Da responsabilidade do banco por vazamentos de dados que resultaram na aplicação do “golpe do boleto”

No julgamento do REsp 2.077.278, ocorrido em 09/10/2023, a 3ª turma do STJ entendeu que as instituições bancárias respondem pelo vazamento de dados pessoais sigilosos do consumidor, relativos a operações e serviços bancários, obtidos por criminosos para a prática de fraudes como o “golpe do boleto”.

Sabe-se do crescente número de estelionatos ocorridos na era digital, bem como da existência de golpistas que se passam por funcionários de um banco e emitem boleto falso para receberem indevidamente o pagamento feito pelo cliente.   

No caso concreto, trata-se de ação de declaratória de inexigibilidade de débito por vazamento de dados bancários cumulada com indenização por danos morais e repetição de indébito, através da qual a Autora informou que havia solicitado informações acerca da quitação do financiamento via e-mail, tendo sido contatada via WhatsApp para quitação da dívida, oportunidade em que realizou o pagamento do boleto falso, no valor que girou em torno de R$ 20.000,00 (vinte mil reais).

A sentença de primeiro grau condenou o banco a considerar a dívida quitada mediante o pagamento do boleto falso e a devolver o valor que foi pago a partir de então, com correção e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês.

No julgamento de segundo grau, entendeu o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP),  que o golpe contra a cliente foi aplicado por meio de negociações realizadas de maneira informal, afastando a responsabilidade do banco com base no fundamento de que os dados do boleto falso divergiam dos dados constantes do contrato de financiamento, imputando a responsabilidade à consumidora que “falhou em seu dever de segurança e cautela”.

A consumidora, então, apresentou recurso especial, tendo o STJ decidido por reformar o acórdão do TJSP, restabelecendo a sentença que condenou o banco a declarar válido o pagamento realizado por meio de boleto fraudado e devolver à cliente parcelas pagas indevidamente em contrato de financiamento.

Nos fundamentos do Recurso Especial, a ministra Nancy Andrighi entendeu que, no caso concreto, houve  defeito na prestação do serviço (art. 14 do CDC e art. 44 da LGPD), vez que os criminosos teriam conhecimento de informações e dados sigilosos a respeito das atividades bancárias da consumidora.

Isto é, os estelionatários sabiam que a consumidora era cliente da instituição e havia encaminhado e-mail a fim da quitação da dúvida, além destes terem conhecimento dos dados relativos ao próprio financiamento (quantidade de parcelas em aberto e saldo devedor).

Segundo a Ministra, não poderia ser imputado ao banco a responsabilidade exclusiva no caso de vazamento de dados cadastrais básicos, como nome e CPF, vez que de fácil acesso. Por outro lado, pontuou que, caso os dados do consumidor sejam vinculados a operações e serviços bancários, a instituição tem o dever de armazenamento e proteção, sob pena de eventual vazamento configurar falha na prestação do serviço.

Assim, seguiu-se o entendimento de que há, portanto, a necessidade de analisar o nexo de causalidade. Isso porque resta imprescindível averiguar a situação fática para analisar quais dados foram vazados, a fim de examinar a origem de eventual vazamento e, por consequente, a responsabilidade das pessoas envolvidas.

Do contrário, pontuou a Ministra Relatora que “inexistindo elementos objetivos que comprovem esse nexo causal, não há que se falar em responsabilidade das instituições financeiras pelo vazamento de dados utilizados por estelionatários para a aplicação de golpes de engenharia social (REsp 2.015.732/SP, julgado em 20/6/2023, DJe de 26/6/2023)”. Por todo o exposto e, de acordo com a recente decisão já transitada em julgado, o STJ firmou o entendimento de que o banco responde pelo vazamento de dados pessoais sigilosos do consumidor, relativos a operações e serviços bancários, obtidos por criminosos para a prática de fraudes como o “golpe do boleto”.

3 anos de LGPD – Primeiros passos na proteção de dados no Brasil

A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) completou seu 3º aniversário de vigência no último dia 18. Aderindo ao contexto global, que já caminha no sentido da estabilização do ambiente protetor de dados pessoais, o Brasil ainda engatinha nesse terreno. Não há dúvidas, porém, quanto aos pequenos passos que vêm sendo dados no sentido de viabilizar um ambiente favorável e propulsor da proteção de dados pessoais no Brasil.

Em comemoração ao marco dos 5 anos de existência e 3 anos de vigência da LGPD, destacam-se alguns eventos de relevo substancial, os quais serão pontuados neste breve texto.

Importante contextualizar que, inicialmente, o caminho até a implementação foi precedido pelo entendimento da importância da privacidade na era tecnológica. Praticamente todos os brasileiros estão diariamente conectados com a internet e, consequentemente, com plataformas que tratam seus dados pessoais com frequência.

