Negócios Imobiliários Via Token e Aspectos Registrais

A dinâmica do mercado tem produzido transformações e importantes inovações a respeito da possibilidade da tokenização da propriedade imobiliária.

Para a International Organization of Securities Commissions (IOSCO), a tokenização é “o processo de representar digitalmente um ativo ou propriedade de um ativo”. A criação de direitos ou créditos no meio digital, através da tecnologia blockchain, tem sido conhecida como tokenização.

Em referência ao assunto abordado, temos o recente pronunciamento do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, por meio do Provimento 38/21 da a Corregedoria-Geral da Justiça (CGJ), o qual regulamentou a lavratura de escrituras públicas de permuta de bens imóveis por tokens, bem como o respectivo registro imobiliário.

A escritura pública que motivou a CGJ do Rio Grande do Sul a editar o referido provimento remete à permuta de um imóvel por um token criado através de smart contract na rede principal do Ethereum (main network), tendo sido lavrada em 18 de maio de 2021.

O modelo de tokenização imobiliária proposto pela empresa Netspaces, permutante no ato originário do processo, foi o seguinte:

  1. O proprietário acessa o site da empresa e solicita a digitalização do imóvel de sua propriedade;
  2. O proprietário e a empresa assinam uma escritura de permuta, pela qual a empresa recebe a propriedade do imóvel, que se transformará em propriedade digital;
  3. Neste ato, o proprietário paga o ITBI devido ao município e os custos da escritura;
  4. A seguir, o proprietário paga os custos do registro da escritura no cartório de imóveis. Feito o registro, a mencionada empresa adquire a propriedade efetiva do imóvel;
  5. Uma vez “digitalizado” o imóvel, a empresa registra a transação e a propriedade digital na blockchain em nome do antigo proprietário, o qual terá apenas a propriedade digital, representada por um token.

Ainda de acordo com o modelo proposto, após a “digitalização da propriedade”, o dono do imóvel digital e, por conseguinte, detentor do token que representa essa sua qualidade no ambiente virtual, pode aliená-lo a terceiros, desde que as transações sejam realizadas dentro da plataforma da Netspaces, conforme artigos 33 e 34 do regulamento supracitado.

Além disso, remanesce ao proprietário digital uma relação possessória sobre a propriedade real, regida pelas disposições do Código Civil. Logo, o direito de usar o imóvel em propriedade digital poderá ser exercido pelo proprietário digital ou, de acordo com a sua vontade, por terceiros, a título gratuito ou oneroso.

Não obstante, a faculdade de fruir do imóvel em propriedade digital pertence ao proprietário digital, o qual poderá transferi-lo em caráter não definitivo a quem queira, a título gratuito ou oneroso.

As vantagens da tokenização imobiliária são inegáveis: possibilitam o fracionamento do valor patrimonial permitindo ao investidor um baixo valor de entrada, permitem a diversificação dos ativos, pois um token pode estar vinculado a diversos imóveis (residenciais, comerciais, industriais etc.). Outras vantagens são a liquidez imediata e a eficiência de custos decorrente da automação e dispensa de intermediários.

Por fim, é notória a importância que a CVM e o Banco Central regulamentem a tokenização de ativos imobiliários. O mercado imobiliário global é imenso, com valor estimado em US$ 280 trilhões. A tokenização dará acesso, fluidez, liquidez e amplo acesso a pequenos investidores a este mercado.

Confira na íntegra: Provimento nº 38/2021 e Regulamento da Propriedade Digital V0.5.

Senado aprova o PL 548/2019, que aborda as assembleias virtuais

Aprovado em 15 de fevereiro de 2022 e proposto pela senadora Soraya Thronicke (PSL-MS), o Projeto de Lei nº 548/2019 passa pelo Senado e segue à  sansão presidencial. Com o objetivo de reforçar a necessidade de oportunizar outras formas de se realizar uma reunião ou assembleia além da forma presencial, o projeto autoriza a realiazaçõ de assembleias e votações virtuais pelos condomínios.

