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A Execução no Direito Processual brasileiro: a desjudicialização e o SNIPER – perspectiva

Se há um consenso entre a comunidade jurídica brasileira, é de que o sistema judiciário está congestionado e deve ser desafogado. Boa parte do gargalo consiste na morosidade da fase executória processual, seja de título judicial ou extrajudicial. Segundo dados do CNJ, mais de 40 milhões de processos em andamento no Brasil são execuções ou cumprimentos de sentença, excedendo a marca de 50% da totalidade das demandas judiciais em curso.

No atual cenário, os processos executórios duram, em média, o triplo de tempo em relação aos de conhecimento, o que escancara a ineficiência dos meios satisfativos comumente explorados pelos credores, bem como o considerável êxito de devedores que optam por evadir-se de seus compromissos já discutidos perante juízo.

Diante da realidade posta, algumas alternativas vêm sendo propostas com a finalidade de dirimir o contingente processual e fazer valer o princípio da duração razoável para a solução integral de mérito, incluída a atividade satisfativa, disciplinado no artigo 4º do Código de Processo Civil. Duas delas serão tratadas no presente texto: a proposta de desjudicialização da execução civil e o SNIPER (Sistema Nacional de Investigação Patrimonial e Recuperação de Ativos).

A discussão ao redor da desjudicialização ganhou força com o projeto de lei nº 6.204/2019, de iniciativa da senadora Soraya Thronicke, e foi pauta de sessão de debate entre os demais senadores recentemente, em maio de 2022. A proposta baseia-se na ideia de que o tabelião de protesto passaria a exercer a função pública de execução de títulos executivos judiciais e extrajudiciais, outorgando um profissional de direito também concursado. A fiscalização ainda ficaria ao encargo do Poder Judiciário.

Legitimada por figuras proeminentes do Direito nacional, como os professores Flávia Pereira Ribeiro e Joel Dias Figueira Júnior, além do Ministro do Superior Tribunal de Justiça Humberto Martins, a desjudicialização é ferramenta ativa em muitos ordenamentos jurídicos estrangeiros e atende à Meta 16 dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) estabelecidos pelas Nações Unidas na Agenda 2030. Segundo o ministro do STJ: “O direito brasileiro já conta com uma experiência exitosa na execução extrajudicial em certas matérias, como na arbitragem e na execução fiscal administrativa. Em contrapartida, temos o gargalo da execução civil brasileira, tradicionalmente submetida apenas à atividade jurisdicional estrita e expressa por elevados números de processos.”

Em Portugal e na França, por exemplo, existe a figura do agente de execução, ator principal da desjudicialização e promovedor dos atos executórios, podendo ser exercida por profissionais liberais e agentes privados que atuam sob a fiscalização de associações de classe e do Poder Judiciário.

No referido projeto brasileiro, há a intenção de incorporar função análoga à figura do tabelião. Daí, inclusive, insurge o questionamento quanto à inutilidade de transferir os atos executórios e, ao desafogar o sistema judiciário, congestionar os cartórios no Brasil. A atribuição da função de agente de execução a players privados, solução adotada por França e Portugal, seria uma saída viável ao ordenamento nacional, já que o contingente cartorário também seria ineficiente sem auxílio externo e, obviamente, mantendo a fiscalização pelo judiciário.

Quanto ao Sniper , lançado em agosto de 2022 pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o Sistema Nacional de Investigação Patrimonial e Recuperação de Ativos é parte do Programa Justiça 4.0, encabeçado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux, e que busca incorporar cada vez mais a inovação e tecnologia ao judiciário brasileiro e promover mais eficiência, acessibilidade e transparência, sendo certo que o SNIPER chegou para transformar o trâmite atual dos processos executórios que conhecemos.

Lançado com o apoio do TSE, STJ, Conselho da Justiça Federal (CJF), Receita Federal (RF) etc., trata-se de uma ferramenta unificada de busca de bens, que centraliza e informa detalhadamente ao magistrado solicitante informações societárias, patrimoniais e financeiras que poderiam passar desapercebidas em mera análise documental, tornando possível a identificação dos grupos econômicos e relações entre as partes devedoras.

O SNIPER engloba todas as ferramentas anteriormente utilizadas pela parte credora (BacenJud, SisbaJud, RenaJud, etc.) a fim de obter a satisfação de seu direito por meio da busca de bens e ativos financeiros do devedor. É uma tentativa do próprio judiciário de facilitar o cumprimento de sentenças e títulos extrajudiciais, fornecendo ao detentor do direito líquido e exigível a perspectiva concreta de êxito material, assegurando-lhe o acesso a ativos que garantem isso, consequentemente tornando mais difícil a vida de devedores que buscam prolongar ou sequer cumprir com suas obrigações.

A pesquisa unificada deve ser requerida pela parte interessada no impulsionamento do processo, e depende do deferimento do juízo em questão, com uma decisão de quebra de sigilo bancário. Após o lançamento da ferramenta, o CNJ disponibilizou um curso on-line aos servidores, para que se capacitem e se habilitem ao uso do SNIPER. Até o presente momento, em outubro de 2022, ainda não há jurisprudência de deferimento de uso do SNIPER. A perspectiva, portanto, é de busca cada vez maior pelo aumento da efetividade na satisfação do direito, num menor espaço de tempo.

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