Vêm crescendo, no Brasil, as notificações de vazamentos de dados por parte de empresas, repartições e entidades em geral. Isso ocorre porque a LGPD determina que o portador de dados de terceiros faça um Comunicado de Incidentes de Segurança (CIS) à Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), e ao titular das informações, sempre que houver vazamento capaz de acarretar risco ou danos relevantes ao cidadão. Entre 2021 e 2022, por exemplo, o crescimento nas notificações foi de 54,3%.

A ANPD, já mencionada, é a Autarquia vinculada ao Ministério da Justiça e Segurança Pública responsável por zelar pela proteção de dados pessoais e regulamentar, implementar e fiscalizar o cumprimento da LGPD no Brasil. Cumpre salientar que a agência ainda está se estruturando e formando seus quadros, tendo promovido seu primeiro concurso em janeiro deste ano. Muitos processos, portanto, ainda estão na fase administrativa, a maioria ligados a instituições da administração pública e empresas dos setores de saúde, educação, financeiro e tecnologia da informação.

Nesse sentido, as sanções só foram regulamentadas no último mês de fevereiro do ano em curso pela ANPD, com a publicação do Regulamento de Dosimetria e Aplicação de Sanções Administrativas, estabelecendo parâmetros e critérios para aplicação de penalidades, levando em consideração a gravidade e a natureza da infração, os danos causados aos titulares dos dados, a vantagem auferida/pretendida, a reincidência e, também, o porte econômico do infrator, visando garantir a proporcionalidade da penalidade de acordo com o caso concreto e suas particularidades.

A primeira multa foi aplicada apenas em julho de 2023, à uma microempresa de telecomunicações de Vila Velha/ES. Após uma advertência, aplicou-se a multa total de R$ 14,4 mil, em decorrência da falta de indicação do encarregado pelo tratamento de dados pessoais. Apesar do valor baixo, a sanção carrega consigo o simbolismo de transmitir a mensagem de que a proteção de dados pessoais é uma prioridade e deve ser tratada com cuidado e responsabilidade.

Para além das iniciativas encampadas pela ANPD, uma série de acontecimentos se destacam, no que pertine evidenciar a evolução do ambiente de proteção de dados. Um dos principais foi a inclusão, por meio da Emenda Constitucional 115, em março de 2022, da proteção de dados pessoais no rol de direitos fundamentais do cidadão, atribuindo à União a competência de legislar, organizar e fiscalizar a proteção e o tratamento desses dados.

O direito fundamental à proteção de dados assume particular relevância diante da existência de uma série de lacunas regulatórias, posto que a LGPD não contempla os setores da segurança nacional, segurança pública, investigação criminal e execução penal, dentre os mais relevantes. Por tal motivo, finda-se uma “zona livre” de proteção dos dados pessoais no ordenamento jurídico nacional. Acrescente-se que, a teor do artigo 5º, §§ 2º e 3º, CF, o marco normativo que concretiza e formata o âmbito de proteção e as funções e dimensões do direito à proteção de dados é também integrado pelos tratados internacionais de direitos humanos ratificados pelo Brasil.

Outro marco importante ocorreu em novembro do ano de 2021, quando a Comissão de Fiscalização Financeira e Controle realizou audiência pública sobre o tema, e o deputado Elias Vaz (PSB-GO), que pediu o debate, afirmou que cidadãos e parlamentares têm requisitado informações do governo com base na Lei de Acesso à Informação (LAI) e estão tendo negativas, em função da LGPD. As autoridades ouvidas garantiram que não há conflitos entre as leis e afirmaram que o acesso a informações de órgãos públicos e de agentes públicos não pode ser prejudicado por interpretações equivocadas da LGPD. Na ocasião, a então diretora da Autoridade Nacional de Proteção de Dados, Miriam Wimmer, ressaltou que a transparência era a regra, e o sigilo, a exceção.

No último mês de março, representantes de 60 municípios estiveram em Porto Alegre/RS para o 2° Fórum de Proteção de Dados Pessoais dos Municípios. Em pauta, uma discussão sobre a aplicação da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), realizado em parceria com prefeitura da capital gaúcha e a Frente Nacional de Prefeitos (FNP), reunindo mais de 200 participantes e demonstrando, na prática, o dever do Poder Público como um dos agentes implementadores do aculturamento tão desejado.

Já no âmbito judicial, mais recentemente, duas ações coletivas diferentes protocoladas pelo Instituto Defesa Coletiva levaram à uma decisão da Justiça mineira que determinou o pagamento de danos morais coletivos no valor de R$ 20 milhões, pelo Facebook, em decorrência de vazamentos de dados ocorridos em 2018 e 2019, quando hackers conseguiram burlar a segurança do Facebook e acessar dados de milhões de pessoas.

Há previsão, ainda, de que R$5 mil devem ser desembolsados para indenizar individualmente cada usuário afetado que entrar com ação contra a empresa. Trata-se de importante decisão judicial com base na LGPD, o que abre margem para mais demandas do tipo e a potencialização da conscientização quanto aos cuidados a serem tomados pelos tratadores de dados.