Nesse sentido, a convocação da assembleia deverá dispor de instruções sobre a sua realização exclusivamente por meio virtual, ou híbrido(mista), quando há possibilidade de participar presencial e virtualmente, com instruções de acesso, manifestação e coleta de votos. Ao final, a ata será lavrada após a somatória e divulgação dos votos. Além disso, todos os documentos pertinentes à ordem do dia poderão ser disponibilizados de forma física ou eletrônica.

A administração, contudo, não poderá ser responsabilizada por problemas dos dispositivos ou conexão à internet daqueles que participam, nem por outras situações que não estejam sob o seu controle.

Ainda, no caso de não ser alcançado o quórum, é permitido à assembleia, por decisão da maioria dos presentes, declarar a sessão permanente, desde que: havendo mais de uma suspensão, a deliberação ocorra no prazo total máximo de 90 (noventa) dias, contados da sessão inicial, sejam indicadas a data e a hora da continuação dos trabalhos, sendo apontado o tema pendente de deliberação, e os presentes sejam alertados e os ausentes convocados, anexando-se a ata parcial, que deve contemplar o que ocorrer na continuação dos trabalhos.

As reuniões virtuais e híbridas são mais democráticas, pois permitem que mais pessoas possam participar, agilizando, com isso, o processo de deliberação das pautas. Apesar de na prática vários condomínios já se utilizarem dessas inovações, é importante que exista uma lei regulando o assunto.

Confira na íntegra: PL 548/2019.

Existe prazo para requerer a nulidade de uma sentença arbitral em sede de Cumprimento de Sentença?

A arbitragem constitui meio de resolução alternativa de conflitos, de modo que é possibilitado às partes valer-se dela para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis de forma técnica e célere.

Justamente pelo fato de ser um método alternativo de solução de conflitos, independente das regras e normas que regem o Poder Judiciário, as sentenças proferidas nos procedimentos arbitrais não estão sujeitas à homologação pelo Poder Judiciário e, além disso, são irrecorríveis, uma vez que a jurisdição arbitral é única e, portanto, não sujeita ao duplo grau de jurisdição.

A irrecorribilidade das sentenças arbitrais encontra-se expressamente prevista no art. 18 da Lei nº 9.307/1996. Além disso, a referida Lei também prevê em seu art. 31 que a sentença arbitral produz os mesmos efeitos da sentença proferida pelos órgãos do Poder Judiciário, constituindo, assim, título executivo.

Em que pese não haver a possibilidade de apresentação de recurso em face da sentença arbitral, a própria Lei de Arbitragem permite que as partes possam pleitear, junto ao Poder Judiciário, a declaração de sua nulidade, acaso seja verificada alguma das hipóteses previstas na Lei, as quais encontram-se taxativamente elencadas no art. 32 da Lei nº 9.307/1996.

Nesse sentido, a declaração de nulidade da sentença arbitral pode ser pleiteada pela parte interessada por duas vias: (i) o ajuizamento de Ação Declaratória de Nulidade de Sentença Arbitral (art. 33, § 1º, da Lei nº 9.307/1996); ou, (ii) a Impugnação ao Cumprimento de Sentença (art. 33, § 3º, da Lei nº 9.307/1996), na hipótese de haver sido apresentado pela parte interessada o competente cumprimento de sentença da decisão que se busca declarar a nulidade.

Independente de qual seja o meio utilizado pela parte interessada para buscar a nulidade da sentença, é certo que ela deverá sempre atentar ao prazo prescricional imposto legalmente.

A Lei de Arbitragem prevê que a Ação Declaratória de Nulidade de Sentença Arbitral deverá ser ajuizada no prazo de até 90 (noventa) dias após o recebimento da notificação da respectiva sentença, seja ela parcial ou final, ou da decisão do pedido de esclarecimentos eventualmente formulado (art. 33, § 1º, da Lei nº 9.307/1996).

Desse modo, não há dúvidas de que a referida demanda somente pode ser ajuizada dentro do prazo decadencial de 90 (noventa) dias.

Por outro lado, no que concerne à possibilidade de formulação de pedido de declaração de nulidade da sentença arbitral em sede de impugnação ao cumprimento de sentença, o Superior Tribunal de Justiça – STJ foi instado a dirimir a controvérsia acerca da aplicação, ou não, do prazo nonagesimal quando da utilização da impugnação com o propósito de buscar a declaração da nulidade da sentença arbitral com fundamento em uma ou mais hipóteses previstas no art. 32 da Lei de Arbitragem.

