A paralisação das obras e serviços por falta de orçamento – Tribunal de Contas da União admite a aplicação de multa ao gestor público.

A paralisação das obras e serviços por falta de orçamento – Tribunal de Contas da União admite a aplicação de multa ao gestor público - Coelho & Dalle

Por Gabriel Oliveira

Obra pública é definida na Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, como toda construção, reforma, fabricação, recuperação ou ampliação de bem público, podendo ser realizada de forma direta, ou seja, quando a obra é feita pelo próprio órgão ou entidade da Administração com seus próprios meios, ou como execução indireta, quando é contratada com terceiros. Para esta última, salvo os casos de dispensa ou inexigibilidade, é necessária a deflagração de processos licitatórios.

Um diagnóstico realizado pelo Tribunal de Contas da União (TCU) identificou que de um total de 38 mil obras financiadas com recursos federais, mais de 14 mil estão paralisadas, o que representa 10 bilhões de reais aplicados e sem qualquer retorno. Os dados revelam ainda que mais de 132 bilhões de reais deixaram de ser injetados na economia. Grandes empresas, na sua maioria, por falta de repasses de recursos, viram-se obrigadas a encerrar suas atividades.

No acórdão 1079/2019, do Plenário do TCU, de 15/05/2019, referente à sessão que julgou os dados levantados no referido diagnóstico, restou determinada a expedição de 38 (trinta e oito) recomendações, as quais visam a implantação de mecanismos de planejamento e fiscalização, além de medidas que importem na efetividade das contratações públicas. Dados revelam que atualmente, dos 2.914 contratos, existem apenas seis de obras fiscalizadas pelo TCU e que tiveram indicação de irregularidades graves com recomendação de paralisação pelo órgão de controle, o que corrobora o entendimento de que as interrupções são derivadas da inadimplência da Administração, ausência de orçamento, paralisação por erros de medição e dimensionamento da obra.

Entretanto, em que pese a excelência das medidas consignadas no julgado, o silêncio quanto às medidas a serem adotadas para retomada efetiva das obras, ressarcimento dos prejuízos causados aos contratados e/ou reequilíbrio econômico-financeiro do contrato, permanece.

A Lei 8.666/93, que disciplina os contratos celebrados com a Administração Pública, estabelece que ao contratado, é facultado o direito de suspender o serviço/obra ou rescindir o contrato por inadimplência da Administração superior a 90 (noventa) dias.

Mesmo com esse resguarde, ainda que o contratado opte pela rescisão do contrato, não se vê efetividade quando se pleiteia, administrativamente, a indenização pelos prejuízos causados, custos com desmobilização e, até mesmo, os lucros cessantes

A opção, na maioria das vezes, é pela retomada dos serviços, a fim de minimizar os prejuízos já suportados, na esperança de receber os valores devidos em atraso. Nesses casos, impera a necessidade, também, de apresentação do pedido de reequilíbrio econômico-financeiro do contrato, haja vista a existência de fatores imprevisíveis e suas consequências onerosas para a execução do objeto na forma inicialmente pactuada. De todas as formas, os entraves geralmente residem na falta de orçamento.

Por outro lado, ao tempo que inexistem medidas mais efetivas para recuperação dos créditos, a Corte de Contas da União – Acórdão 1264/19-P – decidiu impor multa ao gestor por ir de encontro ao posicionamento da Assessoria Jurídica do órgão, sem a devida motivação, optando pela formalização de determinada contratação com terceiros. Na situação em tela, o destaque do acórdão foi pelo aprofundamento de “erro grosseiro” no âmbito da responsabilização dos agentes públicos, frise-se, instituto trazido pela Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro.

A referida norma (Lei 13.655/2018), em seu artigo 28 (regulamentado pelo Decreto 9.830/2019), dispõe que o agente público poderá ser responsabilizado por suas decisões ou opiniões técnicas em caso de dolo ou erro grosseiro.

Em um breve resumo, a assessoria jurídica, de acordo com disposições da Lei 8.666/03, deve se posicionar previamente, nos processos licitatórios, emitindo parecer fundamentado quanto à legalidade, ou não, do prosseguimento de processo licitatório. Por sua vez, a legalidade do ato contração de despesa está adstrita à observância de disponibilidade orçamentária para tal. É pacífico o entendimento que é ilegal a autorização para realizar despesa sem a emissão de prévio empenho, pois contraria o art. 60 da Lei 4.320/1964.

Sendo assim, a decisão do TCU representa marco importante, pois abre margem à possibilidade de responsabilização dos gestores que prosseguirem com contratação sem a devida disponibilidade de orçamento para fazer face à despesa contratada, o que se espera que contribua para a maior segurança do negócio jurídico firmado com terceiro de boa-fé.