Por fim, importante pontuar que, neste ano, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) lançou o Guia de Boas Práticas de Proteção de Dados para a Indústria, bem como que a ANPD divulgou, em agosto, seu Relatório de Acompanhamento Semestral da Agenda Regulatória 2023-2024, constatando avanços da participação social no processo de regulamentação e elaboração de guias orientativos, como a consulta e audiência pública, por meio das quais a Autoridade recebeu 4.256 contribuições da sociedade.

Pois bem.

Entende-se que o processo agora é de amadurecimento. Era sabido que, nos primeiros anos, a insegurança do mercado e o desconhecimento por parte da sociedade civil ainda perdurariam. Aos poucos, certamente, a população e as empresas têm se conscientizado a respeito de seus direitos e da necessidade de proteção dos dados pessoais, e um indício desse esclarecimento é a alta de mais de 500% no número de ações judiciais que discutem a aplicação da LGPD, conforme levantamento realizado pelo escritório Mattos Filho. A maioria das demandas ao longo dos anos foi ajuizada por titulares de dados, representando mais de 90% no universo analisado.

Ademais, segundo a Associação Brasileira das Empresas de Software (Abes), em relatório publicado, 86% das grandes empresas brasileiras alegam manter monitoramento e tratamento da privacidade de dados perante à LGPD mas, entre elas, a restrição orçamentária e o balanceamento das prioridades de oportunidades, apontados por, respectivamente, 72% e 50% das empresas, o que, evidentemente, resulta na limitação dos investimentos de segurança e TI.

Conclui-se, diante dos pontos aduzidos, que a regulação, por meio da ANPD, vai mais no sentido da orientação e prevenção do que propriamente de repressão por multas, deixando claro que penalizar não é uma prioridade agora. A organização social e o aculturamento da proteção de dados no Brasil é, indiscutivelmente, a pauta principal. O caminho é longo e, como demonstrado, a proteção de dados ainda não atingiu o status prioritário em todos os setores econômicos, porém, os marcos aqui destacados dão bons sinais de que a perspectiva adiante é positiva, tornando a segurança da informação ainda mais importante para a adequação ao mercado atual.

Por: André Garcia Filho

STJ fixa prazo para emissora guardar registros televisivos em arquivo

No julgamento do REsp 1.602.692, ocorrido em 03/10/2023, a 3ª turma do STJ fixou que emissora de televisão deve guardar registros televisivos em arquivo, com vistas a fomentar eventual ação de responsabilidade civil, até prescrição ou decadência do direito correspondente aos atos nele consignados.

O colegiado ressaltou, ainda, que nos casos que a lei não tenha fixado um prazo específico deve incidir, por analogia, a disposição contida no art. 1.194, do CC.

No caso concreto, o Superior Tribunal de Justiça guiando-se pelo entendimento supracitado, negou seguimento ao recurso especial da emissora, mantendo incólume as decisões proferidas em instâncias inferiores, que determinaram a entrega de mídia referente  a reportagem exibida em novembro de 2010.

Em seus argumentos meritórios, a emissora alegou que, no momento da solicitação da entrega, o arquivo que continha a reportagem havia sido destruído e que inexistira obrigação legal  de apresentar o arquivo requerido, nos termos do artigo 71, parágrafo 3º do Código Brasileiro de Telecomunicações (Lei 4.117/1962), que prevê que o material deve ser guardado por apenas 20 dias.

No entanto, em que pese os argumentos trazidos em sede recursal, o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva observou que essa regra teria a finalidade única de assegurar a aplicação das penalidades cabíveis às emissoras nos âmbitos administrativo e criminal, não tendo nenhuma relação com eventual transgressão ao direito de terceiros.

Neste sentido, em razão da inexistência de norma acerca do prazo para manutenção e guarda dos materiais, entende o Superior Tribunal de Justiça que se deve, por analogia, aplicar o 1.194 do Código Civil, segundo o qual o empresário e a sociedade empresária são obrigados a conservar em boa guarda toda a escrituração, correspondência e mais papéis concernentes à sua atividade, enquanto não ocorrer prescrição ou decadência no tocante aos atos neles consignados.

Assim, de acordo com a recente decisão, ainda transitada em julgado, devem os canais brasileiros de televisão manter em arquivo todo seu conteúdo exibido pelo prazo mínimo de três anos, considerando ser este o prazo prescricional indicado pelo Código Civil no que tange à reparação por responsabilidade civil (Art. 206, § 3º, V), sendo recomendável, acaso a decisão se torne definitiva, e conforme o caso, uma revisão dos procedimentos internos das emissoras para manutenção das mídias em seus arquivos pelo prazo mínimo de três anos.

O julgamento pode ser assistido através do link: https://www.youtube.com/watch?v=7CcMHduR_P4 , no minuto 52:00 ao 54:38min.

