Contrato de trabalho marítimo e a importância da repatriação à luz da Convenção do Trabalho Marítimo (MLC-2006)

As regras essenciais que norteiam o direito laboral estão inseridas na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) que em seus artigos 442 e 443 prevê que o contrato de trabalho pode ser tácito ou expresso.

Sendo que, para a gente do mar, que exerce seu labor de forma confinada a bordo de navio, é conveniente o estabelecimento de regramento específico, por se tratar de categoria diferenciada dadas as peculiaridades desta atividade.

No entanto, sobre o trabalho marítimo a CLT, em seus artigos 248 a 252, se limita, em linhas gerais, a trazer disposições sobre a jornada de trabalho destes profissionais, fazendo com que este tipo de contrato de trabalho se socorra de outras fontes para sua regulamentação, mormente diante do alcance internacional que podem ter diante de navegação de longo curso, aquela realizada entre portos brasileiros e estrangeiros.

Entre as várias fontes que balizam o contrato de trabalho marítimo há as normas coletivas, normas regulamentadoras (NRs) expedidas pelo Ministério do Trabalho e as convenções internacionais, com destaque à MLC-2006, criada pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) com a finalidade, sobretudo, de resguardar a segurança da gente do mar.

Apesar da sua criação em 2006, o Brasil apenas ratificou esta convenção em 2020, com sua entrada em vigor no país em 07/05/2021. Posteriormente, a Portaria MTP nº 3.802/2022 passou a regulamentar as disposições da MLC-2006.

Ao revés do que consta na CLT em relação aos contratos de trabalho comuns, o contrato de trabalho marítimo, seguindo as diretrizes da MLC-2006, deve ser celebrado de forma escrita e constar uma cópia deste documento em inglês que deve ser disponibilizada a bordo do navio onde o trabalhador preste serviço.

Neste cenário, o contrato de trabalho marítimo deve conter (i) cláusula que qualifique o armador (pessoa física ou jurídica que apresta a embarcação para fins comerciais), e descrição da (ii) função, (iii) valor do salário, (iv) indicação do prazo do contrato (prazo determinado ou indeterminado), (v) montante de férias anuais, (vi) benefícios de saúde e previdência, (vii) norma coletiva aplicável e (viii) direito de repatriação.

Dando ênfase ao direito de repatriação, o que se busca é garantir o retorno do trabalhador marítimo ao seu local de origem sem cobrança de custos adicionais em caso de rescisão do contrato de trabalho em território estrangeiro ou de falta de condições de trabalho.

Esta garantia financeira é de responsabilidade do armador advertindo a MLC-2006 que “se um armador não adoptar as medidas necessárias para o repatriamento de um marítimo que a ele [repatriamento] tenha direito, ou se não assumir os respectivos custos a autoridade competente do Estado da bandeira [do navio]deve organizar o repatriamento e se este não o fizer, o Estado a partir de cujo território o marítimo deve ser repatriado ou o Estado de que é nacional podem organizar o repatriamento e recuperar os custos junto do Estado da bandeira”.

Seguindo estas premissas, o contrato de trabalho marítimo se reveste de maior segurança para as partes convenentes.

Extensão da Regra de Impenhorabilidade de Caderneta de Poupança

O Código de Processo Civil é expresso em seu artigo 833, inciso X, ao afirmar que a quantia depositada em caderneta de poupança, até o limite de 40 (quarenta) salários-mínimos não pode ser penhorada.

Tal regra de impenhorabilidade foi inserida pelos legisladores, com o claro intuito de garantia do mínimo existencial da pessoa física, estritamente relacionado com o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, ou seja, o mínimo valor financeiro que possa dar garantia de saúde, alimentação, educação para si e para sua família.

No entanto, em que pese a regra aparentemente estrita do CPC, no recente julgamento do Recursos Especiais 1.660.671 e 1.677.144, a corte especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que esse limite pode ser estendido à conta corrente ou qualquer outra modalidade de aplicação financeira.

Nos recursos supramencionados a Fazenda Nacional defendia a tese de que a impenhorabilidade prevista no CPC seria restritiva, tendo aplicação apenas aos recursos depositados em poupança. O julgamento teve início em 2019, quando o Ministro Herman Benjamin seguiu a tese da Fazenda Pública, no entanto, na ocasião, o Ministro Luis Felipe Salomão divergiu do relator, ao entender que a proteção independe da natureza da conta em que os valores estão depositados, devendo ser observado a finalidade da proteção legal.

Ao retomar o julgamento em 2024, o Ministro Herman Benjamin retificou seu voto e declarou que a impenhorabilidade se aplica de forma automática aos valores em poupança, porém, caso haja bloqueio de valores em conta corrente ou outros investimentos pelo Bacenjud, é possível estender a regra com a comprovação da natureza dos recursos.

Sendo assim, nas palavras do relator: “Se a medida de bloqueio/penhora judicial por meio físico ou eletrônico atingir dinheiro mantido em conta corrente ou qualquer outra aplicação financeira, poderá, eventualmente, a garantia da impenhorabilidade ser estendida a tal investimento”. Chegou-se, por fim, à conclusão de que, desde que comprovado pela parte atingida pelo ato constritivo que o referido montante constitui reserva de patrimônio destinado a assegurar o mínimo existencial, independe a modalidade da conta onde os valores estão depositados.