Nesse sentido, em 12/04/2021, o Superior Tribunal de Justiça publicou o Informativo nº 0691, no qual constou o julgamento do REsp nº 1.900.136/SP (2020/0034599-1) de relatoria da Ministra Nancy Andrighi e que foi julgado pela Terceira Turma, por unanimidade, no qual restou consignado que:

“[…] embora a nulidade possa ser suscitada em sede de impugnação ao cumprimento de sentença arbitral, se a execução for ajuizada após o decurso do prazo decadencial da ação de nulidade, a defesa da parte executada fica limitada às matérias especificadas pelo art. 525, § 1º, do CPC, sendo vedada a invocação de nulidade da sentença com base nas matérias definidas no art. 32 da Lei 9.307/96. […]”

 

Na ocasião foi firmada a tese de que “A impugnação ao cumprimento de sentença arbitral, devido à ocorrência dos vícios elencados no art. 32 da Lei nº 9.307/1996, possui prazo decadencial de 90 (noventa) dias”.

Inobstante isso, essa mesma questão permanece sendo levada à análise da Corte Superior, tanto que, em 20/09/2021, quando publicado o Informativo nº 0709, que teve, dentre as teses selecionadas, aquela extraída do julgamento do REsp                    nº 1.862.147/MG (2020/0036910-5) de relatoria do Ministro Marco Aurélio Bellizze, cujo acórdão foi proferido também pela Terceira Turma, por unanimidade, tendo sido estabelecido que não é cabível a apresentação de impugnação ao cumprimento de sentença arbitral, “com base nas nulidades previstas no art. 32 da Lei n. 9.307/1996, após o prazo decadencial nonagesimal”.

Na oportunidade, além de registrar a impossibilidade de arguição das matérias elencadas no art. 32 da Lei de Arbitragem após o prazo de 90 (noventa) dias, o Ministro Relator trouxe a debate, ainda, a incompatibilidade inerente ao desejo da parte interessada de buscar a nulidade da sentença arbitral após decorrido o prazo decadencial, considerando a celeridade, efetividade e segurança jurídica perseguidas pelas partes signatárias de um compromisso arbitral. Veja-se:

“[…]2. Sob o signo da celeridade, da efetividade e da segurança jurídica especialmente perseguidas pelas partes signatárias de um compromisso arbitral, a pretensão de anular a sentença arbitral deve ser intentada de imediato, sob pena de a questão decidida tornar-se imutável, porquanto não mais passível de anulação pelo Poder Judiciário, a obstar, inclusive, que o Juízo arbitral profira nova decisão sobre a matéria.

2.1 A Lei de Arbitragem, atenta a essa premência, estabelece, para tal desiderato, o manejo de ação anulatória (art. 33, caput) e, em havendo o ajuizamento de execução de sentença arbitral (art. 33, § 3º), de impugnação ao seu cumprimento, desde que observado, em ambos os casos, o prazo decadencial nonagesimal. Sem respaldo legal, e absolutamente em descompasso com a inerente celeridade do procedimento arbitral, supor que a parte sucumbente, única interessada em infirmar a validade da sentença arbitral, possa, apesar de não promover a ação anulatória no prazo de 90 (noventa) dias, manejar a mesma pretensão anulatória, agora em impugnação à execução ajuizada em momento posterior a esse lapso, sobretudo porque, a essa altura, o direito potestativo (de anular) já terá se esvaído pela decadência. Precedente específico desta Terceira Turma. […]”

 

E se é assim, resta evidente que, apesar de ser possibilitado à parte interessada requerer a declaração de nulidade da sentença arbitral tanto por meio de ação própria quanto através de impugnação ao cumprimento de sentença arbitral, é certo que o prazo decadencial de 90 (noventa) dias deverá ser por ela respeitado.

Dessa forma, acaso o cumprimento de sentença arbitral venha a ser ajuizado somente após o decurso do aludido prazo, não mais poderá a parte interessada fundar sua impugnação na nulidade da sentença arbitral, devendo limitar-se, portanto, às matérias inscritas no art. 525, § 1º, do Código de Processo Civil.