União e estados-membro são obrigados a fornecer medicamento à base de Canabidiol (CDB) para o tratamento de pessoas com TEA e Epilepsia

Em recente decisão proferida no julgamento do Recurso Especial nº 2006118, a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que União e Estados-membros devem fornecer medicamento à base de canabidiol (CDB) para o tratamento de pessoas com transtorno do espectro autista (TEA) e epilepsia.

Trata de uma Ação Civil Pública promovida pelo Ministério Público Federal contra União e o Estado de Pernambuco, pleiteando o fornecimento de medicamento à base de canabidiol, necessário ao tratamento da síndrome de West, síndrome de Beckwith-Wiedmann e Transtorno do Espectro Autista.

O pedido do MPF fundamenta-se no cenário em que o paciente já esgotou todos os tratamentos disponíveis no território nacional, todos sendo ineficazes para o caso clínico. Portanto, o medicamento pretendido, ou seja, o CDB ainda que não tenha registo na ANVISA e não esteja contemplado na lista daqueles que são fornecidos pelo SUS, foi prescrito pelo neuropediatra da criança como um tratamento alternativo a fim de garantir uma melhora na qualidade de vida da paciente.  

A ação foi inicialmente julgada procedente, tendo a decisão sido mantida em sede de segundo grau pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região.

Entretanto, a União e o Estado de Pernambuco interpuseram recurso especial alegando, dentre outros fatores, a impossibilidade de fornecimento do medicamento visto que este não possui registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), bem como, não integra o protocolo dos medicamentos ofertados pelo SUS, além de atuar como um tratamento experimental.

Em decisão, a Segunda Turma negou provimento ao recurso especial da União e do Estado de Pernambuco que buscava reverter a decisão que condenou ambos os réus em sede de primeiro grau, e posteriormente, em grau recursal, pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região.

Segundo o relator, o Ministro Francisco Leão, é dever do Estado fornecer medicamento que, embora não possua registro na ANVISA, tem sua importação autorizada pela agência de vigilância sanitária, conforme o tema 1.161 do Supremo Tribunal Federal.

Ademais, a discussão quanto a eventual ineficácia dos tratamentos tradicionais já experimentados pela paciente, bem como, da excepcionalidade da situação e de todo o arcabouço probatório dos autos, tais como laudos e prescrições médicas esbarraria na Súmula nº 7 do STJ.

Por: Maria Laura Vasconcelos

A Obrigatoriedade da Ata Notarial no Procedimento de Adjudicação Compulsória Extrajudicial

Inicialmente, é importante elucidar que a Adjudicação Compulsória trata-se de um procedimento estabelecido por Lei, visando a regularização do registro de um imóvel, através da autorização para a sua transferência ao credor.

O artigo 1.418 do Código Civil estabelece que o promitente comprador, ou seja, aquele que é titular do direito real, pode exigir do promitente vendedor ou a quem os direitos forem cedidos, a outorga da escritura definitiva de compra e venda, conforme o disposto no instrumento preliminar; e caso haja recusa, deverá requerer a adjudicação do imóvel. Em palavras mais compreensíveis, este termo se refere a uma situação em que alguém adquire um imóvel, através do contrato de compra e venda, e, no final, no momento de lavrar a escritura, o vendedor se recusa a outorgar a escritura.

É válido ressaltar que com o advento da Lei 14.382 de 2022, o legislador trouxe a possibilidade de realizar o aludido procedimento através da via extrajudicial, conforme aduz o artigo 216-B: “Sem prejuízo da via jurisdicional, a adjudicação compulsória de imóvel objeto de promessa de venda ou de cessão poderá ser efetivada extrajudicialmente no serviço de registro de imóveis da situação do imóvel, nos termos deste artigo”.

É importante salientar que a possibilidade de realizar a adjudicação compulsória extrajudicialmente trouxe inovação e melhoria para a sociedade, promovendo maior agilidade e desafogando o judiciário.

No que tange aos requisitos para realizar o procedimento, podemos observar a obrigatoriedade da Ata Notarial, a qual pode ser entendida como uma espécie de documento necessário para comprovar algo. Este documento é lavrado em um Tabelionato de Notas, através de um tabelião profissional, que atestará evidências ou provas que foram vivenciadas por ele.

A Ata Notarial está conceituada no artigo 384 do Código de Processo Civil, aduzindo a aludida Lei: a existência de algum fato deverá ser atestada ou documentada, através do requerimento da pessoa interessada e diante de uma Ata lavrada por tabelião.

Diante disso, é relevante e imprescindível a disposição da Ata Notarial na Adjudicação Compulsória que ocorre no formato Extrajudicial, pois este procedimento é realizado diretamente no Cartório de Registro de Imóveis e a Ata facilitará na comprovação de documentos importantes, sejam eles: a quitação da dívida, o contrato particular, a mora do devedor, entre outros.

