Retorno do empregado apto com restrições: é possível demiti-lo?

Por Mariana Gusmão

Destaques do artigo:

– Se o empregado, afastado por doença comum, retornar ao seu emprego apto, mas com restrições, ele pode ser demitido?

– Esse empregado apto com restrição tem algum respaldo legal para não ser demitido?

– Ele é considerado um empregado apto ou inapto, em razão da restrição?

Essas e outras dúvidas serão esclarecidas no artigo a seguir.

Antes de responder esse questionamento, é importante destacar que existem duas situações em que o empregado pode se afastar das suas atividades laborativas para percepção de benefício previdenciário: a primeira é aquela decorrente de doença comum e a segunda é aquela decorrente de doença ou acidente de trabalho.

Para percepção do benefício previdenciário, é necessário que o afastamento, em virtude de apresentação de atestado médico, seja superior a 15 dias corridos ou 15 dias intercalados em um período de 60 dias. Assim, o empregado terá direito a requerer o auxílio-doença a partir do décimo sexto dia de afastamento. Lembrando que os primeiros 15 dias do afastamento são de responsabilidade da empresa, inclusive com pagamento de salários, conforme dispõe o §3º do artigo 60, da Lei 8.213/91.

Na primeira situação, nos casos de doença comum, o empregado passará a perceber o Auxílio Doença Previdenciário, cuja espécie é identificada como “B-31”. É aquele benefício concedido a quem adquiriu uma doença que não guarda qualquer relação com as atividades exercidas no trabalho. A segunda situação, nos casos de doença ou acidente de trabalho, o empregado passará a perceber o Auxílio Doença Acidentário, cuja espécie é identificada como “B-91”. É aquele benefício pago a quem contraiu doença ocupacional ou que sofreu um acidente do trabalho.

É mais comum do que se imagina um trabalhador pensar que, após ficar afastado recebendo auxílio-doença, terá direito à estabilidade provisória ao emprego.  Contudo, é importante saber que o Auxílio Doença Previdenciário, aquele decorrente de uma doença comum, não dá direito à estabilidade, ou seja, não garante ao trabalhador a estabilidade após o seu retorno ao trabalho. Apenas o Auxílio Doença Acidentário garante ao empregado uma estabilidade de 12 meses após o seu retorno ao emprego.

Considerando que apenas o caso de Auxílio Doença Acidentário assegura a estabilidade no emprego por 12 meses, o que ocorre com o empregado que recebia o auxílio-doença comum quando retorna ao emprego? Esse empregado pode ser demitido pela empresa após o seu retorno ao trabalho? Nesse primeiro momento, a resposta é positiva. Sim, o empregado que percebia auxílio previdenciário decorrente de doença comum poderá ser demitido após o seu retorno.

Porém, há, portanto, uma segunda situação que gera dúvida na aplicação prática: e se esse empregado, afastado por doença comum, retornar ao seu emprego apto, mas com restrições, ele pode ser demitido? Esse empregado apto com restrição tem algum respaldo legal para não ser demitido? Ele é considerado um empregado apto ou inapto, em razão da restrição?

Segundo a Norma Regulamentadora – NR 7, há duas opções para se constar no Atestado de Saúde Ocupacional – ASO: apto ou inapto. Diz a NR-7, em seu item 7.4.4.3, alínea “e”, que o ASO deverá conter, no mínimo, definição de apto ou inapto para a função específica que o trabalhador vai exercer, exerce ou exerceu.

Embora existam entendimentos admitindo as expressões no ASO de “apto para a função”, “apto para a função com restrições”, “inapto temporariamente” ou “inapto para a função”, não há respaldo jurídico para tal inovação.

O empregado apto com restrições é um empregado apto ao desempenho das atividades laborativas. Assim, em uma primeira análise e de forma superficial, o empregado afastado por doença comum, ao retornar para as atividades laborativas, por se encontrar “apto com restrição”, não tem a estabilidade assegurada e pode ser demitido, sim, logo após o seu retorno.