Assim, decorrido o prazo decadencial, a parte interessada somente poderá arguir, em sede de impugnação ao cumprimento de sentença arbitral, aquelas matérias relativas à (i) falta ou nulidade de citação se o processo correu à revelia na fase de conhecimento; (ii) ilegitimidade da parte; (iii) inexiquibilidade do título ou inexigibilidade da obrigação; (iv) penhora incorreta ou avaliação errônea; (v) excesso de execução ou cumulação indevida de execuções; (vi) incompetência absoluta ou relativa do juízo da execução; e (vii) qualquer causa modificativa ou extintiva da obrigação, desde que supervenientes à sentença arbitral.

É evidente, portanto, a importância de a nulidade da sentença arbitral ser de logo requerida pela parte interessada sempre que for verificada a incidência de alguma das hipóteses de nulidade listadas no art. 32 da Lei nº 9.307/1996, fazendo prevalecer, inclusive, a celeridade do procedimento, que é inerente à arbitragem.

Agindo dessa forma, a parte interessada não dependerá do ajuizamento do cumprimento de sentença arbitral para, somente então, apresentar sua impugnação, o que minimizará, de certo, os riscos de eventual perda do direito de ver reconhecida a nulidade da sentença proferida pelo juízo arbitral.

Sendo assim, considerando que o prazo para requerimento da nulidade da sentença arbitral é de 90 (noventa) dias, não há dúvidas de que é aconselhável à parte interessada sua antecipação à instauração de eventual cumprimento de sentença arbitral, apresentando, desde logo, as razões para a declaração da nulidade da sentença arbitral por meio de ação própria.

 


Por: Marivalda Costa

Retorno da empregada gestante ao trabalho presencial assegurado pela Lei 14.311/2022

Em 12 de maio de 2021, foi publicada a Lei nº 14.151, que versou sobre o afastamento da empregada gestante das atividades de trabalho presencial, durante a emergência de saúde pública, decorrente do novo coronavírus. A referida lei tratava do afastamento dessas empregadas como uma obrigatoriedade e imposição.

No entanto, na data de hoje, foi publicada a Lei nº 14.311, que altera a Lei nº 14.151/2021, disciplinando novas regras sobre as atividades presenciais da empregada gestante.

De acordo com a nova lei, durante a emergência de saúde pública, a empregada gestante que ainda não tenha sido totalmente imunizada deverá permanecer afastada das atividades de trabalho presencial. Essa empregada, assim como na lei anterior, ficará à disposição do empregador para exercer as atividades em seu domicílio, por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho a distância, sem prejuízo de sua remuneração. Além disso, uma vez optado pelo trabalho remoto, o empregador poderá, respeitadas as competências para o desempenho do trabalho e as condições pessoais da gestante para o seu exercício, alterar as funções por ela exercidas, sem prejuízo de sua remuneração integral e assegurada a retomada da função anteriormente exercida, quando retornar ao trabalho presencial.

Nas situações em que a empregada gestante já estiver com esquema vacinal completo contra o coronavírus SARS-CoV-2, e não tendo a empresa optado pela realização do trabalho telepresencial ou remoto, ela deverá retornar à atividade presencial, a partir do dia em que o Ministério da Saúde considerar completa a imunização.

Embora ainda não tenham sido apresentadas maiores orientações a respeito do que seria essa completa imunização, o Ministério da Saúde, através da Nota Técnica 11/22022, considera como esquema vacinal completo os casos em que as pessoas receberam as duas doses da vacina, mais a dose de reforço, ou a dose única, no caso da Janssen, também com a dose de reforço.

A nova lei também prevê que as empregadas que optaram por não serem submetidas a imunização do coronavírus SARS-CoV-2 deverão retornar ao trabalho, mediante apresentação de termo de responsabilidade e de livre consentimento para exercício do trabalho presencial, comprometendo-se a cumprir todas as medidas preventivas adotadas pela empresa.

Pela referida lei, a opção de não ser submetida a imunização é uma expressão do direito fundamental da liberdade de autodeterminação individual e não poderá ser imposta à gestante que fizer a escolha pela não vacinação qualquer restrição de direitos em razão dela.