Vale dizer, ainda, que este tema já foi considerado um tanto polêmico no meio jurídico, tendo em vista existir mais de uma reformulação quanto ao texto disposto no artigo 216-B, da Lei de Registros Públicos. O inciso terceiro, do artigo mencionado, abordava que a Ata notarial seria caracterizada como um documento fundamental para requerer a Adjudicação Extrajudicial, sendo ela lavrada por tabelião de notas, atestando a posse do requerente, a prova do pagamento da obrigação do comprador, conferindo-lhe a pretensão de adquirir a propriedade do imóvel e, a regular constituição em mora do promitente vendedor.

Ocorre que, este inciso havia sido vetado, sob a alegação de que a Ata Notarial iria encarecer e burocratizar o procedimento, porém, o Congresso Nacional derrubou o veto e, no dia 5 de janeiro de 2023, o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva promulgou a obrigatoriedade da Ata Notarial, fazendo com que haja a exigência da aludida Ata para este procedimento, assim como ocorre na Usucapião.

Escrito pela equipe de Direito Imobiliário

PL 2055/2019 e seus impactos econômicos no País

No início deste mês, a Câmara dos Deputados, através da Comissão de Desenvolvimento Econômico (CDE) aprovou o Parecer Substitutivo ao Projeto de Lei nº 2.055/2019, o qual instituí o Programa de Estímulo à Nova Empresa – Penemp. O dispositivo legislativo proposto possui como seu objetivo primordial o incentivo ao nascimento de novas estruturas empresariais no País. Para efetivação de sua finalidade, o PL pretende suspender o pagamento do Imposto de Renda para Pessoas Jurídicas – IRPJ, durante os cinco primeiros anos da constituição das novas sociedades empresárias.

Não é de hoje que a pauta da carga tributária suportada pelas pessoas físicas e jurídicas no Brasil circula perante o nosso cotidiano. No esteio dessa discussão, o referido projeto permite que as pessoas jurídicas constituídas da data de sua publicação, as quais apurem o IRPJ na modalidade do Lucro Presumido ou pelo Lucro Real, se habilitem no Programa de Estímulo à Nova Empresa – Penemp, desde que preenchidos os seus requisitos, tais como: (i) as pessoas jurídicas contempladas não podem participar de forma relevante no capital social de outras empresa; (ii) os seus sócios não podem ter participado de forma relevante no capital social de outra empresa nos três anos anteriores à constituição da nova sociedade; (iii) uma vez usufruindo do benefício, os sócios da pessoa jurídica habilitada não poderão participar de qualquer outra sociedade, a partir da data de sua constituição.

Em consideração ao atual cenário de reforma em questões tributárias, é natural que novas questões sejam apresentadas e discutidas pela sociedade. Ao que se refere ao Programa de Estímulo à Nova Empresa – Penemp, é de se ressaltar alguns pontos iniciais já podem ser considerados como objetos de futuras demandas judiciais. Inicialmente, ao tratar da “participação relevante” no capital social, pela pessoa jurídica habilitada dos benefícios ou por seu sócio, o próprio Projeto de Lei já traz indícios de se envolver em questões jurídicas turbulentas. O quanto será considerado como “relevante”? Quais serão os critérios adotados? A quem incube essa árdua definição? São alguns dos questionamentos que possivelmente, muito em breve, serão enfrentadas pelos operadores do Direito.

Diante do não recolhimento do Imposto de Renda de Pessoa Jurídica pelas empresas habilitadas no Programa de Estímulo à Nova Empresa – Penemp, é nítido que a União, como Ente Federativo competente para regular os impostos sobre a renda, terá sua receita limitada nesse cenário. Porém, é de se questionar quais medidas serão adotadas para suprir essa queda da arrecadação e quem suportará a possível nova carga tributária, nesse furacão de novos dispositivos legais que tratam dos tributos no Brasil. O texto do Parecer Substitutivo ao Projeto de Lei nº 2.055/2019 foi devidamente aprovado pela CDE e já foi encaminhado para apreciação pela Comissão de Finanças e Tributação, a qual deverá nos próximos dias apreciar a matéria em votação.

Habilitação de crédito em processo de inventário

Trata-se de pedido de habilitação de crédito formulado em face do espólio nos autos da ação de inventário, com objetivo de recebimento deste, à luz do art. 642 do CPC. Em suas considerações iniciais, o autor da ação afirma ser credor do espólio em virtude da cessão de direitos hereditários, realizada por meio de instrumento particular, por uma das herdeiras, o qual continha cláusula contratual prevendo cessão de fração de 20% (vinte por cento) do total de seu quinhão hereditário decorrente de seu genitor, ora inventariado.

Ao realizar o respectivo pedido, requereu ao juízo que fosse determinada a separação de quantia ou, em sua falta, de bens suficientes para o pagamento da dívida. bem como a alienação dos bens, tantos quantos necessários para o pagamento do crédito, em praça ou leilão.

