O que falta para a ANPD aplicar as multas previstas na LGPD?

A Lei n° 13.709/2018, mais conhecida como Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), foi publicada há mais de 04 (quatro) anos, sem que nenhuma das 09 (nove) penas, previstas no seu artigo 52, tenha sido aplicada.

Mas, qual o real motivo da ANPD – Autoridade Nacional de Proteção de Dados – ainda não ter aplicado nenhuma multa? O que falta para tanto?

A resposta é simples: a ANPD depende da publicação de uma portaria com a metodologia de cálculo das multas para começar a aplicá-las. É o que consta do seu artigo 53 (“A ANPD definirá, por meio de regulamento próprio sobre sanções administrativas a infrações a esta Lei, que deverá ser objeto de consulta pública, as metodologias que orientarão o cálculo do valor-base das sanções de multa”).

A Consulta Pública já foi realizada pela Autoridade Nacional, no período havido entre os dias 16 de agosto e 15 de setembro de 2022. Foram mais de 2.000 (duas mil) contribuições de diferentes segmentos da sociedade civil, trazendo pluralidade e diversidade ao projeto de regulamentação.

Os próximos passos incluem a análise de admissibilidade das contribuições pela Coordenação-Geral de Normatização e avaliação das sugestões pela equipe de projeto da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD). Haverá, ainda, uma análise jurídica; definição de novo relator no Conselho Diretor da Autoridade para proposição de um texto final; votação; e, aprovação. 

A expectativa é que, até o final do ano de 2022, ou, no começo de 2023, a Portaria necessária à aplicação das multas pela ANPD seja publicada no Diário Oficial, viabilizando a finalização dos processos administrativos que investigam infrações – que já estão sendo conduzidos internamente – com a aplicação da reprimenda cabível.

Uma coisa é certa, apesar de ainda não terem sido publicadas objetivamente as formas e dosimetrias para o cálculo do valor-base das sanções de multa (que podem chegar até 2% do faturamento da empresa, limitada a R$ 50 milhões por infração), as penalidades terão efeito retroativo e as empresas poderão ser multadas por situações ocorridas desde 01 de agosto de 2021, data do início da vigência das sanções.

Logo, possivelmente, as primeiras sanções em pecúnia da ANPD serão referentes a eventos já ocorridos e que estão sob investigação. O importante é que as empresas se adequem, o quanto antes, ao que dita a LGPD, com a implantação de projetos de conformidade, bem assim, a adoção de uma governança de dados, demonstrando, enfim, que estão preocupadas com os dados das pessoas naturais e que possuem medidas para reverter ou mitigar os efeitos de um incidente de vazamento de dados.

Recuperação Judicial e Revisão dos Contratos

Em recentíssimo julgado, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que a habilitação do crédito e a posterior homologação do plano de recuperação judicial não impedem a rediscussão do seu valor em sede de ação revisional de contrato (Resp n° 1700606 – PR).

A decisão teve origem em ação proposta por uma empresa em recuperação judicial contra uma instituição bancária, visando à revisão de contratos de empréstimo, em virtude de suposto excesso na cobrança de juros e outras irregularidades.

Em sua defesa, o banco alegou que, ao apresentar o pedido de recuperação, a empresa concordou tacitamente com todas as cláusulas inseridas nos contratos, o que impediria o ajuizamento da ação revisional.

Asseverou, ainda, que seu crédito, de mais de R$ 4 milhões, já devidamente habilitado, não foi impugnado no prazo legalmente previsto, de modo que, sobrevindo a homologação do plano de recuperação, não mais seria possível a rediscussão do valor em ação revisional de contrato bancário.

O Relator do processo no STJ, o Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva ressaltou que, conforme o artigo 59 da Lei n° 11.101/2005, o plano de recuperação judicial implica novação dos créditos anteriores ao pedido e obriga o devedor e todos os credores a ele sujeitos, sendo certo que o reconhecimento judicial da concursalidade do crédito, habilitado ou não, torna obrigatória a sua submissão aos efeitos da recuperação.

O Ministro observou também que a mesma lei, em seu artigo 50, inciso I, quando utiliza um conceito aberto ao tratar das “condições especiais para pagamento”, deixa transparecer que tal norma deve ser interpretada da forma mais ampla possível, admitindo a adoção de qualquer condição que seja aceitável para os credores e que possam contribuir para o soerguimento da empresa recuperanda, ante o princípio da preservação da empresa que norteia o processo recuperacional.

Em relação ao crédito já habilitado, o relator ponderou que, ainda que já tenha sido homologado pelo juízo da recuperação, nada impede que sobrevenham acréscimos ou decréscimos por força de provimento jurisdicional definido em demandas judiciais em curso, a ensejar a aplicação da condição especial definida no plano de recuperação ao novo valor do débito judicialmente reconhecido.

De fato, ante a importância da temática para as empresas que se encontram em recuperação judicial, a consolidação deste entendimento configura uma chance a mais para o efetivo soerguimento empresarial.