Por fim, a lei não contemplou o que deve ser adotado pelos empregadores nos casos em que a empregada deseja se vacinar, mas não o fez por recomendação médica. Sendo assim, é importante que cada caso seja avaliado, individualmente, com auxílio das áreas jurídica e médica.

Recuperação Judicial – homologação do plano com dispensa de CND?

O instituto da Recuperação Judicial é uma das hipóteses previstas pela Lei n° 11.101 de 2005, a Lei de Falências, como medida de superação do estado de insolvência, na tentativa de soerguimento durante grave crise econômica empresarial.

Após a realização do pedido de recuperação por parte da empresa, faz-se necessária a homologação do Plano de Recuperação, se aprovado em Assembleia Geral de Credores, pelo juízo competente. Tal homologação, obviamente, requisita uma série de condições e documentos, sendo um deles, a Certidão Negativa de Débitos Tributários (CND), prevista no artigo 57 da lei acima referida.

A CND, contudo, denota justamente a falta de dívidas com Fisco brasileiro (ou a sua negociação com a Fazenda Pública), sendo, por muitas vezes, o passivo tributário do devedor que pede recuperação judicial, uma das razões de sua crise.

Inobstante, como uma empresa, que reconhece seu estado de crise generalizada, ao ponto de recorrer ao processo recuperacional em juízo, deve ser obrigada a apresentar uma certidão comprovando que não se encontra em débito com o Estado, o Município, ou, até mesmo com a União?

Não se pode deixar de observar a antinomia, evidente entre a norma do artigo 57 e o princípio preservação da empresa, cujo processo recuperacional se baseia por inteiro. Há incompatibilidade da referida exigência com a relevância social da empresa, assim como o princípio que objetiva sua preservação, além do fato de que tais débitos sequer se submetem à recuperação judicial, sendo constituída, indiretamente, cobrança indevida de tributos, contrária à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), devendo bastar apenas a comprovação de acordos de parcelamento tributários para a homologação.

Sendo o objetivo da recuperanda seu soerguimento, é lógico inferir que, certamente, haverá débitos tributários em seu histórico, mesmo após o advento da Lei n° 13.988/2020, que possibilitou à União realizar a concessão de descontos nas multas, nos juros de mora e nos encargos legais relativos a créditos irrecuperáveis ou de difícil recuperação, regulamentada pela Portaria PGPN/ME n° 2382/2021.

Neste sentido, algumas decisões vêm sendo proferidas nos tribunais pátrios, após, inclusive, a recente decisão do Ministro Dias Toffoli, do STF, que tornou sem efeito liminar do ministro Luiz Fux, que exigia a CND para homologação dos planos de recuperação judicial.

Um exemplo relevante ocorreu em Pernambuco, na Comarca de Recife. Defende o Juiz Nehemias de Moura Tenório, na sentença de homologação que: “Nesse sentido a construção jurisprudencial assentada nas decisões do STJ e nos Estados é pacífica na prevalência da preservação das empresas, espírito orientador da lei de recuperação judicial, por motivo óbvio, já que na maioria das vezes o passivo tributário das empresas em processo de recuperação judicial é superior a suas situações econômico-financeira, de modo que a exigência das certidões seria impedimento a concessão da recuperação judicial, no que contraria o objetivo norteador.” (Recuperação Judicial do Monte Hotéis S/A – 0055976-96.2016.8.17.2001, Seção A da 21ª Vara Cível).

Ou seja, é viável a homologação do Plano de Recuperação Judicial aprovado em Assembleia, sem a apresentação das CND’S respectivas.

Saliente-se, obviamente, que não é razoável o calote ao Fisco. Mas, deve-se reforçar a questão de que a exigência da CND é incoerente, até porque, como já exposto, o crédito tributário não é exigível no instituto da Recuperação Judicial, podendo o Fisco ajuizar a sua Execução Fiscal a fim de receber o que lhe é devido.

Prezemos, portanto, pela função social da empresa, bem como o fundamento de soerguê-la como princípio fundamental do estimado instituto da Recuperação Judicial.