O Juízo da 2ª Vara Cível e Criminal da Comarca de Bonito/MS extinguiu o pedido de habilitação, em decorrência da ilegitimidade ativa ad causam do autor, haja vista que a possibilidade de habilitação de crédito nos autos do inventário está adstrita aos credores do espólio, não aos herdeiros de forma individual. Desta forma, eventual cobrança de dívida de herdeiro deve ser realizada através de outras modalidades, não impedindo eventual incidência sobre o quinhão da herdeira inadimplente.

Interposto recurso, o Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina manteve hígida a sentença, destacando que, diferentemente do pedido de habilitação de crédito, existe a previsão legal para realização de penhora no rosto dos autos, entretanto, para efetivação da constrição que recairá nos bens ou direitos que couberem ao herdeiro no processo de inventário, indispensável a existência de ação prévia que reconheça tal direito.

Assim sendo, ainda que a herdeira tenha oferecido seu quinhão hereditário em garantia, inviável discutir a satisfação do crédito ou determinar a reserva de bens nos próprios autos do inventário, devendo ser executado o crédito pela via processual adequada, para posterior requerimento de penhora do quinhão da parte devedora no rosto dos autos do processo de inventário.

A respeito da cessão de direitos hereditários, esta pode se realizar de forma onerosa ou gratuita, observada a escritura pública como forma, conforme artigo 1.793 do CC/2002 e tem por objeto a universalidade de direitos, transferindo apenas direitos e não a qualidade de herdeiro. Ainda, deverá ser aperfeiçoado após a abertura da sucessão, com o recolhimento do respectivo imposto, a depender da modalidade, observado o direito de preferência dos coerdeiros quando onerosa.

Ainda a respeito do mesmo tema, o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região decidiu pelo cabimento da penhora no rosto dos autos de processo de inventário quando a executada em ação trabalhista é uma das herdeiras, haja vista que a indivisibilidade ocorre somente até a partilha.

Nos autos do julgamento de agravo de petição de n° 0020125-59.2015.5.04.0702, a sócia executada requereu a desconstituição da penhora sob o seu quinhão bloqueado nos autos do inventário o qual figura como herdeira. Em suas razões, aduziu que não ser o espólio devedor, de forma que seria vedada a penhora no rosto dos autos antes de ultimada a partilha.

Em que pese as razões suscitadas, a decisão ressaltou que a constrição não incidiu sobre o espólio, mas sim, sobre o quinhão destinado a herdeira. Tratando-se ainda, de garantia ao credor trabalhista o seu direito, observado o limite do valor do quinhão destinada à herdeira.

Sendo assim, analisadas as possibilidades e limites impostos pela lei, é possível conferir aos credores a segurança da satisfação dos seus respectivos créditos, observados os direitos sucessórios dos herdeiros e proteção à segurança do espólio.

A Recuperação Judicial, os Créditos Trabalhistas e a Desconsideração da Personalidade Jurídica no âmbito laboral

O processo de Recuperação Judicial, cujo marco regulatório é a Lei n° 11.101/2005, tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira da empresa devedora, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica. É o que se chama do princípio da preservação da empresa, previsto no artigo 47 da Lei n° 11.101/2005.

O mencionado princípio recuperacional foi concebido, pelo legislador, à luz do que dita a nossa Constituição Federal que, ao regular a ordem econômica, impõe a observância dos postulados da função social da propriedade (artigo 170, inciso III), como também, a busca do pleno emprego (inciso VIII), o que só poderá ser atingido se as empresas forem preservadas.

A Lei de Recuperação Judicial e Falências determina, para os créditos trabalhistas (Classe 1), que os valores de natureza estritamente salarial, limitados até 150 (cento e cinquenta) vencidos nos 03 (três) meses anteriores à decretação da recuperação judicial e/ou falência, até o limite de 05 (cinco) salários-mínimos por trabalhador, deverão ser pagos tão logo haja disponibilidade em caixa.

Inobstante, temos percebido que a Justiça do Trabalho tem se utilizado muito do instituto da desconsideração da personalidade jurídica para satisfazer o crédito de um trabalhador, cujo montante se encontra listado e habilitado em processo de recuperação judicial da empresa empregadora. Mas, será que tal comportamento se coaduna com o princípio da preservação da empresa tão preconizado na Lein° 11.101/2005?

Pois bem, a desconsideração da personalidade jurídica, na Justiça do Trabalho, é meio lídimo de satisfação da dívida pelo credor quando as tentativas de fazê-lo em face do devedor originário malograram.

O artigo 789 do Código de Processo Civil estabelece que o devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para o cumprimento de suas obrigações, salvo as restrições estabelecidas em lei, o que significa dizer que a satisfação da dívida enseja um dever para o devedor e uma responsabilidade para o seu patrimônio. É cediço que a pessoa do sócio não se confunde com a pessoa jurídica.