É bem verdade que antes de qualquer decisão a ser tomada é importante analisar caso a caso, bem como avaliar as atividades laborais e se as restrições são tão sérias ao ponto de tornar aquele empregado “inapto” para aquela função que exercia antes do afastamento.

Admitindo-se a hipótese de restrições sérias, o que tem prevalecido na jurisprudência é que, se o empregado sofre sérias restrições e o INSS não lhe fornece o benefício previdenciário correspondente, a empresa deve readaptá-lo em um outro cargo, com funções compatíveis com sua limitação, até que o trabalhador esteja novamente saudável. Agora, se ASO atesta que o empregado se encontra apto ao trabalho, mas com restrições às atividades que não são exercidas por ele e nem inerentes ao cargo que desempenha, não há qualquer óbice para efetivar a sua demissão.

É possível modificar um plano de recuperação judicial aprovado?

Por Ana Carolina Borba Lessa Barbosa

Destaques do artigo:

– Por um lado, não existem dúvidas de que o plano pode ser modificado;

– Por outro, questiona-se em que momento aludidas alterações seriam admissíveis, os requisitos para a sua aprovação e as respectivas consequências jurídicas;

– Os princípios que regem a Lei n° 11.101/2005, em especial, os princípios da função social da empresa e da sua preservação, corroboram a possibilidade de modificação do plano aprovado em assembleia geral de credores.

Uma das discussões que aflora no âmbito da recuperação judicial se relaciona com a possibilidade de alteração do plano de recuperação judicial originalmente apresentado pelo devedor, no curso do seu processo recuperatório.

Não obstante o artigo 35 da Lei n° 11.101/2005 estabeleça a competência da assembleia geral de credores para deliberar sobre a modificação do plano de recuperação judicial apresentado pelo devedor empresário e o artigo 56, § 3º do referido diploma legal admita a possibilidade de tal modificação, há lacunas a serem preenchidas. Se, por um lado, não existem dúvidas de que o plano pode ser modificado, por outro, questiona-se em que momento aludidas alterações seriam admissíveis, os requisitos para a sua aprovação e as respectivas consequências jurídicas.

Pois bem.

Os princípios que regem a Lei n° 11.101/2005, em especial, os princípios da função social da empresa e da sua preservação, corroboram a possibilidade de modificação do plano aprovado em assembleia geral de credores.

Deveras, a homologação judicial de um plano de recuperação não constitui óbice à sua posterior alteração pelo devedor empresário, devendo-se observar o mesmo procedimento sugerido para a modificação do plano antes da assembleia geral de credores, a saber: (a) publicação do edital de aviso aos credores previsto no artigo 53, parágrafo único, da Lei n° 11.101/2005; e, (b) concessão de prazo de 30 dias, previsto no parágrafo único do artigo 55 do referido Diploma legal.

Uma vez publicado o edital de aviso acima tratado e não havendo qualquer oposição dos credores sobre a modificação do plano proposta pelo devedor empresário, poderá ela ser homologada pelo juiz, independentemente de nova assembleia geral de credores.

Por outro lado, havendo objeção por um ou mais credores, deverá ser convocada nova assembleia geral para deliberação acerca da modificação do plano de recuperação judicial, na linha do que preceitua o artigo 35, inciso I, alínea “a”, da Lei recuperacional.

Nesse compasso, considerando que a recuperação judicial envolve um processo negocial entre devedor empresário e seus credores, a despeito da regulação legal e do controle do Judiciário, há a prevalência da autonomia da vontade das partes para se viabilizar o soerguimento econômico-financeiro da empresa. Sob essa ótica e amparando-se na concordância da maioria dos credores/créditos, a recuperação judicial tem uma feição contratual, o que torna possível a alteração do plano anteriormente aprovado.

Vale registrar, por fim, que a não aprovação, em assembleia geral de credores, da modificação do plano de recuperação judicial já homologado, não deverá implicar, via de regra, a decretação da falência do devedor empresário, exceto se o plano, anteriormente aprovado, não estiver sendo cumprido.

