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Ausência de Recolhimento de Tributo é Crime?

Ausência de Recolhimento de Tributo é Crime? - Coelho & Dalle

Por Márcia Dias

Com a edição da Lei nº 8.137/90, o ordenamento jurídico brasileiro passou a estabelecer especificamente quais condutas relacionadas a questões tributárias podem ser enquadradas como crime. Dentre as hipóteses previstas na norma, destacam-se a falsificação de notas fiscais, a apresentação de declarações falsas às autoridades fazendárias, a omissão de informações e as fraudes a fiscalizações.

Desde então, muito se discute no meio jurídico se a mera ausência de recolhimento de tributos seria caracterizada como crime, o que poderia atrair consequências na esfera criminal para sócios e administradores de empresas com débitos perante o Fisco. A linha de argumento que predominava era no sentido de que seria necessário verificar a intenção do contribuinte, de forma que seriam crimes apenas os casos em que a inadimplência teria decorrido da intenção de fraudar a Fazenda Pública e disso tirar vantagens, não a mera ausência de recursos financeiros que teriam impedido o pagamento do tributo conforme determinado na legislação.

Apesar disso, nos últimos meses os tribunais superiores proferiram decisões entendendo estar tipificada como crime de apropriação indébita tributária a ausência de recolhimento de débitos de ICMS, independentemente de se tratar de operações próprias ou por substituição tributária. Como exemplo, pode-se mencionar o julgamento do Habeas Corpus 399.109 pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), o qual concluiu que, no caso do ICMS, há uma transferência do encargo para o seu adquirente, de forma que o consumidor final suporta o ônus de pagar o valor do imposto por este ter sido acrescido ao preço final do produto. Assim, o não pagamento do ICMS seria retenção de imposto cobrado de terceiro, caracterizando espécie de apropriação indébita.

No mesmo julgamento, o STJ ainda entendeu que o motivo da inadimplência tributária seria irrelevante para o enquadramento da conduta como crime, de forma que não importaria se o contribuinte deixou de realizar o pagamento pela efetiva vontade de sonegar o imposto ou pela simples ausência de condições financeiras para quitar as obrigações com o Fisco.

O novo entendimento dos tribunais superiores sobre o tema acendeu um alerta nas empresas, ainda mais em época de crise econômica, quando está cada vez mais difícil conseguir honrar a elevada carga tributária exigida pelos entes públicos. Além disso, a decisão ainda causa insegurança a novos empresários e investidores, que deverão passar a mensurar mais este risco a seus empreendimentos, somado ao cenário de instabilidade política, econômica e jurídica por qual passa o país neste momento.

Apesar das recentes decisões pessimistas às empresas, por enquanto a matéria ainda não está totalmente pacificada e caberá ao Supremo Tribunal Federal (STF) definir o assunto. Sabe-se que muitos doutrinadores, associações e a própria OAB têm se mobilizado para apresentar aos tribunais as inúmeras repercussões negativas que esse tipo de entendimento pode causar à sociedade, o qual ainda pode ter impacto direto no crescimento econômico do país, de forma que se espera que seja afastado o enquadramento de crime nos casos em que o inadimplemento decorre de ausência de recursos financeiros para a sua regularização.

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