Os artigos 49-A e 1.024 do Código Civil, por sua vez, consagram o “princípio da autonomia patrimonial das pessoas jurídicas”, que nada mais é, nos termos do parágrafo único do artigo 49-A mencionado, do que um instrumento lícito de alocação e segregação de riscos, estabelecido pela lei com a finalidade de estimular empreendimentos, para a geração de empregos, tributo, renda e inovação em benefício de todos.

Ou seja, a responsabilidade patrimonial do sócio encontra restrição nos artigos 790, inciso II, cumulado com o 795, ambos do Código de Processo Civil, no sentido de que seus bens só respondem pela dívida societária nos casos previstos em lei.

A empresa detém o débito e a responsabilidade pelo pagamento, enquanto os sócios ao terem seus bens alcançados pelas dívidas da pessoa jurídica que compõem não possui débito, mas se tornam responsáveis pela obrigação contraída.  

Em verdade, a teoria da desconsideração da personalidade jurídica surgiu unicamente com o intuito de ultrapassar pontualmente a autonomia patrimonial da pessoa jurídica em razão do uso indevido desta e não a personalidade jurídica.

A desconsideração da personalidade jurídica permite que bens de terceiros sejam processualmente excutidos para satisfazer dívida de credor que não obteve êxito para tanto do devedor originário.  Os requisitos para desconsideração da personalidade jurídica encontram-se presentes em diversas normas do ordenamento jurídico, a saber: art. 50, CC; art. 28, CDC; art. 2°, §2°, da CLT; art. 135 do CTN; arts. 117, 158, 245 e 246 da Lei n. 6.404/76;  art. 4° da Lei n. 9.605/98; art. 18, §3°, da Lei n. 9.847/99; art. 34 da Lei n. 12.529/2011; e art. 14 da Lei n. 12.846/2013.

Na esfera trabalhista, a 6ª turma do TRT da 1ª região, recentemente, negou provimento a um agravo de petição interposto pelos sócios de uma empresa de serviços gerais em processo de recuperação judicial. Condenados a responder subsidiariamente pelo inadimplemento dos créditos trabalhistas de um ex-empregado, os empresários alegaram que a inclusão no polo passivo da execução só caberia se comprovada a má administração da empresa, o que não ocorreu.

A relatora do acórdão, ao analisar o recurso, quanto à alegação de suspensão da execução, lembrou que conforme o disposto no artigo 6º da Lei n° 11.101/05, a abertura do processo de recuperação judicial suspende o curso de todas as execuções pelo prazo de 180 dias, salvo disposição judicial que amplie esse prazo. É o chamado stay period. No presente caso, a magistrada verificou que o referido prazo já estava superado e não havia, nos autos, prova de que foi prorrogado judicialmente, tendo destacado que:

“Revendo posicionamento até então adotado, passo a defender o entendimento de que nos casos em que a empresa executada está submetida a processo de recuperação judicial ou falência, há possibilidade de redirecionamento da execução, na Justiça do Trabalho, contra os sócios responsabilizáveis ou responsáveis subsidiários, antes mesmo de encerrado o processo no Juízo Universal.”

Percebe-se com a afirmação acima que o entendimento da Justiça do Trabalho para credores trabalhistas é no sentido de estimular a manutenção das reclamações existentes, mesmo que os créditos dos trabalhadores estejam listados e habilitados no processo recuperacional, dado que a execução pode ser imediatamente direcionada aos sócios, independentemente do desfecho do processo falimentar ou de recuperação judicial, bastando haver a confusão patrimonial entre os bens dos sócios e da empresa, não sendo necessária a comprovação de fraude ou má administração, como exige a legislação civil.

Tem-se a impressão que a Justiça do Trabalho, smj, desconsidera a importância da preservação da empresa e pretende acabar com a recuperação judicial para crédito Classe 1 (de reclamantes) mediante despersonalização da pessoa jurídica de forma simples e automática, mesmo sem o preenchimento dos requisitos da lei civil. É preciso, urgente, fomentar o debate para que este entendimento seja modificado, preservando o instituto da recuperação judicial.

Multa prevista em acordo homologado judicialmente tem natureza de cláusula penal, decide o STJ

No julgamento do Recurso Especial nº 1.999.836/MG, de Relatoria da Min. Nancy Andrghi, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, entendeu que a multa prevista em acordo homologado judicialmente tem natureza jurídica de multa contratual (cláusula penal), e não de astreintes. Assim, a sua redução se submete às normas do Código Civil (CC).

Com base neste entendimento, negou-se provimento ao referido Recurso Especial, uma vez que a imobiliária recorrente sustentava que a multa por atraso no cumprimento da obrigação, pactuada em transação homologada judicialmente, deveria caracterizar-se como astreintes, e, por isso, poderia ser revisada a qualquer tempo, por força do artigo 537, parágrafo 1º, do Código de Processo Civil.