 


Por: André Garcia Filho

Tutela Judicial da pessoa com deficiência. Análises de legislações e de decisão judicial em concurso público

No Brasil, a Lei 13.146/2015, institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência. Tal legislação, por seu turno, também é conhecida como Estatuto da Pessoa com Deficiência, que dentre as disposições trazidas, elenca como dever do Estado, da sociedade e da família assegurar à pessoa com deficiência, com prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à educação, à profissionalização, ao trabalho, à previdência social, entre outros decorrentes da Constituição Federal.

Dessa forma, o tratamento prioritário perante as pessoas com algum tipo de deficiência, visa atenuar as diferenças, objetivando oportunidades mais igualitárias a todos os indivíduos.

Para além do Estatuto da Pessoa com Deficiência, há, ainda, a existência da Lei de Cotas, a qual foi criada para assegurar a inclusão de pessoas com deficiência no mercado de trabalho. Logo, para empresas que tem mais de cem funcionários ou certames de contratação pública, deve haver uma cota de preenchimento de vagas por pessoas que possuem algum tipo de deficiência.

Noutro giro, a Lei 8.112/90, regulamentando a reserva de vagas assegurada pela norma constitucional, dispôs, como requisito básico para investidura em cargo público, a compatibilidade das atribuições com a deficiência que os acometem, vide artigo 5º, §2º da referida Lei 8.112/90.

Em análise do tema, o Supremo Tribunal Federal, no RE n. 676.335 MG, com repercussão geral reconhecida, de relatoria da ministra Cármen Lúcia, assentou que “o deficiente tem direito de acesso aos cargos públicos, desde que devidamente caracterizada a deficiência e que esta não seja incompatível com as atribuições do cargo postulado” (sic).

Ainda que a definição de tais requisitos seja, primordialmente, atribuição da Administração Pública, a qual dispõe de certa margem de escolha, por se cuidar de tema que envolve questões relativas à especialização e complexidade técnica inerentes às atribuições de cada cargo, cabe ao Judiciário exercer o controle da legalidade e da razoabilidade da atuação administrativa, tendo como parâmetro os critérios objetivos traçados na lei, fazendo o cotejo da norma com o edital, e verificando, concretamente, se a limitação do candidato compromete o desempenho das atividades do cargo.

Em uma decisão judicial do Distrito Federal, em que a comissão organizadora de concurso público declarou inapto um concorrente classificado como pessoa surda, houve a reversão deste entendimento sob a justificativa de não verificação que a deficiência auditiva acometida pelo autor da ação seja obstativa do desempenho das atribuições do cargo para o qual restou aprovado, de delegado federal.

Por tudo isso, infere-se que barreiras contra o capacitismo vêm sendo derrubadas, tendo as pessoas com deficiência ocupado espaços diversos na sociedade, ainda que em escala reduzida e com necessidade de intervenção judiciária. Na decisão acima comentada (processo 1005762-33.2019.4.01.3400), verifica-se o diálogo entre ramos do direito, qual seja a tutela de direitos da pessoa com deficiência, perpassando pelo aspecto do direito público e civil constitucional.

Quando se fala de reserva de direitos da pessoa com deficiência, deve ser observado questões de ordem cível, além de uma consulta a um advogado especialista.

 


Por: Camila Nascimento

Revisão da Vida Toda aprovada pelo Supremo Tribunal Federal (STF)

Por 6 votos favoráveis a 5 contrários, o Supremo Tribunal Federal garante a revisão da vida toda aos aposentados do INSS, permitindo o ingresso de uma ação judicial para que as contribuições previdenciárias realizadas antes de julho de 1994 sejam consideradas no cálculo da média salarial do benefício.

Desde junho de 2021, o placar da decisão estava empatado, tendo o ministro Alexandre de Moraes pedido vista. Hoje, 25 de fevereiro de 2022, o ministro apresentou seu voto favorável, seguindo o entendimento do relator original da matéria, ministro Marco Aurélio Mello, afirmando o seguinte: “O segurado que implementou as condições para o benefício previdenciário após a vigência da lei 9.876, de 26/11/1999, e antes da vigência das novas regras constitucionais, introduzidas pela EC em 103 /2019, que tornou a regra transitória definitiva, tem o direito de optar pela regra definitiva, acaso esta lhe seja mais favorável”.

