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Piso Salarial da Enfermagem e o Setor Privado

A discussão sobre o piso salarial da enfermagem é enfrentada há anos no Brasil, mas ganhou forças com a pandemia da Covid-19, vivenciada no nosso país em 2020, o que fez com que o segmento se fortalecesse ainda mais em busca do aumento salarial.

Em 14 de agosto de 2022, foi sancionada a Lei 14.434, instituindo o piso salarial nacional do Enfermeiro, do Técnico de Enfermagem, do Auxiliar de Enfermagem e da Parteira.

A referida lei fixou o piso salarial em R$ 4.750,00, para os enfermeiros dos setores público e privado. O valor desse piso ainda serviu de referência para o cálculo do mínimo salarial de técnicos de enfermagem, que é de 70% do piso, bem como dos auxiliares de enfermagem e parteiras, que é de 50% do piso. A lei foi considerada um avanço e muito comemorada pela enfermagem.

Em 04 de setembro de 2022, o ministro do STF, Luís Roberto Barroso, através de uma decisão cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7222, suspendeu o piso salarial nacional da enfermagem e deu prazo de 60 dias para entes públicos e privados da área da saúde esclarecerem o impacto financeiro, os riscos para empregabilidade no setor e eventual redução na qualidade dos serviços.

A ADI 7222 foi apresentada pela Confederação Nacional de Saúde, Hospitais e Estabelecimentos e Serviços – CNSaúde, visando questionar a constitucionalidade da Lei 14.434/2022, assegurando que a aplicação da lei poderia aumentar o desemprego, gerar a falência de unidades de saúde ou aumento de repasse de custos no serviço privado, entre outros problemas.

Em 15 de maio de 2023, Luís Roberto Barroso revogou a liminar concedida na ADI 7222 e determinou o cumprimento do piso nacional da Enfermagem, em todo o território brasileiro. A nova decisão proferida levou em consideração a sanção da Lei 14.581/2023, que autorizou a transferência de R$ 7,3 bilhões destinados à assistência financeira complementar aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios para o pagamento do piso salarial dos profissionais da enfermagem.

Nos termos da decisão de Luís Roberto Barroso, o cumprimento do piso salarial, para os entes públicos, deveria ser de forma imediata. Já no caso dos profissionais da iniciativa privada, o ministro ressaltou que haverá a possibilidade de negociação coletiva. Além disso, também para as empresas privadas, estabeleceu um prazo maior para produção de efeitos da decisão, que seria a partir de 1º de julho de 2023.

O caso foi levado ao Plenário para a análise e votação dos demais ministros, tendo o STF, quando do julgamento da ADI 7222, fixado o entendimento de que o piso salarial nacional da enfermagem, do setor público, deve ser pago pelos estados, pelo Distrito Federal e pelos municípios, na medida dos repasses dos recursos federais.

O Supremo definiu, ainda, em relação às empresas privadas, que é imprescindível a tentativa de negociação coletiva para a implementação do piso salarial nacional, tratando isso como requisito procedimental obrigatório. Acrescentou que, nos casos em que não houver acordo, o piso deve ser pago conforme fixado em lei. Além disso, definiu que a aplicação da lei só ocorrerá depois de passados 60 dias a contar da publicação da ata do julgamento, mesmo que as negociações se encerrem antes desse prazo.

Após a decisão do STF, a CNSaúde buscou auxílio ao Tribunal Superior do Trabalho (TST), para uma possível mediação e busca de alternativas que pudessem atender ambas as partes. A entidade alegou entraves e dificuldades enfrentadas para chegar a um acordo com os representantes dos trabalhadores, afirmando que “há uma procrastinação das tratativas sobre o piso da enfermagem, no intuito de deixa vencer o prazo de 60 dias sem negociação concluída, para manter os valores fixados em lei”. Já os representantes dos trabalhadores alegam que as propostas apresentadas sugerem prazos longos para recebimento dos novos valores, o que não é aceito por eles.

Após alguns adiamentos, a negociação unilateral com o CNSaúde foi realizada no dia 07 de novembro de 2023, no entanto, o TST não aceitou a proposta apresentada pela entidade patronal para implantação do piso nacional dos profissionais de enfermagem do setor privado e, por essa razão, o documento não foi levado à categoria dos trabalhadores. O TST considerou que a proposta era incapaz de atender aos interesses da Enfermagem. Após finalizada a reunião, a CNSaúde solicitou prazo para apresentar uma nova proposta, que diz ser capaz de atender aos pleitos da enfermagem. A nova proposta foi entregue no dia 17 de novembro de 2023, mas o seu teor não foi divulgado e a justificativa do TST foi de que primeiro queria debater com os trabalhadores, antes que torne público para toda a sociedade.

Em paralelo, também após aquela decisão do STF, foram opostos alguns Embargos de Declaração, cujo julgamento daqueles embargos opostos pelo Senado Federal foi finalizado no último dia 18/12/23. Os demais embargos declaratórios deixaram de ser acolhidos.

Por maioria, o plenário do STF decidiu manter as 44 horas semanais trabalhadas, como referência para o pagamento do piso salarial nacional da enfermagem, bem como determinou a negociação coletiva regionalizada sobre o pagamento do piso no setor privado. Também foi autorizada a redução salarial, com pagamento proporcional do piso, em caso de redução de jornada.

Foi esclarecido, também, que para a observância do piso salarial devem ser consideradas todas as parcelas que integrem a remuneração e sejam pagas aos trabalhadores de forma permanente. Ou seja, o piso salarial vai levar em consideração a remuneração global e não apenas o salário base, podendo a remuneração ser reduzida proporcionalmente, no caso de carga horária inferior a 8 horas por dia ou 44 horas semanais.

No caso das entidades privadas, a implementação do piso salarial deve ocorrer de forma regionalizada, mediante negociação coletiva realizada nas diferentes bases territoriais e nas respectivas datas base, devendo prevalecer o negociado sobre o legislado, tendo em vista a preocupação com eventuais demissões e o caráter essencial do serviço de saúde. Em sendo frustrada a negociação coletiva, caberá dissídio coletivo, que se dará via processo judicial.

Conforme esclarecido acima, antes dessa nova decisão, o STF havia decidido que, para as entidades privadas, nos casos em que não houvesse acordo, o piso deveria ser pago na forma da lei. Essa mudança acabou sendo, de certa forma, positiva para as entidades privadas, pois a possibilidade de se admitir negociações coletivas regionalizadas vai permitir uma adequação do piso à realidade dos diferentes hospitais e entidades privadas de saúde.

Não se questiona e nem se discute que o novo piso nacional representa uma conquista para os profissionais do setor. No entanto, na rede privada, é um ponto que tem gerado grandes preocupações e discussões diversas, a começar pela viabilidade ou não do pagamento, já que os hospitais privados alegam que não conseguem, financeiramente, realizar o aumento nas remunerações desses profissionais. Foram realizadas várias pesquisas sobre o impacto desse aumento, na esfera das entidades privadas, e o resultado que se tem é que, por estimativa, a medida ocasionaria em uma demissão de 79,3 mil profissionais da enfermagem, o que é um quadro preocupante. Nos parece que as entidades privadas tem um desafio a percorrer e a negociação vai se tornar necessária.

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