Árbitro de emergência no Brasil

Por Letícia Aragão

Destaques do artigo:

– Diante da necessidade de diminuir o máximo possível a intervenção estatal no âmbito particular da arbitragem, surgiu a figura do Árbitro de Emergência;

– O Árbitro de Emergência consiste na nomeação emergencial de um árbitro, apto a analisar as medidas de urgência que demandem ainda maior celeridade ante o risco do perecimento do direito, antes da constituição do Tribunal Arbitral;

– A figura do Árbitro de Emergência ainda não é um instrumento muito usual no Brasil e não possui regulamentação própria na legislação pátria. 

No Brasil, há um crescimento notório dos casos submetidos ao crivo da arbitragem, instituto que possui como preceito basilar a celeridade. Todavia, anteriormente para que algum pedido de urgência fosse atendido antes da constituição do Tribunal Arbitral, as partes eram obrigadas a recorrer à jurisdição estatal para resolver essas questões afeitas ao pedido de tutela de urgência.

Diante desta necessidade de diminuir o máximo possível a intervenção estatal no âmbito particular da arbitragem, surgiu a figura do Árbitro de Emergência, que consiste na nomeação emergencial de um árbitro, apto a analisar as medidas de urgência que demandem ainda maior celeridade ante o risco do perecimento do direito, antes da constituição do Tribunal Arbitral.

Destaque-se que a primeira remissão ao árbitro de emergência foi inserida em 2006, no regulamento ICDR – International Center for Dispute Resolution, da AAA – American Association Arbitration. A partir de então, outras Cortes Internacionais de arbitragem passaram a prever regras semelhantes, destacando-se, a Câmara de Comércio Internacional (“CCI”).  A LCIA – London Court of International Arbitration, por seu turno, optou por algo semelhante ao árbitro de emergência, denominado “expedited formation”, no qual disponibiliza a possibilidade de instituição de um Tribunal Arbitral excepcionalmente célere para decidir questões consideradas como urgentes.

No Brasil, além do Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de Comércio Brasil-Canadá (“CAM-CCBC”), a Câmara de Arbitragem e Mediação da Federação das Indústrias do Estado do Paraná (“CAM-FIEP”) e a Câmara de Arbitragem do Mercado possuem regramento semelhante para o árbitro de emergência.

Analisando os regulamentos destas Cortes Arbitrais, em suma, percebe-se que há duas formas de previsão do Árbitro de Emergência. Em algumas delas há o denominado opt in, no qual, as partes devem expor expressamente que desejam se submeter ao instituto e aos procedimentos inerentes ao Árbitro de Emergência. Em outras, há a cláusula opt out, na qual se exige a previsão expressa das partes, no sentido contrário da opt in, afastando explicitamente o mecanismo, sob pena deste produzir efeitos normalmente. A Câmara do Mercado e o CAM-CCBC são exemplos do opt in e a CAM-FIEP do opt out.

Ademais, a figura do Árbitro de Emergência, apesar de consolidada internacionalmente e admitida nas principais Câmaras de Arbitragem do exterior, ainda não é um instrumento muito usual no Brasil e não possui regulamentação própria na legislação pátria, motivo pelo qual, quando surge a necessidade de solicitação para o uso desse mecanismo no Brasil, devem ser seguidas as regras da Câmara escolhida para reger o procedimento arbitral.

Portanto, conclui-se que a figura do Árbitro de Emergência representa uma alternativa eficaz e célere em paralelo ao Poder Judiciário, mais flexível, e que pode se adequar melhor ao caso concreto, com a realização de, por exemplo, audiência telefônica com as partes para boa compreensão da questão colocada em disputa, além de poder resolver a emergência antes mesmo da constituição do Tribunal Arbitral.

Desta forma, a possibilidade de constituição do Arbitro de Emergência traz inclusive, mais credibilidade e amplitude de instrumentos para o meio privado da Arbitragem, o que sem sombra de dúvidas representa um avanço nesta seara, alinhado com as melhores práticas já adotadas internacionalmente, merecendo, portanto, ser regulamentada de forma ampla.