Vale ressaltar que, em 1999, foi promulgada a Lei nº 9.876, uma reforma previdenciária que definiu uma média salarial, sobre as quais são calculadas as aposentadorias, considerando apenas os salários a partir de julho de 1994. Desta forma, as pessoas que tinham salários de contribuição elevados antes de 1994, tiveram benefício com valor menor do que poderia ter. É neste sentido que, para muitos segurados, é vantajoso ingressar no Judiciário pleiteando a revisão da aposentadoria para que o cálculo considere todo o histórico contributivo, e não apenas de julho de 1994 em diante.

Quem tem direito à revisão da vida toda? Todo segurado que se aposentou nos últimos 10 (dez) anos (prazo decadencial), desde que a aposentadoria tenha sido concedida antes da Reforma da Previdência (Emenda Constitucional 103/2019) e o benefício tenha sido concedido com base nas regras da Lei nº 9.876/1999.

A revisão compensa para o segurado que possuía elevados salários antes de 1994. Para os trabalhadores que tinham baixos salários antes de 1994 a revisão não é vantajosa, pois pode reduzir o valor da sua aposentadoria. Por isso, é necessária a avaliação de um especialista em direito previdenciário antes de ingressar com o pedido.

 


Por: Eduarda Medeiros

Validade da intimação da penhora feita ao advogado, ainda que a procuração exclua expressamente os poderes para essa finalidade

O Código de Processo Civil, em seu artigo 105, prevê que a procuração geral para o foro, outorgada por instrumento público ou particular assinado pela parte, habilita o advogado a praticar todos os atos do processo, exceto receber citação, confessar, reconhecer a procedência do pedido, transigir, desistir, renunciar ao direito sobre o qual se funda a ação, receber, dar quitação, firmar compromisso e assinar declaração de hipossuficiência econômica, que devem constar de cláusula específica.

O artigo acima estabelece distinção entre os poderes gerais para o foro, em que há habilitação para o advogado praticar todos os atos do processo, daqueles específicos, listados expressamente na parte final do dispositivo processual, em que se faz necessário a previsão de uma cláusula específica no instrumento de representação para sua prática.

Dito isso, em um caso concreto levado ao Superior Tribunal de Justiça e julgado em 21/09/2021 (Resp 1904872-PR), discutiu-se uma situação em que, em uma ação de execução, os devedores, citados, deixaram de efetuar o pagamento do débito tampouco opuseram embargos à execução, sobrevindo, então, a penhora de bem imóvel de titularidade do executado, a respeito da qual se determinou que os devedores fossem intimados pessoalmente. Todavia, antes da efetivação do aludido ato de comunicação processual, o advogado da parte executada compareceu aos autos, juntando instrumento de procuração. Em virtude disso, considerou-se que o patrono constituído foi intimado da penhora.

Diante da ausência de manifestação dos devedores, o imóvel penhorado foi avaliado e a credora requereu a adjudicação, o que lhe foi deferido. Ato contínuo, o advogado constituído compareceu nos autos alegando que a procuração outorgada pelo executado excluía expressamente os poderes para receber citação e intimação de penhora, razão pela qual seriam nulos todos os atos processuais praticados após a aludida intimação.

O Tribunal de origem afastou a nulidade, tendo a discussão processual sido levada para análise no STJ, através do Resp 1904872-PR, ocasião em que a Corte Superior ponderou que a parte final do artigo 105 (poderes especiais), por consistir em restrição de direitos, deve ser interpretada restritivamente.

Entendeu, assim, que os atos para os quais são exigidos poderes específicos na procuração encontram-se expressamente previstos no artigo 105 do CPC, entre os quais, portanto, não está inserido o de receber intimação da penhora, razão pela qual se faz desnecessária a existência de procuração com poderes específicos para esse fim.

Destarte, conclui-se que o poder de receber intimação está incluso nos poderes gerais para o foro, sendo certo que todas as intimações ocorridas no curso do processo, inclusive a intimação da penhora, podem ser recebidas pelo patrono constituído nos autos. Arrebatou-se, por fim, que somente na hipótese de não haver procurador constituído nos autos é que o devedor deverá ser intimado pessoalmente sobre a penhora realizada.

