF, sob a alegação de o óbice estaria superado em caso de instauração de Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica (IDPJ) na fase de execução, oportunidade em que seria possível a realização do contraditório e produção de provas sobre o alegado Grupo Econômico.

No entanto, a produção de provas no âmbito do IDPJ não é tão ampla quanto na fase cognitiva, bem como, a limitação recursal para a interposição de recurso para o TST é gigantesca, considerando que o Recurso de Revista, na fase de execução, só é permitida por afronta direta e literal à Constituição Federal[2].

Neste sentido, ainda que instaurado o IDPJ, eventuais processos que se enquadrem na situação estampada na decisão devem ser suspensos. Por outro lado, a decisão não impede que o processo prossiga em desfavor dos devedores das reclamações trabalhistas que participaram da ação desde o seu nascedouro.

De toda sorte, apesar de tal decisão ser de observância obrigatória por todos os Juízes e Tribunais, é importante que as empresas demonstrem que se encontram na situação indicada na decisão, pugnando pela suspensão do processo e da realização de atos expropriatórios porventura em curso.


[1] Art. 513. O cumprimento da sentença será feito segundo as regras deste Título, observando-se, no que couber e conforme a natureza da obrigação, o disposto no Livro II da Parte Especial deste Código.

§ 5º O cumprimento da sentença não poderá ser promovido em face do fiador, do coobrigado ou do corresponsável que não tiver participado da fase de conhecimento.

[2] Art. 896 – Cabe Recurso de Revista para Turma do Tribunal Superior do Trabalho das decisões proferidas em grau de recurso ordinário, em dissídio individual, pelos Tribunais Regionais do Trabalho, quando:

§ 2o Das decisões proferidas pelos Tribunais Regionais do Trabalho ou por suas Turmas, em execução de sentença, inclusive em processo incidente de embargos de terceiro, não caberá Recurso de Revista, salvo na hipótese de ofensa direta e literal de norma da Constituição Federal

O empregador pode substituir o vale transporte por vale combustível?

O vale transporte é um direito do empregado e encontra previsão na Lei 7.418/1985, devendo ser utilizado, exclusivamente, pelo empregado que utiliza transporte público para ir e voltar do trabalho, independentemente da distância e de quantos transportes necessite para fazer o percurso de ida e volta.

O artigo 458, § 2º, da CLT, prevê que não será considerado salário a utilidade fornecida pelo empregador a título de transporte destinado ao deslocamento para o trabalho e retorno, em percurso servido ou não por transporte público. Ou seja, o benefício apresenta natureza indenizatória e não integra o salário para quaisquer efeitos.

Contudo, o empregador pode, mediante acordo individual, acordo ou convenção coletiva de trabalho, conferir a possibilidade de substituir o benefício do vale transporte por vale combustível, aos seus empregados que usam o seu próprio veículo para o deslocamento residência-trabalho-residência. A opção da substituição deve ser conferida a todos os empregados integrantes do quadro de pessoal da empresa, considerando o princípio da isonomia, que diz que os trabalhadores devem ser tratados de igual maneira.

Nesses casos, o valor pago a título de vale combustível deverá ser exatamente o mesmo a que o empregado teria direito se optasse pelo vale transporte, nos termos do artigo 1º da Lei 7.418/1985. Significa dizer que, considerando o número de vale transporte que o empregado teria direito para deslocamento residência-trabalho e vice-versa, o valor do benefício concedido em forma de vale combustível deve guardar a mesma proporcionalidade.

Além disso, o empregador deverá proceder com o desconto de 6% (seis por cento) sobre o salário do empregado, discriminando o desconto em folha de pagamento como vale combustível. Se observado tal desconto, o valor pago como vale combustível não será considerado salário e, portanto, não será considerado para base de cálculo de qualquer direito trabalhista ou previdenciário.  

Caso o empregador deixe de descontar o percentual acima indicado do salário do empregado, ou desconte percentual inferior, a diferença deverá ser considerada como salário indireto e sobre ela incidirá contribuição previdenciária e demais tributos. Desse modo, temos que o vale transporte é um direito e deve ser subsidiado pelo empregador, todavia, pode ser renunciado pelo empregado, desde que por escrito. O vale combustível pode substituir o vale transporte desde que haja um acordo entre empregado e empregador nesse sentido. Contudo, devem ser observados os seguintes requisitos para que essa substituição não seja considerada salário: (i) possibilidade de substituição mediante acordo individual ou negociação coletiva; (ii) desconto de 6% (seis por cento) sobre o salário base do empregado; e (iii) previsão do desconto em folha de pagamento como vale combustível.