Mas, ao contrário disso, a relatora do julgamento do recurso no STJ, a ministra Nancy Andrighi, observou que a transação é um contrato típico, previsto nos artigos 840 e 842 do Código Civil, de modo que a multa discutida no referido caso, por decorrer de acordo firmado entre as partes, tem natureza jurídica de multa contratual, ou seja, a chamada cláusula penal, prevista nos artigos 408 a 416 do Código Civil.

Inclusive, a Magistrada ainda ressaltou que o artigo 413 do Código Civil prevê expressamente a possibilidade da multa ser reduzida equitativamente pelo juiz se a obrigação principal tiver sido cumprida em parte, ou se o montante da penalidade for manifestamente excessivo, tendo em vista a natureza e a finalidade do negócio.

E finalizou explicando, no referido julgamento, que como a multa prevista em transação homologada judicialmente tem natureza de cláusula penal, e não de astreintes, a imobiliária (recorrente) deveria ter fundamentado o pedido de revisão do valor com base no artigo 413 do CC, e não no artigo 537, parágrafo 1º, do CPC. Além disso, a E. Ministra comentou que a análise de eventual desproporcionalidade da cláusula penal só ocorre excepcionalmente em recurso especial, em razão da Súmula 5 e da Súmula 7 do STJ.

 No referido julgamento, portanto, a 3ª Turma do STJ deixou claro que a multa contratual derivada de um acordo homologado judicialmente tem a natureza de uma cláusula penal, regulamentada pelos artigos 408 a 416 do Código Civil, só podendo sofrer alguma revisão consoante as hipóteses expressamente elencadas no artigo 413 do mesmo código.

Patrimônio de afetação em loteamentos

Em 14/07/2023 foi promulgada a Lei 14.620/2023, a qual dispõe sobre o Programa Minha Casa, Minha Vida, estabelecendo suas novas diretrizes e, consequentemente, promovendo a alteração de legislações correlatas.

Dentre as várias mudanças operadas pela Lei, merece atenção a inclusão dos artigos 18-A a 18-F na Lei 6.766/1979, os quais disciplinam a possibilidade da instituição do regime de patrimônio de afetação em loteamentos, considerando que o instituto era restrito à incorporação imobiliária.

O patrimônio de afetação é caracterizado pela segregação do patrimônio do loteador de todo o terreno e infraestrutura desenvolvida para o loteamento, incluindo os bens e direitos, os quais ficarão afetados à consecução do empreendimento e à entrega dos lotes urbanizados aos respectivos adquirentes.

Nesse contexto, importante ressaltar a segurança jurídica trazida pelo instituto aos promissários compradores e investidores ao assegurar que o patrimônio de afetação não se comunica com os demais bens, direitos e obrigações do patrimônio geral do loteador ou de outros patrimônios de afetação por ele constituídos, de modo que apenas responderá por dívidas e obrigações vinculadas ao respectivo loteamento.

Logo, o patrimônio de afetação afasta também todos os efeitos da decretação da falência ou da insolvência civil do loteador, de modo que o terreno, a obra e os demais bens, tais quais: direitos creditórios, obrigações e encargos objeto do loteamento, não integrarão a massa concursal.

Além disso, importante ressaltar a maior transparência e controle sobre o caixa do empreendimento, considerando a obrigatoriedade de uma contabilidade separada e completa, mesmo que esteja desobrigado pela legislação tributária, permitindo uma fiscalização mais concreta por parte dos órgãos públicos, instituições financeiras e promissários compradores.

Em que pese o patrimônio de afetação proporcionar transparência e garantia de que o empreendimento será entregue dentro das condições estabelecidas, por outro lado provoca uma maior rigidez do caixa, considerando que o loteador não poderá utilizar os recursos daquele loteamento afetado em outros empreendimentos.

Diante disso, o instituto apenas passou a ter uma ampla adesão pelos incorporadores quando o Governo Federal passou a estimular o seu uso através da concessão do Regime Especial de Tributação (RET) para os empreendimentos que estivessem com seu patrimônio afetado, reduzindo a tributação do lucro presumido de 6,73% para 4%. Ocorre que, não há menção na nova lei acerca da aplicação do RET para os loteamentos.

Ademais, outro ponto de controvérsia está sendo a possibilidade de aplicação do parágrafo 5º, art. 67-A, da Lei 4.591/64, por analogia, aos loteamentos. A norma dispõe acerca da possibilidade de retenção de 50% (cinquenta por cento) pelo incorporador da quantia paga pelo adquirente, em caso de resolução por inadimplemento do promissário comprador, caso o empreendimento esteja submetido ao regime de patrimônio de afetação.  

Diante da ausência de julgados sobre o tema, pela recente promulgação e vigência da Lei 14.620/2023, devemos aguardar o posicionamento da jurisprudência acerca dos aspectos controvertidos em discussão.