Fonte: STJ (Resp 1904872-PR)

 


Por: Karina Figueiredo

Franquias Home Based

Apresentando um crescimento considerável durante a pandemia da Covid-19, as operações das franquias Home Based permitem que o franqueado trabalhe com horários mais flexíveis na sua própria casa, sem a necessidade de um ponto físico.

Em relação às franquias, este sistema corresponde a um modelo de negócios em que um investidor (franqueado) adquire o direito de abrir uma filial de uma empresa cuja marca já está estabelecida no mercado (franqueador). Ressalta-se que a relação entre franqueador e franqueado não é de consumo e não gera vínculo empregatício.

Destaca-se, ainda, que, com a Nova Lei de Franquias (Lei nº 13.966/19), passou a ser exigida a inclusão de várias informações na Circular de Oferta de Franquia (COF), a qual apresenta todas as condições gerais do negócio, devendo ser entregue ao candidato franqueado com, no mínimo, dez dias de antecedência da assinatura do contrato ou do pagamento de qualquer valor.

 


Por: Loranne Polo

Indenização nas Operação de M&A

A Cláusula de Indenização é, sem dúvidas, uma das cláusulas de maior importância nas operações de M&A, sendo objeto de vastas negociações pelas partes envolvidas. Isso porque, uma vez concretizada a operação, o comprador não apenas sub-roga-se dos direitos, mas também de todos os deveres e obrigações inerentes à participação no capital social da empresa alvo por ele adquirida.

Em razão disso, a cláusula de indenização, em contratos de compra e venda de participação societária, é mecanismo para que o comprador, de um lado, garanta o seu direito de ser indenizado e ressarcido por passivos, contingências e perdas, cujos fatos geradores tenham ocorrido até o fechamento da operação Por outro lado, para o vendedor, funciona como limitação de suas responsabilidades e do próprio dever de indenizar.

A complexidade desta cláusula decorre exatamente da discussão em torno da alocação de risco e suas limitações, uma vez que o comprador e vendedor possuem diferentes percepções a respeito dos riscos inerentes à aquisição/alienação da participação societária.

Entre os principais critérios de indenização estão a violação das declarações e garantias prestadas pelo vendedor ou pela empresa alvo (sobre a empresa alvo), violação aos termos do próprio contrato de compra e venda de participação, a evicção ou outro vício na titularidade da participação societária, objeto da operação. Assim sendo, a cláusula de indenização vem regular, portanto, o descumprimento das declarações e obrigações assumidas pelo vendedor, bem como suas eventuais limitações.

Nesse sentido, as cláusulas de indenizações podem variar em sua alocação de risco, ora fornecendo maior proteção ao comprador, ora ao vendedor. Em um cenário ideal para o comprador, além do ajuste de uma indenização integral (prevendo que o vendedor indenizará o comprador pelas perdas que tenham fatos geradores anteriores ao fechamento da operação), este pode utilizar-se de cláusula Pro-Sandbagging para garantir que qualquer direito de indenização previsto no contrato a favor dele, comprador, não será impactado pelo conhecimento que ele tenha ou não dos fatos, passivos e contingências com fato gerador até o fechamento da operação.

Por outro lado, possui o vendedor diversos mecanismos capazes de limitar ou até mesmo exonerar a sua responsabilidade de indenizar o comprador, como é o caso de uma operação que se estrutura como sendo de “porteira fechada”. Nesta hipótese, o vendedor fica isento de indenizar o comprador de todo e qualquer risco ou o comprador pelo descumprimento do pagamento das parcelas do preço na data de vencimento.

Além disso, existem formas de limitação ao dever de indenizar, tal como a limitação de um valor máximo (cap); de minimis, que exclui da indenização determinados valores irrelevantes; basket, que condiciona a obrigação de indenizar à concentração de determinado valor; e a limitação temporal de apenas indenizar por um período determinado após o fechamento da operação.

Assim, o mecanismo da indenização, em contratos de M&A, não possui apenas a função comum de reparação de dano, mas também possui, como principal função, a viabilização da própria operação, sendo um autêntico mecanismo de alocação de riscos entre o comprador e vendedor.

 


Por: Brenda Oliveira